Espanto

Ela

Mas que haverá com a Lua, que sempre que a gente a olha, é com um novo espanto?

Aquele que já não consegue sentir espanto nem surpresa está, por assim dizer, morto; os seus olhos estão apagados.

O começo de todas as ciências é o espanto de as coisas serem o que são.

DESENCONTRO

A sua lembrança me dói tanto
Eu canto pra ver
Se espanto esse mal
Mas só sei dizer
Um verso banal
Fala em você
Canta você
É sempre igual

Sobrou desse nosso desencontro
Um conto de amor
Sem ponto final
Retrato sem cor
Jogado aos meus pés
E saudades fúteis
Saudades frágeis
Meros papéis


Não sei se você ainda é a mesma
Ou se cortou os cabelos
Rasgou o que é meu
Se ainda tem saudades
E sofre como eu
Ou tudo já passou
Já tem um novo amor
Já me esquece

Não era a vaidade que a atraía para o espelho, mas o espanto de se descobrir nele.

A fotografia sempre me espanta, com um espanto que dura e se renova, inesgotavelmente.

Aceitar-me plenamente? É uma violentação de minha vida. Cada mudança, cada projeto novo causa espanto: meu coração está espantado. É por isso que toda minha palavra tem um coração onde circula sangue.

As doações devem atingir tão profundamente quem as recebe a ponto de causar-lhes espanto.

Mergulha, sem limites, no espanto e na estupefacção; deste modo podes ser sem limites, assim podes ser infinitamente.

Cada mudança, cada projeto novo causa espanto: Meu coração está espantado.

Com o OO de espanto, seus RR guturais, seu hirto H, HORROR é uma palavra de cabelos em pé, assustada da própria significação.

Gosto da noite. É nela que me perco em espanto, à espera de uma saudade mais recente. Uma amostra dos dias em que tudo era simples e tu me dizias até já.

Foi então que eu, ferido de espanto, descobri: - quem nunca desejou morrer com o ser amado, não conhece o amor, não sabe o que é amar.

(Morrer com o ser amado, 08/01/1968)

Mas é engraçado, o amor não dói. E não, não me faça essa cara de espanto, eu repito: o amor não dói. O ciúme, a insegurança, a desconfiança, a falta de, o medo de perder a pessoa amada, o medo de amar, o medo de nunca ter sentido tamanha felicidade na vida inteirinha, isso sim dói. O amor, amor como sentimento, amor como coisa plena, amor como som no peito, amor como sorriso no olho, amor como poesia na boca, amor como amor, esse não dói.

Às vezes me espanto e me pergunto como pudemos a tal ponto mergulhar naquilo que estava acontecendo, sem a menor tentativa de resistência. Não porque aquilo fosse terrível, ou porque nos marcasse profundamente ou nos dilacerasse — e talvez tenha sido terrível, sim, é possível, talvez tenha nos marcado profundamente ou nos dilacerado — a verdade é que ainda hesito em dar um nome àquilo que ficou, depois de tudo. Porque alguma coisa ficou.

Eu não espanto os pássaros da árvore que me deu frutos amargos.

Amiga bobinha
Desculpa a zueira
Eu causo espanto
Pela maré verdadeira
As vezes as cobras
São traiçoeiras
E nosso caminho
Sempre tem poeira
Tornados de cheiros
Centelhas de ervas
E o sol que clareia
Supera a cadeia
Os mares do ego
Brincam e machucam
Risco sempre sérios
O poste do cego
Desmaia a cegueira
Todos temos tédios
Perdidos em mitos
Ou ciclos infinitos
E o que nos resta
É pedir perdão
A dor do irmão
Dói no coração
E as lágrimas
Não devem cair
Melhor o sorrir
Teus olhos tem brilho
Teu peito amor
Eu peço desculpas
Reconhecendo
Agradecendo
Aprendendo
E dando valor
Que tua amizade
É sinal de amor.

Todo artista é dotado de maluco ou sem noção, o que não me causa espanto algum, maluco mesmo no sentido literal é quem não se assume, categoria que não se define nós artistas que nos assumimos sempre sem medo de julgamentos.

Uma mudança no visual sempre é bem-vinda, ainda mais quando é seguida de um enorme espanto.

Ela indagou: — Quem és tu?
Respondeu: — Sou o demônio,
Nem me espanto com milagre,
Nem com reza a Santo Antônio!
Pretendo entrar no teu couro!
E nisto ouviu-se um estouro!
Gritou a velha: — Jesus!
Ligeira se ajoelhou
E, depois, se persignou
E rezou o Credo em cruz!

Nisto, o diabo fugiu.
E, quando a velha se ergueu,
Ele chegou de mansinho,
Dizendo logo: — Sou eu!
Agora sou teu amigo
Quero andar junto contigo,
Mostrar-te que sou fiel.
Minha carta, queres ver?
A velha pediu pra ler
E apossou-se do papel.

— Dê-me isto! grita o diabo,
Em tom de quem sofre agravo.
Diz a velha: — Não dou mais!
Tu, agora, és o meu escravo!