Depoimento de agradecimento
Se o amor é uma flor roxa, que dá no coração dos trouxas.
Eu não ligo, desde que esse coração seja o meu.
Pois meus olhos não cansam de chorar
Tristezas não cansadas de cansar-me;
Pois não se abranda o fogo em que abrasar-me
Pôde quem eu jamais pude abrandar;
Não canse o cego Amor de me guiar
Donde nunca de lá possa tornar-me;
Nem deixe o mundo todo de escutar-me,
Enquanto a fraca voz me não deixar.
E se em montes, se em prados, e se em vales
Piedade mora alguma, algum amor
Em feras, plantas, aves, pedras, águas;
Ouçam a longa história de meus males,
E curem sua dor com minha dor;
Que grandes mágoas podem curar mágoas.
Beba água da fonte onde os cavalos bebem - um cavalo nunca vai beber água ruim. Estenda sua cama onde o gato dorme. Coma a fruta que tenha sido tocada por uma larva. Naturalmente colha o cogumelo em que os insetos pousem. Plante a árvore onde uma marmota cavoque. Construa sua casa onde a cobra fique para se aquecer. Cave seu poço onde os pássaros se protejam do calor. Durma e desperte nas mesmas horas que os pássaros o fazem - você colherá todos os dias grãos dourados. Coma mais verde - você terá pernas fortes e um coração resistente, como os seres da floresta. Nade com frequência e você se sentirá na terra como o peixe na água. Olhe para o céu quantas vezes for possível e seus pensamentos se tornarão leves e claros. Fique calado o bastante, fale pouco - e o silêncio entrará no seu coração e seu espírito será calmo e cheio de paz.
Ignorância Sábia
Aconteceu aos verdadeiros sábios o que se verifica com as espigas de trigo, que se erguem orgulhosamente enquanto vazias e, quando se enchem e amadurece o grão, se inclinam e dobram humildemente. Assim esses homens, depois de tudo terem experimentado, sondado e nada haverem encontrado nesse amontoado considerável de coisas tão diversas, renunciaram à sua presunção e reconheceram a sua insignificância. (...) Quando perguntaram ao homem mais sábio que já existiu o que ele sabia, ele respondeu que a única coisa que sabia era que nada sabia. A sua resposta confirma o que se diz, ou seja, que a mais vasta parcela do que sabemos é menor que a mais diminuta parcela do que ignoramos. Em outras palavras, aquilo que pensamos saber é parte — e parte ínfima — da nossa ignorância.
Se no que tenho dito vos ofendo,
Não é a intenção minha de ofender-vos,
Qu'inda que não pretenda merecer-vos,
Não vos desmerecer sempre pretendo.
O narcisismo é tão forte,
Que na vida do ser humano é uma praga.
É tanta exibição,
Tanta foto, pra nada.
Todo mundo quer ser bem visto;
Por que ninguém tira nudes da alma?
Um dia eu precisei amar minha dor. Era o único jeito que tinha de continuar vivendo. Ou aprendia, ou morreria com ela. Resolvi aprender. Desde então, minha dor é minha companheira, minha mestra, minha parceira. Deixou de ser minha inimiga no momento em que eu a olhei nos olhos e aceitei conhecê-la com mais propriedade. Quis entrar nos mistérios de seus mecanismos com o intuito de poder
administrar melhor as suas consequências.
Eu não a busco, mas, quando chega, abro as portas para que não force as
janelas. Deixo que entre, ofereço-lhe um café, olho nos seus olhos para que cesse o medo e depois me empenho em deixar que fique o tempo necessário, até que se dissolva por si só, pela força do tempo.
O amor da glória temporal era a perdição das almas, que só devem cobiçar a glória eterna.
Quem não sonha o azul do vôo, perde o poder de pássaro. É sonhar, mas cavalgando o sonho e inventando o chão para o sonho florescer.
Mas se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti única no mundo...
Nota: Trecho do livro "O pequeno príncipe"
O Teatro é um templo, onde o palco é o altar e o ator é o sacerdote; e a Arte é reverenciada através do aplauso dos fiéis espectadores.
Uma carta sem segredos
Tenho diante de mim o pulsar sereno de convicções adquiridas. Pudera eu comunicá-las com a mesma serenidade com que pulsam.
Sinto-me no direito de poder dizer. Tens o direito de não considerá-las.
Acredito que viver o conflito consiste em ter nas mãos metade da mudança. Eu sei que mudança de comportamento não se quantifica, mas percebe-se pelo instaurar sereno da paz em nós. É isso que queremos, é isso o que buscamos.
O que importa não fugir, e assumir o autoconhecimento como investimento necessário, afinal tu serás o companheiro que terás de aturar a vida toda. O que és, o que podes, o que não podes e o que deves serão a pauta na qual a vida se inscreverá. Os sonhos e as realidades deverão ser desvendados e, aos poucos, terás de possuir a síntese das duas instâncias. Sonhar sempre, mas o sonho possível, aquele que se percebe brotar da realidade, existencial pousada sobre as mãos.
O que tens hoje nas mãos? O que te é possível? Certamente é o que precisas para a luta que hoje tens de travar. Penso que a ansiedade que existe em ti tem sua raiz no discurso da falta. Buscas o preenchimento de um mundo de ausências que se estabeleceu ao longo de tua vida. Por vezes são ausências rasas, facilmente preenchidas. Uma canção, um encontro com os amigos, mas por vezes elasse configuram e assumem forma de abismo e, nesse momento, não há metáfora alguma que as possa preencher. Aí nasce a saturação. Nada basta, nada explica, nada fala e nada o satisfaz.
Acredito muito no que podes, mas também acredito no que não podes. Uma realidade não anula a outra; apenas traça o perfil de tua verdade, mostra o que és.
Sei o quanto te custa conviver com isso, afinal viveste muito tempo sob o peso da exigência e da cruel comparação aos outros. E por mais verdadeiro que seja o amor que te dedicaram, no fundo, lá onde pulsa a tua solidão ônica, esse amor nunca bastou. Daí nasce a falta, a ausência e a necessidade do discurso metafórico que tanto utilizas.
Metáfora é o requinte com que vestimos a realidade. Ela é o disfarce do real, mostrado, expulso, mas sem revelar. É a luta para que o simples seja maquiado e não seja revelado em seu despojamento. Com a metáfora, nós tentamos nos livrar do desconserto da nudez.
Não há nenhum problema em revestir a vida de metáforas. São elas que nos salvam da mesmice, que dão cor aos nossos dias. Sem elas, a realidade nos esmagaria com seus fardos. Mas há que se cuidar de um detalhe. Não é justo tornar a vida uma metáfora.
Por isso, não temas o momento do despojamento. Compreenderás, com ele, que a vida é só o que temos. Só ela realmente importa. Mesmo porque sem ela nada será possível. Todos os outros desdobramentos se darão se a vida ainda estiver em nós. Crava os olhos na tua pequenez e descubra o quanto ela é grandiosa. És muito mesmo no pouco. O espírito de onipotência não nos faz melhores, apenas mais pesados. Ele nos conduz a um capo de possibilidades e depois nos abandona!
Identificas-te com o “menino abandonado” e por isso pedes o amor de domínio. Inconscientemente te entregas ao domínio dos afetos. Tens necessidade do aconchego e da segurança de outra vontade. Não precisa ser assim. Resguardar a liberdade, ainda que amarrado pelo amor, é um direito a que nunca podemos renunciar.
Aqui mora o conflito do amor possessivo. As pessoas nos tratam de acordo com o que autorizamos. Se inconscientemente pedes o domínio, ele se dará. Mas sei que estás incomodado com as amarras afetivas em que te encontras. Vives o fastio da dependência. Que bom. A saturação pode ser a porta por onde nos chegam grandes mudanças. A crise sempre resguarda a possibilidade de uma grande conquista. O caminho da mudança está diante de ti. Terás primeiramente de proclamar tua liberdade, para que alguém te ame sem te aprisionar.
Essa proclamação não é grito que se aprende da noite para o dia, mas cedo ou tarde terá de começar. Não poderás fugira vida toda. É uma questão de sobrevivência. Aquilo de que foges hoje, amanhã terás de temer ainda mais. Quanto mais adiares a luta, tanto mais frágil te sentirás!
A comunhão que o coração de Deus nos inspira torna-nos participantes de outras histórias. Não estamos sós. Em algum lugar, um coração sofre semelhante angústia. E busca e deseja o aprimoramento do modo de ser e estar no mundo.
Sei que queres o aprimoramento do teu ser. Primeiros passos já foram dados. Hoje és mais livre do que foste ontem, afinal o querer é a primeira configuração do realizar. Ele é essência do ato de ser livre, e por meio dele nos inserimos na dinâmica da vida. Quem não alimenta o seu querer, mesmo que ainda respire, pode se considerar morto.
Mais vivo do que nunca vou ficando por aqui. Desculpe-me ter invadido a tua casa. Não sei se cheguei em boa hora!
Desconsidera tudo o que julgar desnecessário. Falar sozinho é sempre um risco, afinal as intervenções alteram e purificam os pontos de vista e as compreensões.
Tens agora em tuas mãos um discurso ou uma pregação – como diria um outro amigo meu –, mas eu te asseguro que é um prosear bem-intencionado, fruto de um coração irmão que no silêncio da prece luta contigo!
Levar-te à boca,
beber a água
mais funda do teu ser -
se a luz é tanta,
como se pode morrer?
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