Do nada

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Senhores vivos, não há nada tão incomensurável como o desdém dos finados.

Machado de Assis
Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881).

Nada adianta levar o corpo pra passear se a alma não sai de casa.

Há metafísica bastante em não pensar em nada.
O que penso eu do mundo?
Sei lá o que penso do mundo!
Se eu adoecesse pensaria nisso.

(in O Guardador de Rebanhos)

Somente aqueles que nada esperam do acaso são donos do destino.

Posso não saber nada do coração das gentes, mas tenho a impressão, de que, de tudo, o pior é quando entra a segunda parte da letra de “Atrás da porta”, ali no quando “dei pra maldizer o nosso lar pra sujar teu nome, te humilhar”. Chico Buarque é ótimo pra essas coisas. Billie Holiday é ótimo pra essas coisas. E Drummond quando ensina que “o amor, caro colega, esse não consola nunca de núncaras”. Aí você saca que toda música, toda letra, todo poema, todo filme, toda peça, todo papo, todo romance, tudo e todos o tempo todo, antes, agora e depois, falam disso. Que o que você sente é único & indivisível e é exatamente igual à dor coletiva, da Rocinha a Biarritz. O coro de anjos de Antunes Filho levanta no ar, em triunfo, os corpos mortos de Romeu e Julieta enquanto os Beatles pedem um Litlle help from my friends, e a platéia ainda aplaude e pede bis (o Gonzaguinha também é ótimo pra essas coisas). Meus amigos, abandonados para que eu pudesse mergulhar, voltaram a mil. Tem seus prazeres o fim do amor. Se é patologia, invenção cristã-judaico-ocidental-capitalista, ou maya, ego, se é babaquice, piração, se mudou-através-dos-tempos, puro sexo, carência, medo da morte: não interessa. Tenho certeza que estive lá, naquele terreno. Ele existe.(…) O que quero dizer é justamente o que estou dizendo. Não estou com pena de mim. Está tudo bem. Tenho tomado banho, cortado as unhas, escovado os dentes, bebido leite. Meu coração continua batendo - taquicárdico, como sempre. Dá licença, Bob Dylan: it’s all right man, I’m just bleeding. Está limpo. Sem ironias. Sem engano. Amanhã, depois, acontece de novo, não fecho nada, não fechamos nada, continuamos vivos e atrás da felicidade, a próxima vez vai ser ainda quem sabe mais celestial que desta, mais infernal também, pode ser, deixa pintar. Se tiver aprendido lições (amor é pedagógico?), até aproveito e não faço tanta besteira. Mas acho que amor não é cursinho pré-vestibular. Ninguém encontra seu nome no listão dos aprovados. A gente só fica assim. Parado olhando a medida do Bonfim no pulso esquerdo, lado do coração e pensando, pois é, vejam só, não me valeu.

Não se afobe, não
Que nada é pra já
O amor não tem pressa
Ele pode esperar em silêncio
Num fundo de armário
Na posta-restante
Milênios, milênios
No ar
(...)
Não se afobe, não
Que nada é pra já
Amores serão sempre amáveis
Futuros amantes, quiçá
Se amarão sem saber
Com o amor que eu um dia
Deixei pra você

"Quer pouco: terás tudo. Quer nada: serás livre"

Quando se coloca o centro de gravidade da vida não na vida mas no "além" - no nada - tira-se da vida o seu centro de gravidade.

E quando eu finjo que esqueço, eu não esqueci nada.

O sucesso não vale nada se não temos alguém para partilhá-lo.

Estou tendo uns dias difíceis, mas nada, nada de grave. Vontade de fazer nada, só dormir. Dormir porque o mundo dos sonhos é melhor.

No mundinho habitado pelas crianças, seja quem for a pessoa que as cria, não há nada que seja percebido com mais clareza, nem sentido com mais profundidade que uma injustiça.

Refugio-me nas rosas, nas palavras. Pobre consolação. Estou inflacionada. Não valho nada.

Clarice Lispector
Um sopro de vida. Rio de Janeiro: Rocco, 2015.

Seja o exemplo de tuas palavras e haverá um momento em que não precisarás dizer nada sobre coisa alguma. Tuas atitudes falarão por ti!

O Verso

O verso é um doido cantando sozinho.
Seu assunto é o caminho. E nada mais!
O caminho que ele próprio inventa..

Longe de ti tudo fica sem graça
Nada tem muito sentido
Sinto-me como um campo não florido
Falta-me o ar, quase não respiro
E até sinto enfraquecer as batidas do meu coração
Como se por tanta saudade
Ele se tivesse partido

Está limpo. Sem ironia. Sem engano. Amanhã, depois, acontece de novo, não fecho nada, não fechamos nada, continuamos vivos e atrás da felicidade, a próxima vez vai ser ainda quem sabe mais celestial que desta, mais infernal também, pode ser, deixa pintar. Se tiver aprendido lições (amor é pedagógico?), até aproveito e não faço tanta besteira. Mas acho que amor não é cursinho pré-vestibular. Ninguém encontra seu nome no listão dos aprovados. A gente só fica assim. Parado olhando a medida do Bonfim no pulso esquerdo, lado do coração e pensando, pois é, vejam só, não me valeu.

Adoro Reticências... Aqueles três pontos intermitentes que insistem em dizer que nada está fechado, que nada acabou, que algo sempre está por vir! A vida se faz assim! Nada pronto, nada definido... Tudo sempre em construção.Tudo ainda por se dizer... Nascendo... Brotando... Sublimando... Vivo assim... Numa eterna reticência... Para quê colocar ponto final? O que seria de nós sem a expectativa de continuação?

O homem é o ser pelo qual o nada vem ao mundo.

Jean-Paul Sartre
SARTRE, J., O Ser e o Nada, 1943

Não existe pensador católico. Não existe pensador marxista. Existe pensador. Preso a nada.