Crônicas de Violência

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COMIDA FRIA

Lá em casa, habitualmente, não cozinhamos aos sábados. Saí para buscar o almoço com a nossa fornecedora atual, Dona Maria, que nos últimos anos abriu o portão de sua casa e começou a entregar aos finais de semana uma deliciosa feijoada, nas versões tradicional e “light”. Sorridente, falante e cortês, Dona Maria atende a todos com o seu gorro e avental branquinhos, e faz questão de dizer que tudo ali é feito com qualidade, asseio e carinho. Motivada pelo pedido de alguns clientes, estruturou a sua garagem e agora mantém meia dúzia de mesas plásticas, forradas com um tecido rendado, quatro cadeiras em cada e um freezer cheio de cervejas e refrigerantes para que os clientes possam se deliciar com a iguaria ali mesmo, caso prefiram.

Estacionei o meu carro numa rua perpendicular. Peguei a minha filha pela mão, tranquei e acionei o alarme e fui me aproximando da casa de Dona Maria. Do lado do seu portão principal, estava estacionado um carro muito bonito, com cabine dupla, cor prata e recém lavado, denotando o capricho do dono. Em um piscar de olhos, vi um rapaz de boné baixo (acho que para esconder parte do rosto) ao lado do carro, na porta do passageiro. Antes que eu pudesse processar o que estava acontecendo, o rapaz retirou a camiseta branca, enrolou em algo (que depois fui descobrir que era uma pedra bem grande) e bateu com toda a força dos seus braços finos no vidro da porta do passageiro, fazendo cacos de vidro voarem para toda lado. Mais rápido que o The Flash, meteu a mão dentro do veículo violado, retirou algo e saiu correndo. O “algo” era uma bolsa feminina, da cor vermelho escuro. O alarme do carro bonito começou a gritar alto, chamando a atenção do dono que estava no interior da casa de Dona Maria, aguardando o almoço.

O senhor careca, proprietário do veículo, também demorou alguns segundos para entender o que havia acontecido. Já com as mãos na cabeça em desespero, ouviu o meu grito abafado. Eu apontava e sacudia a mão desocupada na direção onde o rapaz decidiu correr… Mas foi em vão. A nossa capacidade cerebral de entender a cena, agir, gritar, fazer qualquer coisa útil foi infinitamente mais vagarosa do que as pernas compridas do rapaz tomando a direção já calculada.

Na sequência, uma pequena senhora de cabelos alaranjados também apareceu e descobri que era a dona da bolsa roubada, esposa do calvo senhor. A mesma, chorosa e assustada, afirmava repetidamente que não havia dinheiro ou nada que um meliante pudesse aproveitar lá dentro, somente seus documentos, cartões, maquiagens, remédios e pertences pessoais.

Tentando concluir a minha missão ali, apesar do susto e da injeção de adrenalina, entrei na casa de Dona Maria (que nessa hora voltava da rua após procurar ajuda policial com o casal) e meu coração estremeceu diante da cena que vi. Em uma das mesas com forro rendado colocadas à disposição dos clientes, duas porções completas e caprichadas (e ainda nem tocadas) da deliciosa feijoada da Dona Maria. Aquele momento íntimo e sagrado da dupla havia sido interrompido pelo grito do alarme, e acredito que os dois, naquela mistura de emoções e sobressalto, haviam perdido o apetite.

Nessa hora, minha filha, sacudindo levemente o meu braço, pediu explicações:

– Mamãe, aquele era um ladrão?

– Sim, meu amor, era.

– Por que ele quebrou o vidro do carro do moço?

– Para pegar dinheiro, meu bem. Ele não tem trabalho e não tem dinheiro para comer. Por isso faz isso com as pessoas – Expliquei de um jeito que ela pudesse entender, sem entrar em detalhes sobre o que eu realmente pensava a respeito do destino do dinheiro (não) roubado. E ela continuou:

– Uai mãezinha, mas se ele estava com fome não era mais fácil ele pedir um prato de feijoada para Dona Maria? Ela é tão carinhosa e boazinha e faz um montão bem grande de comida…

Dizendo isso, ela pegou a sua bolsinha rosa e começou a retirar suas moedas:

– Mamãe, essas moedas aqui pagam uma feijoada?

Sem entender, respondi:

– Não meu amor, não é suficiente. Mas para quê você quer comprar outra porção? Uma só dá pra gente, mamãe já pediu e pagou.

– Eu quero comprar comida para dar para aquele rapaz. Vamos encontrá-lo. Daí ninguém fica triste. A senhorinha do cabelo engraçado não precisa chorar por causa da bolsa dela, nem o moço careca precisa ficar triste com o carro quebrado. E o rapaz não precisará mais fazer coisas ruins com outras pessoas.

Ajoelhei, abracei a minha filhinha, beijei a testinha inocente dela e nada mais consegui dizer.

Peguei a embalagem térmica com uma porção da deliciosa iguaria, busquei para mim a mãozinha miúda e fomos caminhando devagar, atravessando a rua, em silêncio.

Antes de sair dali ainda pude observar novamente a mesa posta para o casal. Corações aflitos e comida fria.

Inserida por nivea_almeida

ENTERRAMADO

Eu sou a muito tempo a petrificação da raiva.
Meu corpo já foi assim.
Meu corpo já foi liquidificado.
Meu corpo já juntou na terra.

Eu já fui enterrado,
em terra amarrado,
enterramado.

Meus pais, filhos e avós já choraram,
E já desistiram de lacrimejar.
Minha compania já se casou no verão,
Nem vem mais me visitar.

E eu sou solidão,
Aqui no fundo do mar.

Do mar bíblico,
onde o colosso da justiça,
lança o pecado.

Cá estou .

No mundo do esquecido.

Oque fiz eu pra isso?

Bom não me lembro,
morro esquecido.
Lembro do pior acontecido.

Morri.

Não foi de febre,
Nem de saudade,
Não foi porque quis,
Nem pela idade.

Morri por má sorte,
Porque encontrei no caminho o espírito covarde.
E os anjos estavam ocupados.
Sei lá, talvez no céu ceavam.

E eu fui machucado.

Me espancaram.

Me mutilaram.

Me enforcaram.

Me alvejaram.

Me estruparam.

Me jogaram no lago.

Mas calma,
não foi simples assim .

Me machucaram, quando voltava da missa, próximo do ponto de ônibus me raptaram, me doparam, me usaram.

Me quadricularam, me puserram fogo,
me deixaram na terra.
E como esses, meus outros também me abandonaram.

Me espancaram, quando fui ouvir minha música favorita,
riram da minha roupa,
me chamaram de bicha,
me jogaram no chão,
arrastaram pelos cabelos,
me segaram com os próprios dedos, arrancaram minha roupa e enfiaram todos os dedos em mim.

Depois levaram minhas feias roupas,
sem deixar meu corpo eu cobrir,
nem minha mãe me descobrir,
eu não tinha nem um dente,
minha cabeça se fundiu com a calçada, quem me viu ,
até hoje não consegue dormir,
minha mãe acha até hoje que na verdade eu só fugi.

Me mutilaram, quando neguei dois tragos.

Me espalmaram a cara,
me prenderam no quarto,
e tiraram do peito meu filho,
me empurraram pela casa,
me levaram pra fora,
levaram também uma faca,
ela andou por tudo,
andou bem mais que as minhas lágrimas,
só perdeu pro meu sangue na caminhada,
com cigarros me queimaram,
onde já nem doia,
doía deixar meu filho ainda no início da vida.

Me largaram lá mesmo do lado de fora as traças,
depois do jornal eu fui capa,
meu filho já estava longe,
e eu nem constava no mapa.

Me enforcaram, quando menti dizendo que não sabia onde ela estava,
tinha medo que ela acabasse enforcada,
fui levada pro banheiro,
ajogada na privada,
eu gritava mas a TV estava ligada,
me deram vários tapas na cara,
me ergueram pelos cabelos,
me estrangularam na mão,
deixaram a vida me escapulir de olhos abertos,
foram perversos.

Me alvejaram,
perto de casa,
eu só caminhava com uma sacola de pão,
a morte vinha automatica,
seu barulho eu conhecia,
me veio não sei de onde,
foi de costas possívelmente,
esse tipo de morte,
por satisfação e lazer nunca vem de frente.

Corri mas já era tarde,
senti sede mas nessas horas a garganta arde,
a vizinha gritou,
chutou a roda do covarde,
a sirene soou mas já era tarde.
Na sirene mais alarde,
na minha morte mais covardes.

Me estruparam,
quando fui tomar banho de rio,
quando me escondi atrás da pedra,
Escondida do meu tio,
quando corri entre a plantação de pinho, quando me espremi entre os frepinhos, quando cai em meio aos espinhos,
quando eu não tinha nada,
nem sabia falar os corrigindo.

Me deixaram ali as margem do rio,
e naquele dia choveu,
fui pra depois da fronteira,
o porco da selva fria meu corpo comeu.

Me jogaram no lago, quando beijei ele depois da aula,
se consumiram de inveja,
me seguiram até a passarela,
me pediram satisfações,
eu não tinha pra lhes dá,
então levaram meu celular,
gravaram eu apanhar e me empurraram de lá,
aproveitaram que ninguém viu chamaram seus primos,
e me tiraram da água,
brincaram comigo,
me lançaram no fundo do lago,
que é tão frio que até hoje existo.

Em dois planos em alma vivo,
entre esse lago ou aquele do destino esqueçido.

Há quem sou ,
Ou melhor quem eu teria sido.
Não vale a vida ,
Se na verdade nada é vívido.

Não tem razões me dar um nome,
se passar o resto dos anos no subsolo pérfido.
Não queria ter pisado nesse mundo perdido.

Não tenho se quer um túmulo vazio,
Eles casaram,
Morreram de velhice,
Foram condecorados,
Praticaram outros assassinos,
Voltaram pra casa e almocaram.

E eu estou aqui,
pra sempre calado.
Eu sou o morto,
Eu sou o que colhe os frutos do cruel.
Se existir justiça,
Ela não está nem aí na terra,
Nem aqui no céu.

Inserida por DanielaPriscila

Li uma vez sobre usarem ‘corpos das outras mulheres como nossos campos de batalha’ e me ocorreu que muito além do corpo
usam também a nossa essência para guerrear em batalhas pessoais.
Por que não percebemos o quanto isso é cruel?
Permitir que nos usem como se não existissem milagres acontecendo dentro de nós a todo momento.

Inserida por tinlbsb

"⁠Um pedido de desculpas e umas flores não apagam uma estalada, uma joia ou um presente não apaga as ofensas, mas uma saída de vez da nossa vida é libertadora e renova a paz e a força para conquistarmos os nossos sonhos e planos. Nenhum homem tem direito de
agredir uma mulher e nenhuma mulher tem o direito de tratar mal um homem, a violência deixa marcas eternas na alma e não tem cura..."

Inserida por cristiana_teodoro

Segredo da vida...

Quem poderá desvendar
O verdadeiro segredo da vida
Almas vão, almas vêm.
Belas almas que são destruídas
Crianças igualando-se a velhos,
No sentido de serem tratadas.
Avenidas, casas velhas e barracos.
É o que raramente lhe são reservadas
Nas matas, o triste som das derrubadas.
Nas cidades, homens que lutam pela vida,
Porém são vencidos pela amarga sorte...
No Governo, a impunidade da Elite.
E o aumento de sua guarida.
Nos presídios, homens de olhares tristes
Esperando a sua antecipada morte...
Nascer, crescer...Reproduzir e morrer.
Este é um dos grandes segredos da vida
Um outro é...amar e sofrer
No ar poluição a vagar
No chão, no interior das florestas;
Animais em decomposição
Nos belos rostos de quem ama,
Rolam quase que sempre...
Doces lágrimas de decepção...
No olhar do adolescente,
Esperanças crescentes...
No olhar dos idosos,
Uns passam amargura,
Como experiência de uma vida dura...
Outros passam como exemplo,
A mais doce ternura...
No olhar das crianças, muita preocupação, como que dizem: será que conseguiremos carregar essa cruz?
Um dia eu hei de ver no olhar de cada criança,
Não preocupação, não tristeza...
Mas esperança, certeza e uma forte luz...

Inserida por LuhcyhMirandah

O circo
Estamos no picadeiro e não existe ensaio.
Palhaços contando as mesmas piadas sem graça.
Trapezistas sem rede para aparar.
Malabaristas tentamos não deixar a peteca cair.
Mágicos sem cartola multiplicando o pouco da dignidade que nos sobra.
Domadores de toda a violência explícita, ou não.
Sem receber aplausos por nossa atuação.
É! Nossa vida parece um circo...

Sou um Grito de Arte,
Uma escritora falida,
Num estrondo de silêncio,
Ensurdecedor,
Minha Arte vive em mim,
Mas, não posso viver da minha Arte,
Sou um Grito,
Estrondoso,
De silêncio,
A vida é uma violência à minha inteligência,
Onde todos os dias,
Sou violentada à deixar a esferográfica de lado para os versos,
E colocá-la entre os dedos,
Para melhor atendê-los,
Essas são as grades do capitalismo selvagem,
Onde,
Um uniforme, para alguns é capaz de ditar regras de julgamento,
Onde deixo meu mundo das ideias,
Escritora que sou, para escutar insultos,
Falta de educação, falta de empatia, não de todos,
Mas, de muitos,
Que julgam-se melhores por estarem por detrás de uma mesa...
Ou com um crachá de cargo à mais,
Tanto faz.

Inserida por LeticiaDelRio1987

A vida é um espelho.
Saiba quê, o que quer
pro outro é pra você
Somos todos um
É a verdade.

Sua mãe foi agredida
por seu pai?
Seu cunhado
ofende sua irmã?
Que tal trazer felicidade?

Não erga a mão
a quem te deu uma família!
Tente ouvir a voz
que vem do coração
Tenha mais respeito
e amor a quem te ama
Troque a violência
pela gratidão

Um buquê de flores
não pode esconder
o que sua atitude revela
Procure amar
Tente entender
A vida é um espelho
Tudo volta ao seu lugar

Inserida por leandro_mathias

O motorista foi agredido
Num ato de pura vingança.
Assim o país está perdido
Com certa gente na liderança.

Muitos, por lá já pereceram
E nunca acharam um culpado.
Aqui, por justiça imploram
E suplicam por um amparo.

Provocam vários desacatos
E dizem-se vítimas do sistema.
São imunes aos seus atos
E desprovidos de qualquer lema.

Inserida por antoniovilelagomes

⁠Bolinhas de gude

Jorginho foi preso
quando jogava bolinha de gude
não usou arma de fogo
nem fez brilhar sua navalha

Jorginho era criança igual às outras
queria brincar
O brinquedo poderia ser um revólver
uma navalha
um pandeiro
quem sabe um cavalinho de pau
Jorginho queria brincar

Jorginho viu um filme americano
no outro dia
fez uma quadrilha de mentirinha
sempre brincando
a quadrilha foi ficando de verdade

Jorginho ficou grande como Pelé
todos os dias saía no jornal...

Televisionado
só não deu autógrafo
porque estava algemado

Ele era o facínora
que brincava com bolinhas de gude.

Inserida por pensador

⁠Quem diria
Aquele homem tão bom
que a maioria falava bem
dentro de casa não era bom
e a sua mulher não fazia o bem
Dentro de sua casa se sentia o rei
e só queria ser servido, obedecido
sua vontade estabelecia como lei
e por pouca coisa ficava aborrecido
Suas palavras surravam a alma dela
o seu desprezo a esmagava
entre os amigos fazia piadinhas sobre ela
aliás amigos machistas, o apoiava
Um certo dia ela se cansou
e quis terminar tudo,
então ele não aceitou e a matou
e só assim ela descansou

Inserida por juliana_rossi

Meus olhos fecharam-se, e minha boca secou
A força não me era mais presente
E meus gritos, inválidos

Assim, foram destruídos
Respeito e caráter
Marcando minha pele, rasgando minhas vestes,
Expondo segredos

Expondo um vil sentimento
Instável pensamento
Doentio até

E meus olhos, fecharam-se
Para a realidade
Onde via tua face
Enraivecida e perversa

Mas, cansado,
Entorpecido,
Ferido,
Os abri.

Inserida por AmaiSforza

Covid-19

Há relatos de portugueses agredidos além-mar,
Culpando-os do novo vírus propagar.
Muitos media não noticiam estas atrocidades, nem encontram os culpados.
Coitados… permanecem por lá, assim, desamparados!

Será que estas hostilidades não revelam racismo,
Ou, de certa forma, desejo de vingança ou segregacionismo?
Pois, muitos povos vivem no recato e tranquilidade
E, sempre, imunes a qualquer atrocidade…

by António Vilela Gomes

Inserida por antoniovilelagomes

⁠O que fazer quando é maltratada, abandonada e agredida?
Eis a questão,ou você aceita,ou sai fora,...
A dor é forte o bastante pra não aguentar?
Ou você acostuma com ela e aceita mais uma vez...
Meu coração dói tanto que não consigo nem pensar o que fazer!
Talvez fugir?...
Ou ficar um pouco mais e esperar que tudo mude...
Talvez amanhã eu esqueça novamente de tudo e te perdoe...
Mas agora nesse momento,eu só queria um pouco de amor,...
Um abraço,
Ou talvez um carinho gostoso...
Será que eu estou preparada pra próxima?
Acho que não!
Aqui eu não fico mais nem um dia!
Mas pra onde vou?
Se tudo que penso agora é em morrer, Amanhã eu posso não estar mais aqui!
Pois amanhã pode ser que eu esteja viajando,ou me mude pra longe!
Mas com você eu não fico mais.

Inserida por Elianedossantoslima

Todo dia o mundo acaba
Todo dia acaba tudo
Pra alguém
Mas se você não conhece não importa
Ou importa pra quem?

Tantas mães chorando
Enquanto o mundo segue girando
A vida segue andando
Pra frente ?
Mas tem que aguardar
O iml liberar o corpo
Para o seu mundo ela enterrar

Mas se você não conhece não importa
Ou importa pra quem

O mundo acaba Todo dia
Porque todo dia a vida acaba
Mas fica difícil de suportar
A injusta noção de justiça
Que o estado incita a acreditar
E temos de dizer amém

Sem lutar ?
E a minha luta
Você não conhece
Você não se importa
Ou importa pra quem

Não aguentamos mais
enterrar nossas crianças
Seus sonhos nossas esperanças
Não aguentamos mais
Passar a noite em claro
Porquê a polícia vai entrar
Enquanto os "nobres" festejam ao som de fogos o fim de cada ano

A gente "dorme" aos sons dos tiros
Aqui no fim do mundo
Enquanto o marketing divulga
É maravilhosa nossa cidade
Balas perdidas encontram crianças em tenra idade
Onde ?
Lá no fim do mundo
Nas comunidades

Daqui alguns dias não serão lembrados
Enquanto a gente chora nossos mortos
E se pergunta o porque disso
Pela segurança eles dizem
Tá seguro para quem mas vc ñ conhece não importa Ou importa pra quem

Inserida por pamela_pacheco

Eu sou a sociedade
e sou especialista em criar
Não pense que é fácil
Precisa primeiro se acostumar
Já não dizia o fulano
Necessário ñ é viver
Necessário é...
Enfim vou lhe ensinar um macete
Não tem erro pra entender
Meu método é simples
E o que eu faço?
Eu fecho os olhos ,
Eu fecho os olhos quando a criança chega na escola depois de ser espancada,
Eu fecho os olhos para as crianças dormindo na calçada,
Eu fecho os olhos para a menina de 10 anos grávida ,claramente violentada,
Eu fecho os olhos para o assalto que vejo da janela na minha sacada
Eu fecho os olhos para o meu colega desviando a verba da merenda,
Eu fecho os olhos e durmo em paz?
Não precisa exagerar também,
Quem tem paz num mundo desse ?
Não penso muito .
Eu crio muito!
o importante são os números
não as pessoas certo ?
Um dia mais tarde tragicamente eu encontro tudo aquilo que criei
E sou manchete no jornal da tarde
Morre beltrano com requintes de crueldade
Aquela que eu não repudiei
Aquele assalto na esquina era meu filho,
Mas como eu não reconheci
na hora eu não me importei
Os monstros que eu criei estão sempre a espreita ,
A violência ,o medo ,a fome , o descaso.
Quando bati o carro dia desses fui parar na emergência
faltaram remédios para me salvar , lembrei me do meu colega
que desviava a verba sem pensar
Lembro também de ver uma notícia
de um hospital público que por desvio
de verba não tinha
o mais básico para trabalhar
eu fechei os olhos novamente
e dessa vez eu não os abrirei mais
deixo este mundo como um gigante
Por que tudo o que eu criei
está aí pra te assombrar
Você segue como eu , a fechar os olhos
E no final abre a boca pra reclamar ?
Ha ha ha ha ha ha
________Pamela Pacheco

Inserida por pamela_pacheco

⁠Vestimenta
Vesti-me de alegria e pelo mundo fui.
A cada passo dado. Só tristeza havia.
Aliada ao desespero e a violência que
em cada lugar existia.
Troquei a minha vestimenta .
Coloquei a da seriedade.
Passei por vários lugares, vi crianças
que para mim sorriam, estavam sujas
e eram pobres.
Entre elas apesar dos pesares havia a
alegria.
Compreendi que , quanto menos idade têm
e com dificuldades maiores, as crianças
melhor visão do mundo possuem.
Coloquei então a roupa da esperança, poucos
foram os que até a mim chegaram , e não se
preocupavam em me seguir.
Vi que o mundo precisava de esperança e alegria,
menos ódio, mais compreensão e transparência,
coisas que só as crianças, com sua pureza e
isenção de negatividades, sentem e vêm.
Roldão Aires
Membro Honorário da Academia Cabista de Letras. RJ
Membro Honorário da Academia de Letras do Brasil
Membro da U.B.E

Inserida por RoldaoAires

⁠Ciclopes modernos.
Pedro é policial numa das regiões mais violentas do mundo – a América Latina. Juntamente com o Caribe corresponde a apenas 8% (oito por cento) da população mundial, mas é a fatia planetária onde ocorre um terço dos mais de 437 mil homicídios registrados anualmente.
De origem proletária, perseguiu seu sonho de se tornar um agente da lei.
Ele vive da segurança em meio à insegurança; sabe que a probabilidade de ser morto em um assalto chega a ser 6.000% (seis mil por cento) superior à de um cidadão comum. Também sabe que o número de roubos no continente onde vive é absurdamente alto.
Quando entrou para a polícia lhe prepararam para a guerra. Os testes físicos eram rigorosíssimos. Teve que fazer curso de sobrevivência na selva ficando quatro dias sem se alimentar e tomando água da chuva. Os sentimentos mais primitivos da evolução humana afloraram do seu interior naqueles dias.
Nos tempos de preparação da academia foi submetido a todo tipo de humilhação. Eram trotes, pancadas, xingamentos, castigos e até sessões de tortura.
Foi doutrinado na certeza de que aquele que conseguisse passar por tudo isso estaria pronto para cumprir sua difícil missão e suportar os desafios da carreira. Algumas pessoas também lhe disseram que tudo aquilo iria lhe causar traumas violentos e fazer com que ele descontasse no cidadão parte do que sofreu no seu treinamento.
Pedro odeia o discurso de alguns sociólogos que dizem que o Estado treina uma polícia para a guerra e a coloca para trabalhar em atendimento ao cidadão. Na sua concepção, a lida diária correndo riscos da profissão e enfrentando criminosos com fuzis e metralhadoras demonstram um estado de guerra urbana.
No mês passado ele trocou tiros e matou o assaltante de um supermercado. Há aproximadamente seis meses ele auxiliou no parto de uma moradora de rua cuja criança nasceu dentro da viatura enquanto era levada para a maternidade pública. Pedro não é Deus, mas já trouxe uma pessoa à vida e levou outra à morte.
No bairro onde trabalha o índice de homicídios é muito alto. Em quase todos os seus plantões sempre atende a pelo menos um homicídio. São tantos os atendimentos que ele já não sente mais a compaixão pelo defunto – virou rotina, é algo muito normal. Costuma dizer que o ruim desse trabalho é no dia que tem que enfrentar algum homicídio cuja vítima é criança; isso lhe estraga o dia, embora tenha medo de que a rotina também lhe transforme em um ser indiferente a um cadáver infantil.
Leu em um livro de autoajuda que o ser humano para ser considerado normal precisa despertar e ter o controle de todos os sentimentos (amor, ódio, paixão, compaixão, raiva, alegria, inveja, orgulho, piedade ...). Alguns desses ele já não tem, outros não consegue conter e o pior é que alguns se manifestam em ocasiões erradas. Sua engrenagem cerebral de sentimentos parece estar um pouco desajustada ultimamente.
O meio em que vive não é nada favorável. Lida com pessoas alcoolizadas, entorpecidas, psicóticas, criminosas, vítimas chorando, gente gritando, famílias brigando, gente lhe xingando etc. A jornada de doze e às vezes de vinte e quatro horas corridas também lhe confunde o relógio biológico. Quando trabalha à noite sente sono, quando termina o turno e vai para casa descansar tem dificuldade em dormir (fica pensando no próximo plantão).
A vida conjugal também não anda nada bem, mas isso é visto com normalidade, afinal, dos colegas de profissão ele é o único que ainda está suportando o primeiro casamento.
Alguns sinais de estresse já apareceram como a hipertensão e a diabetes; “nada preocupante” reponde ele, “é coisa do dia da dia e da alimentação de rua”. Nos turnos de trabalho se alimenta em lanchonetes ou restaurantes que dão descontos para policiais.
Nas madrugadas sombrias, Pedro e os demais ocupantes da viatura são a única presença e a representação física do Estado. Não tem julgador, legislador, fiscalizador nem consultor – os problemas surgem e o Estado age pelas mãos de Pedro e seus colegas de trabalho.
O salário não é grande coisa, mas ajuda a manter um padrão de vida diferenciado no bairro pobre onde mora. Ele se orgulha de ser tentado à corrupção todos os dias e nunca ter cedido a ela.
Nos telejornais e nos sites de notícias aparecem analistas econômicos dizendo que Pedro e os demais servidores são os responsáveis pelo desastre das contas públicas. Pessoas como ele são consideradas privilegiadas e que se aposentam cedo demais. Nos intervalos de cada programa surge o patrocinador: sempre um banco, uma financeira ou um operador de fundo de pensão que lucram fortunas emprestando dinheiro ao governo com juros estratosféricos.
Ontem à tarde o parceiro de trabalho de Pedro foi convocado para fazer a segurança do parlamento onde estavam sendo votadas as novas leis que regridiriam o regime previdenciário dos funcionários públicos. Havia um grande protesto nos acessos à casa de leis. No tumulto eles empurraram o amigo de Pedro que sacou a arma e atirou a esmo atingindo fatalmente um professor que lutava por seus direitos.
Hoje o noticiário só fala desse assunto. Curiosamente, algoz e vítima estavam socialmente no mesmo lado – ambos seriam prejudicados com as alterações legais.
Provavelmente o policial continuará preso por mais algum tempo e será expulso do serviço público. Suas perspectivas futuras não são nada boas.
Pedro foi visitar o amigo e passou a refletir sobre os acontecimentos: está em dúvida sobre qual lado é o certo e qual é o errado.
Na expectativa de que Deus lhe desse uma palavra nesse momento, abriu a Bíblia aleatoriamente e leu um versículo em 2ª Timóteo 4:7-8:
“ Combati o bom combate, acabei a carreira, guardei a fé. Desde agora, a coroa da justiça me está guardada, a qual o Senhor, justo juiz, me dará naquele dia ...”
Está confuso sobre qual seria o “bom combate”; como diferenciar as batalhas que devem ser enfrentadas e as que não compensa combater ?
Pedro vivencia a saga de “Dom Quixote de La Mancha” imortalizado por Miguel de Cervantes. Ficou mentalmente transtornado pelo descompasso entre seu idealismo e sua realidade de vida.
“...Enfrentar o inimigo invencível,
Tentar quando as forças se esvaem,
Alcançar a estrela inatingível:
Essa é a minha busca.” (Dom Quixote)

Inserida por Peralta71

⁠Na dor, a leveza voa

Verborragia que sustenta o vazio
Política do Cancelamento: Cultura, documento
O “não importar-se”, já se importando, o representante
A voz, a cor, a raça, a cega religião, o sexo, a carne
É corpo em movimento, alma em aflição, morte em silêncio.

O batom vermelho, magra, alta, loira, olhos em chamas
O perceber do cantar dos pássaros nem é mais música
Morte em vida, um ser finito, o amor em falência
Ufa! Uma janela, mas o vizinho não é social, ele é chefe
Uma porta, a música, a dor, a dança, tudo cansa.

O outro que completa, o inimigo sempre à espera
O silêncio que faz gemer, o doloroso ser sem ter
Gritar, correr, seguir... Ao passo que sou mulher
Existe vida, em demasia, no excesso do calar
O tu, nós, vós, a força de um todo em ação.

Inserida por iasminny_loiola

⁠Não existe paz individual…
Não existe progresso intelectual e tecnológico em uma sociedade,que não se trasmute em tragédia, se esta evolução não vier acompanhada de uma cidadania plena e efetiva nesta mesma sociedade, focada em valores coletivos e universais de solidariedade e equidade.

Inserida por ADRIANOGARCA