Deserto
Num deserto de almas também desertas, uma alma especial reconhece de imediato a outra.
Então me vens e me chega e me invades e me tomas e me pedes e me perdes e te derramas sobre mim com teus olhos sempre fugitivos e abres a boca para libertar novas histórias e outra vez me completo assim, sem urgências, e me concentro inteiro nas coisas que me contas, e assim calado, e assim submisso, te mastigo dentro de mim enquanto me apunhalas com lenta delicadeza deixando claro em cada promessa que jamais será cumprida, que nada devo esperar além dessa máscara colorida, que me queres assim porque assim que és...
Anjos e Demônios
Santo Agostinho certa vez escreveu sobre quando foi para o deserto fazer um retiro de silêncio e foi acometido por todo tipo de visão - tanto demônios quanto anjos. Disse que em sua solidão, algumas vezes encontrava demônios que pareciam anjos, e outras vezes encontrou anjos que pareciam demônios. Quando lhe perguntaram como ele sabia a diferença, o santo respondeu que só se pode dizer quem é quem com base na sensação que se tem depois que a criatura foi embora. Se você ficar arrasado, disse ele, então foi um demônio que veio visitá-lo. Se você se sentir mais leve, foi um anjo.
Sempre existe no mundo uma pessoa que espera a outra, seja no meio de um deserto, seja no meio das grandes cidades. E quando estas pessoas se cruzam, e seus olhos se encontram, todo o passado e todo o futuro perde qualquer importância, e só existe aquele momento, e aquela certeza incrível de que todas as coisas debaixo do sol foram escritas pela mesma Mão. A Mão que desperta o Amor, e que fez uma alma gêmea para cada pessoa que trabalha, descansa e busca tesouros debaixo do sol. Porque sem isto não haveria qualquer sentido para os sonhos da raça humana.
Num deserto sem água
Numa noite sem lua
Num país sem nome
Ou numa terra nua
Por maior que seja o desespero
Nenhuma ausência é mais funda do que a tua.
Eu sempre amei o deserto. A gente senta numa duna de areia. Não se vê nada. Não se sente nada. E no silêncio alguma coisa irradia.
Deus sempre passa pelo deserto os seus heróis, antes de lhes colocar num lugar de propósito e honra.
Se meu amor fosse um oceano
Não haveria mais terras.
Se meu amor fosse um deserto
Você só enxergaria areia.
Se meu amor fosse uma estrela tarde da noite, luz apenas
E se meu amor pudesse criar asas,
Eu estaria voando nas alturas
Pobre coração, o dos apaixonados
Que cruzam o deserto em busca de um oásis em flor
Arriscando tudo por uma miragem
Pois sabem que há uma fonte oculta nas areias
Bem-aventurados os que dela bebem
Porque para sempre serão consolados
Diz uma linda lenda árabe que dois amigos viajavam pelo deserto e em um determinado ponto da viagem discutiram. O amigo ofendido, sem nada dizer, escreveu na areia:
HOJE, MEU MELHOR AMIGO ME BATEU NO ROSTO.
Seguiram e chegaram a um oásis onde resolveram banhar-se. O que havia sido esbofeteado começou a afogar-se sendo salvo pelo amigo. Ao recuperar-se pegou um estilete e escreveu numa pedra:
HOJE, MEU MELHOR AMIGO SALVOU-ME A VIDA.
Intrigado, o amigo perguntou:
Por que depois que te bati, você escreveu na areia e agora que te salvei, escrevestes na pedra?
Sorrindo, o outro amigo respondeu:
Quando um grande amigo nos ofende, devemos escrever na areia onde o vento do esquecimento e do perdão se encarregam de apagar. Porém quando nos faz algo grandioso, devemos gravar na pedra da memória e do coração; onde vento nenhum do mundo poderá apagar.
Não sejais como o homem que morria de sede no deserto,
que ao deparar-se com uma rosa e com um cacto,
preferiu o perfume da rosa
e desprezou o cacto
que poderia salvar-lhe a vida ao saciar a sua sede.
Catedral
O deserto
Que atravessei
Ninguém me viu passar
Estranha e só
Nem pude ver
Que o céu é maior
Tentei dizer mas vi você
Tão longe de chegar
Mais perto de algum lugar
É deserto
Onde eu te encontrei
Você me viu passar
Correndo só
Nem pude ver
Que o tempo é maior
Olhei pra mim
Me vi assim
Tão perto de chegar
Onde você não está
No silêncio uma catedral
Um templo em mim
Onde eu possa ser imortal
Mas vai existir
Eu sei
Vai ter que existir
Vai resistir nosso lugar
Solidão
Quem pode evitar
Te encontro enfim
Meu coração é secular
Sonha e deságua
Dentro de mim
Amanhã devagar
Me diz
Como voltar
É deserto
Onde eu te encontrei
Você me viu passar
Correndo só
Nem pude ver
Que o tempo é maior
Olhei pra mim
Me vi assim
Tão perto de chegar
Onde você não está
No silêncio uma catedral
Um templo em mim
Onde eu possa ser imortal
Mas vai existir
Eu sei
Vai ter que existir
Vai resistir nosso lugar
Solidão
Quem pode evitar
Te encontro enfim
Meu coração é secular
Sonha e deságua
Dentro de mim
Amanhã devagar
Me diz
Como voltar
Se eu disser
Que foi por amor
Não vou mentir pra mim
Se eu disser
Deixa pra depois
Não foi sempre assim
Tentei dizer
Mas vi você
Tão longe de chegar
Mais perto de algum lugar...