Escrevo
Eu não escrevo em português. Escrevo eu mesmo.
Escrevo sem pensar, tudo o que o meu inconsciente grita. Penso depois: não só para corrigir, mas para justificar o que escrevi.
Escrevo aqui no presente para que no futuro seus olhos possam lembrar de mim, quando sua mente me esquecer.
NEM SEMPRE SOU IGUAL
Nem sempre sou igual no que digo e escrevo.
Mudo, mas não mudo muito.
A cor das flores não é a mesma ao sol
Do que quando uma nuvem passa
Ou quando entra a noite
E as flores são cor da sombra.
Mas quem olha bem vê que são as mesmas flores.
Por isso, quando pareço não concordar comigo,
Reparem bem em mim:
Se estava virado para a direita,
Voltei-me agora para a esquerda,
Mas sou sempre eu, firme sobre os mesmos pés -
O mesmo sempre, graças ao céu e à terra
E aos meus olhos e ouvidos atentos
E à minha clara simplicidade de alma...
Eu escrevo o meu nome nos livros que compro apenas depois de os ter lido, porque só então posso dizer que são verdadeiramente meus.
Olho em redor do bar em que escrevo estas linhas.
Aquele homem ali no balcão, caninha após caninha,
nem desconfia que se acha conosco desde o início
das eras. Pensa que está somente afogando problemas
dele, João Silva... Ele está é bebendo a milenar
inquietação do mundo!
Eu só escrevo sobre coisas que me aconteceram... coisas que não consigo ultrapassar. Felizmente sou bastante autodestrutiva.
A Carta
Escrevo-te estas mal traçadas linhas, meu amor
Porque veio a saudade visitar meu coração
Espero que desculpes os meus erros, por favor
Nas frases desta carta
que é uma prova de afeição
Talvez tu não a leias, mas quem sabe até darás
Resposta imediata me chamando de meu bem
Porém o que me importa
é confessar-te uma vez mais
Não sei amar na vida mais ninguém
Tanto tempo faz,
que li no teu olhar
A vida cor-de-rosa que eu sonhava
E guardo a impressão
de que já vi passar
Um ano sem te ver,
um ano sem te amar
Ao me apaixonar,
por ti não reparei
Que tu tivestes só entusiasmo
E para terminar, amor assinarei
Do sempre, sempre teu...
Estou com saudade de mim. Ando pouco recolhida, atendo demais ao telefone, escrevo depressa,
vivo depressa. Onde está eu? Preciso fazer um retiro espiritual e encontrar-me enfim – enfim, mas que medo de mim mesma.
Se escrevo o que sinto é porque assim diminuo a febre de sentir. O que confesso não tem importância, pois nada tem importância. Faço paisagens com o que sinto.
Razão de ser
Escrevo. E pronto.
Escrevo porque preciso
preciso porque estou tonto.
Ninguém tem nada com isso.
Escrevo porque amanhece.
E as estrelas lá no céu
Lembram letras no papel,
Quando o poema me anoitece.
A aranha tece teias.
O peixe beija e morde o que vê.
Eu escrevo apenas.
Tem que ter por quê?
E eu escrevo um parágrafo e corro pra ver se tem e-mail.
E eu escrevo uma linha e corro pra ver se tem mensagem de texto.
E eu não escrevo nada e também não corro, apenas deixo você chegar
aqui do meu lado, em pensamento. E me pego sorrindo, sozinha.
E me pego nem aí para todo o resto.
Mas sabe o que acontece enquanto isso? Enquanto eu não me movo
porque estou lotada de você e me mover pesa demais?
O mundo acontece. O mundo gira. As pessoas importantes assinam
contratos, ganham dinheiro. As pessoas simples lutam por um lugar
na condução, um lugar no mundo. Estão todos lutando. Estão todos
ganhando dinheiro. Estão todos fazendo algo mais importante e
mais maduro do que suspirar como uma idiota e só pensar em você.
Eu tenho muita inveja dessas pessoas maravilhosas, adultas,
evoluídas e espertas que conseguem separar a hora de ir a uma
reunião de condomínio com a hora de desejar alguém na escada do
condomínio. A hora de marcar o dentista com a hora de engolir alguém.
A hora de procurar a palavra "macambúzio" no dicionário com a hora de
se perder com as suas palavras que de tão simples parecem complexas.
A hora de ser inteira e a hora de catar meus pedaços pelo mundo
enquanto você dá sinais desmembrados.
Eu não consigo nada disso, eu me embanano toda, misturo tudo,
bagunço tudo.
A minha única dúvida é se sou a única idiota a fazer isso comigo
ou se sou a única idiota a admitir que faço isso comigo.
Escrevo por não ter nada a fazer no mundo: sobrei e não há lugar para mim na terra dos homens. Escrevo porque sou um desesperado e estou cansado, não suporto mais a rotina de me ser e se não fosse sempre a novidade que é escrever, eu me morreria simbolicamente todos os dias.
Eu escrevo sem esperança de que o que eu escrevo altere qualquer coisa. Não altera em nada... Porque no fundo a gente não está querendo alterar as coisas. A gente está querendo desabrochar de um modo ou de outro...
Não falo, não suspiro, não escrevo seu nome. Mas a lágrima que agora queima a minha face me força a fazê-lo.
Quando escrevo, sinto um alívio, a minha dor desaparece, a coragem volta. Mas pergunto-me: escreverei alguma vez alguma coisa de importância? Virei a ser jornalista ou escritora? Espero que sim, espero-o de todo o meu coração! Ao escrever sei esclarecer tudo, os meus pensamentos, os meus ideais, as minhas fantasias.