Descobrir que te Amo
Amo-te como se amam certas coisas obscuras, secretamente, entre a sombra e a alma.
Nota: Trecho de "Soneto XVII"
Às vezes com a pessoa a quem amo
Às vezes com a pessoa a quem amo
Fico cheio de raiva
Por medo de estar só eu dando amor
Sem ser retribuído;
Agora eu penso que não pode haver amor
Sem retribuição, que a paga é certa
De uma forma ou de outra.
(Amei certa pessoa ardentemente
e meu amor não foi correspondido,
mas foi daí que tirei estes cantos.)
Prefiro Rosas
Prefiro rosas, meu amor, à pátria,
E antes magnólias amo
Que a glória e a virtude.
Logo que a vida me não canse, deixo
Que a vida por mim passe
Logo que eu fique o mesmo.
Que importa àquele a quem já nada importa
Que um perca e outro vença,
Se a aurora raia sempre,
Se cada ano com a primavera
As folhas aparecem
E com o outono cessam?
E o resto, as outras coisas que os humanos
Acrescentam à vida,
Que me aumentam na alma?
Nada, salvo o desejo de indiferença
E a confiança mole
Na hora fugitiva.
Se amo alguns livros são aqueles em que sinto que o seu autor, que pode ter morrido séculos antes de eu ter sido engendrado, se dirigia a mim, a mim pessoal e concretamente, a mim em confidência.
A igualdade é a escravatura. É por isso que amo a arte. Aí, pelo menos, tudo é liberdade neste mundo de ficções.
A meu favor
Tenho o verde secreto dos teus olhos
Algumas palavras de ódio algumas palavras de amor
O tapete que vai partir para o infinito
Esta noite ou uma noite qualquer
A meu favor
As paredes que insultam devagar
Certo refúgio acima do murmúrio
Que da vida corrente teime em vir
O barco escondido pela folhagem
O jardim onde a aventura recomeça.
Não quero ter a terrível limitação de quem vive apenas do que é passível de fazer sentido. Eu não: quero é uma verdade inventada.
Soneto do Amor Total
Amo-te tanto, meu amor... não cante
O humano coração com mais verdade...
Amo-te como amigo e como amante
Numa sempre diversa realidade.
Amo-te afim, de um calmo amor prestante
E te amo além, presente na saudade.
Amo-te, enfim, com grande liberdade
Dentro da eternidade e a cada instante.
Amo-te como um bicho, simplesmente
De um amor sem mistério e sem virtude
Com um desejo maciço e permanente.
E de te amar assim, muito e amiúde
É que um dia em teu corpo de repente
Hei de morrer de amar mais do que pude.
EU TE AMO
Ah, se já perdemos a noção da hora
Se juntos já jogamos tudo fora
Me conta agora como hei de partir
Se, ao te conhecer, dei pra sonhar, fiz tantos desvarios
Rompi com o mundo, queimei meus navios
Me diz pra onde é que inda posso ir
Se nós, nas travessuras das noites eternas
Já confundimos tanto as nossas pernas
Diz com que pernas eu devo seguir
Se entornaste a nossa sorte pelo chão
Se na bagunça do teu coração
Meu sangue errou de veia e se perdeu
Como, se na desordem do armário embutido
Meu paletó enlaça o teu vestido
E o meu sapato inda pisa no teu
Como, se nos amamos feito dois pagãos
Teus seios inda estão nas minhas mãos
Me explica com que cara eu vou sair
Não, acho que estás só fazendo de conta
Te dei meus olhos pra tomares conta
Agora conta como hei de partir
O homem comum que fica furioso se lhe disserem que o pai era desonesto se envaidece se descobrir que o avô era um pirata.