Escritor
A mulher mais linda da cidade
Minha mãe não entende o porquê eu não mudo mesmo depois dela ter me dado tantas broncas, mesmo depois de ter crescido, mesmo depois de passar a bancar o garoto maduro. Não entende que, mesmo depois dos vinte, eu nunca vou conseguir tomar sorvete ou comer macarrão sem me lambuzar feito uma criança de quatro anos, e ela vai sempre como uma boba ter que tirar às pressas a mancha da camisa branca, porque eu sempre digo que aquela é a minha preferida. Não entende que eu nunca vou me acostumar em acordar cedo, que eu vou sempre estar atrasado, correndo, atropelando os horários das refeições. E vai passar a vida reclamando que eu como coxinha de padaria, e que logo pegarei uma fraqueza e vou parar num hospital. Acho que ela não vai entender que eu nunca vou aprender a colocar água na forminha de gelo sem derramar, nem conseguir soltar uma gargalhada um pouco mais baixa, seguindo os bons modos que ela sempre me ensinou. Ela vai continuar reclamando que eu meto a mão na panela, que eu abro o forno antes do bolo ficar pronto. Não entende que eu nunca vou conseguir deixar de bater o dedinho do pé na quina, muito menos parar de ralar meus joelhos. Que volta e meia vou aparecer com um corte, mas não vou conseguir explicar como foi. E ela vai sempre como uma boba, com a testa vincada, preocupada ao ver o ferimento. Ela nunca vai entender que, ainda que eu tenha crescido, eu nunca vou aprender a descascar laranja, como também nunca vou aprender a fazer um bom suco, arrumar as malas para uma viagem sem colocar todo o meu guarda roupa lá dentro. Nunca vou trocar as meias por vontade própria, nem parar de colocar besteira na lista de compras. Minha mãe nunca vai entender meu armário desarrumado, minha gritaria no chuveiro, minhas cenas no celular. Nem as batidas de porta pra chamar atenção. Não adianta, ela sempre vai achar que é imaturidade, que essas atitudes são coisas de filho que não cresceu, e ainda vai pedir a Deus que um dia eu aprenda. Minha mãe não sabe, mas eu tenho um medo absurdo de um dia deixar de ser filho.
Depois apareceu dizendo que tinha arranjado um namorado novo, que estava cheio de planos, que nunca tinha sido feliz como agora. E eu pedia por dentro pra que esse não sofresse tanto quanto eu.
Às vezes eu penso que você deve ler as coisas que eu escrevo, ao lado de alguém, e deve ficar rindo da minha cara.
E era quando estavam juntos que todos desconfiavam que aquilo era mais do que amizade. Todo mundo via uma química explícita e absurda naqueles dois. No toque, nos gostos, no abraço, no olhar. Os dois sabiam que era amor, mas cansaram fácil de tentar entender o motivo de não dar certo. Teve uma vez que, juntinhos e a sós, um deles fechou os olhos, para depois abri-los devagarzinho, na esperança que houvesse um beijo doce. Mas não tinha acontecido nada. Parecia que nunca iria acontecer. Alguém precisava urgentemente tomar atitude.
Preciso de alguém que me faça companhia no banco da praça ou no balcão gasto da cozinha para falarmos bobagens ensandecidas até o final do dia. Alguém que pouco se importe com meus deslizes e escute, engula e assimile todas as minhas verdades inventadas. Alguém que nem sequer tente solucionar o meu problema. Nunca pedi resolução de nada. Eu peço salvação, mas ninguém vem, ninguém ouve, ninguém acuda.
Mas, em todos esses lugares você vai comigo. Você segura a minha mão na hora de atravessar a rua, eu vejo você deitar no meu colo quando eu menos espero. Você me olha triste quando eu encaro o relógio pela milésima vez. Sente orgulho de mim quando eu domino um assunto. Me admira quando eu solto uma gargalhada. Vira o rosto se alguém se interessa por mim. Você me espera na porta do carro. Come devagar só pra me fazer companhia. Você aparece quando eu acordo e me presenteia com um lindo e sincero sorriso. Aparece em todos os filmes de romance, em trechos de livros também. Eu até acho graça disso tudo, porque, virou normal essa coisa de passar a sentir a sua presença mesmo quando estou sozinho. Meu coração se acalma quando ouve a simples menção do seu nome e os medos evaporam quando lembro de que ainda te tenho em algum lugar em mim. Você não sabe, mas eu vejo você o tempo todo.
Ela que se dizia esperta, cheia de planos e conceitos, na verdade sentia um vazio enorme dentro de si. Então se olhou no espelho e viu a criança boba com laço amarelo na cabeça que nada sabia da vida e tanto queria explorar. Ela era tão pura quanto os olhos amendoados. Olhou-se no espelho e enxergou exatamente o que queria ver: O começo. Ela queria ser aquela menina boba que desenhava balão no caderno da escola, que decalcava coração grande e o pintava de vermelho sem pensar nas cicatrizes.
Eu tô confiando no amor de novo. Tô me confiando, me permitindo, me deixando levar. Porque eu sei que posso muito, mereço muito e preciso ser feliz.
Quando criança, gostava de admirar as coisas até os olhos brilharem de encantamento. Mal comia biscoito na hora do lanche do colégio, por exemplo, porque achava impressionante o formato de coração que tinha. Guardava os detalhes, era feliz por isso. Tão inocente, se apaixonava fácil pelas coisas.
Não se lamentar pelo que não deu certo. Não ficar querendo voltar ao passado. Não viver só para o futuro. Enxergar o lado bom do presente, do agora. Não querer consertar o que sempre será errado. Não se perder e se prender aos problemas. Nem sofrer por bobagem. Amém.
Fale de mim pro seu psicólogo. Diga pra ele que eu incomodo, que eu te dou agonia. Não quero ter esse status de enlouquecer sozinho.
Você foi por uma rua sem retorno, pisou em algum poço fundo e escuro. Correu na contramão, não quis seguir placas. E eu me perdi em algum lugar no meio do caminho. Nos desencontramos.
Ele é lindo de formas inexplicáveis. Faz arrepiar num simples sorriso. E doído, tão doído. Tadinho. Vez em quando penso que ele precisa de amparo, sabe? É um homem feito, tem até barba. E mesmo assim vejo ele tão menino, tão sofrido.
Eu ficaria esperando se você ficasse também. E largaria tudo no mundo, diria o que você não diz. Escreveria versos, seriam quase um protesto só pra te ter aqui.
Dei pra te imaginar nos lugares e fotografar o momento, foi a solução que encontrei pra diminuir esse caos dentro de mim.
Naquele barzinho, havia alguém comentando sobre algo que me levava até você. Não consigo especificar o que foi. Só existiam vozes eufóricas, risos altos e você passeava entre elas. São rotineiras essas buscas inconscientes que te trazem quando menos espero.
Bem ali, na frente de todo mundo, me puxou para perto e me beijou. Foi tudo muito rápido. Ainda que parecesse em desordem e sem resposta, ainda que eu não entendesse nada, naquele momento, tão perto e aparentemente obsceno, eu não podia negar o fato de que tudo também parecia certo.