Contos Engraçados
"Eu cansei, cansei de pessoas que vivem atrás da tela do celular o tempo todo, escravas do julgamento dos outros, todos com joguinhos de visualizar e não responder, de se fazer de difícil, de tentar impressionar alguém que você nem sabe quem é.
Eu quero é que o celular descarregue e que todos os carregadores do mundo tenham acabado. Quais relações sobreviveriam? Quais romances seriam capazes de ainda se manter? A resposta é simples, seriam os mesmos doidos que não se preocupam de demonstrar que sentem falta! De nada adianta anos de relacionamento sem intensidade? Mais amor se pode gritar em poucos meses do que em anos de silêncio.
Não te conforma com esse silêncio, vai atrás do amor que te é gritado no domingo de amanhã e na quinta de madrugada. Fica com quem é capaz de pegar um avião por ti, fica com quem te da aquele presente barato, mas que representa tanto. Aquela pessoa que fala de ti para todos os amigos, que te manda músicas, que não pensa duas vezes antes de te chama para a estreia de um filme bom no cinema. Tu não és segunda opção, para quem só tem tu no coração.
Mas agora, só fiques se for com honestidade, se for para ser doido junto. Uma pessoa que grita amor sozinha, uma hora perde a voz."
Você posta uma foto nova e espera likes, mas não é qualquer like que você quer, não é? Sua foto nova pode ser a mais perfeita do feed e ter recorde de likes. Mas a pessoa que você realmente queria impressionar não curtiu, você atualiza e atualiza desesperadamente procurando aquele coraçãozinho no meio de tantos outros banais.
Então te vem o desespero, você tenta fazer histórias para ver se ele visualiza. Coloca uma coroa de flores na cabeça, mostra o que está assistindo na netflix, posta foto no espelho e nada. Você confere seu whats para ver se ele está online e ele está, ele só não se importa mais com você e não acha mais suas fotos com filtro de gatinho fofas. Agora ele curte as fotos de outras pessoas e assiste as histórias de outras pessoas.
E você vai fazer o que? Vai continuar esperando likes e fazendo histórias para o passado ou vai apagar todo esse feed preto e branco, deixar o celular em casa e viver sua vida sem se importar com as visualizações?
Senhor Clomb
Esse conto começa com uma cartinha de uma menina de 6 anos para o seu vizinho......
“Prezado Senhor Clomb, como o senhor está? Não é novidade que o senhor já sabe que a casa da direita é nossa, quer dizer da minha mãe e minha. Mas, o fato é que o senhor continua jogando entulho no quintal aqui da casa. O que tem na cabeça? O que pensa que está fazendo? Não sabe que a nossa casa é o nosso lar e é sagrado? Poderíamos jogar todos os lixos que temos, mais o que o senhor envia pra gente na sua casa. Mas, não vamos fazer isto. Não somos iguais. Toda a terça recolhemos os lixos e mandamos para a reciclagem levar e o resto para o caminhão de limpeza levar. Mas, fico aqui pensando, será que o senhor quer ajuda para descartar seu lixo? Não consegue, e é por isso que fica descartando seu lixo em minha casa. A minha mãe e eu moramos somente nós duas naquela casa e não temos outra pessoa para ajudar na limpeza da casa, por isso, pego todo o lixo e refaço o serviço, que o senhor nos dá extra para que não fique o entulho na nossa porta. Mas, eu pergunto, por que? Porque o senhor não gosta da gente? Precisa de algo? Posso ir na sua casa ajuda-lo com seu lixo uma vez por semana. Mas, ficar jogando lixo na minha casa, é um absurdo. Se quiser minha ajuda, posso ajudar. Posso e não vou cobrar nada do senhor. Minha mãe me ensinou que devemos amar o próximo e ajuda-lo. Embora, eu tenha 6 anos, como bem, brinco, ajudo em casa e ainda posso auxiliá-lo nas suas tarefas de casa”. O senhor Clomb, sem saber que dizer, nunca mais jogou lixo na casa da menininha, que tímida e doce cativou o coração de pedra do senhor Clomb. Depois desta carta, também o senhor Clomb escreveu uma cartinha para a menininha, que por sinal, se chama Olívia e estava escrito assim:
“Cara menininha, não há nenhum problema entre nós, poderia vir até a minha casa com sua mãe tomar um chá?”
Olívia, muito feliz pediu sua mãe para acompanha-la a casa do senhor Clomb e ela foi. Chegando lá, recebeu um belo sorriso, chá e bolachas. Senhor Clomb pediu desculpas por ter feito essas maldades com as duas e a partir daquele dia, ficaram bons amigos, até o dia do falecimento do senhor Clomb, que foi um dia muito triste.
Olivia, hoje está com 18 anos e olha altiva para a casa do lado e pensa como foi feliz com o vizinho. Boas recordações. Olívia não guarda mágoas, seu coração só tem espaço para coisas doces e alegres. Sua mãe a chama da cozinha e ela se vira e fala: --- já vou mamãe. E assim termina esse conto.
Cida Vitório,
Já faz alguns dias que a brisa que entra pela fresta da janela deixa a casa toda gelada. As vezes não é brisa, é ventania. Em alguns momentos o vento vem tão forte que consegue abrir todas as caixas que estavam lacradas no sótão da minha memória.
Na maioria das vezes eu fecho tudo correndo pra não deixar o vento bagunçar a casa que eu levei tanto tempo pra arrumar. Confesso que outras vezes aproveito pra espiar as lembranças que ficam espalhadas pelo chão.
Enquanto tento organizar tudo de novo, me permito sentir o frio que preenche todo o ambiente, mas me protejo enrolada no cobertor e fecho as janelas na tentativa de me privar de mais um vendaval gelado.
Fecho com fita reforçada cada caixa que foi aberta. Faço um chá quentinho, me acolho no sofá e fico esperando o dia seguinte sem tentar adivinhar a previsão do tempo.
Vai que amanhã, no lugar da brisa gelada, entra o sol trazendo luz e calor pelo vão que eu deixei aberto. Se assim for, vou abrir todas as janelas e agradecer pelos dias frios, que me ensinaram que as estações não duram pra sempre, mas que se nossa mente é nosso lar, a gente precisa deixar nossa casa aconchegante para enfrentar qualquer temperatura, né?!
Sem perceber eu já havia começado a separar tudo o que gostaria de levar na viagem. Fui me desfazendo aos poucos do que não caberia na bagagem. Deixei com certas pessoas coisas preciosas. Guardei com cuidado retalhos de algumas histórias. Foi difícil jogar fora tudo que não me cabia mais. Escondi no fundo da mala algumas lembranças que não ocupavam mais tanto espaço. Embrulhei com cuidado todos os cheiros, sabores e sensações que eu já tive. Deixei a mala de mão vazia, pronta para colher novas lembranças ao longo do caminho.
Conforme vou seguindo sem mapa, aprendo a contemplar cada passo que dou, cada tropeço, cada experiência e cada um que passa por mim. Quanto mais longe eu vou, menos pressa eu tenho de chegar no destino. O desequilíbrio de andar sempre com mais perguntas do que respostas, não me incomoda.
Vez ou outra eu paro, respiro, deixo alguns pensamentos antigos no meio do caminho para seguir com a bagagem mais leve, escolho uma nova estrada e recomeço. Não sei ao certo quando essa viagem vai ter fim, mas me contento em saber que sou eu que escolho a rota, a companhia e o peso que levo comigo durante todo o trajeto.
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(Do bloco de notas pra cá. Coisa muito rara de acontecer, mas hoje deu vontade)
O nó que você desfez de nós
Tão rápido como quando se amarrou em mim, antes que eu pudesse perceber, você afrouxou o laço e desfez o nó.
Não me deu tempo para te ensinar um jeito novo de amarrar. Você alegou que aquele nó, que você mesmo fez, te sufocava.
O erro foi desfazer o nó de nós, quando na verdade, deveria ter desfeito o nó da garganta.
A corda ficava na verdade, no pescoço. Nas palavras não ditas, engolidas a seco.
Mas a opção foi sua. Deixou a corda na garganta e desfez o nó da pele, da mente, do coração.
O nó de nós não existe mais.
Não existe.
Não há mais laço que nos mantenha presos um ao outro. Não há nó que sangre a pele.
Tão rápido como quando o pai ensina o filho a amarrar os sapatos de um jeito firme, o filho puxa o cadarço com uma única mão e desfaz o laço que criou.
O laço que você me ensinou a fazer. O nó que você desfez de nós.
O Eremita
Com lentes tingidas de um brilho sombrio,
Meus olhos, embotados de dor e lágrimas,
Veem o que outros não percebem, no silêncio confinado.
Com olhos que ultrapassam o véu da realidade,
Sou um estranho em minha terra, sem lugar para pertencer,
Amei com a quietude de estrelas esquecidas,
Sonhei com a vastidão de galáxias perdidas,
Mas meu coração é um relicário de esperanças defuntas,
Um navio sem ancoradouro, perdido em um oceano de solitária penúria.
Sou um homem que, em suas próprias marés, se consome e se afoga
E, nas profundezas da mente, se perdeu.
LUZ ALÉM DAS NUVENS
"Naquele dia, nuvens tensas encobriam o sol, mas nem assim impediam seus intensos raios de romper. O viajante, até então desesperançoso, ergueu os olhos e com um sorriso concluiu: as nuvens assemelham-se aos meus problemas, mas que são eles diante da luz eterna que é meu Deus!"
A leitura é um desafio
De autoaprendizado.
Para você não ter desvio,
Comece por Jorge Amado.
Estudar é pesquisar,
É coisa além de extrema,
É como José de Alencar,
Expondo o seu “Iracema”.
Leitura é dupla satisfação.
Quem lê tem sempre prazer
Sem medir motivação.
Para melhor entender,
Veja o livro Luar do Sertão,
De “Catulo” para gente ler.
O Concerto das Estrelas
Em um mundo fantástico onde existiam estrelas, animais falantes e seres mágicos.
Existia uma família que tinha o poder de controlar as estrelas.
Uns faziam o bem e outros faziam o mal.
Mas a Luz sempre prevalecia sobre as trevas.
A Luz sempre venceu.
Belo Horizonte, 22 de Maio de 2019
Vestida de palavras
Era uma vez... (e toda vez, nas difusas da imaginação,
começa assim) um quarto, e ele guardava um espelho grande que se agarrava à parede revelando as verdades.
Do lado impertinente e absoluto, descansado sobre a cômoda, um relógio quieto, mas veloz.
Sobre a cama, derramando intensidade, um vestido vermelho
que o tempo do relógio desbotou, mas o espelho mostrava que ele tinha ainda encanto guardado em lembranças.
Hesitante, perambulando pelo quarto, a mulher ia, de um
lado, ao outro, querendo enganar o relógio, fingindo sua aparente angústia ao espelho que apreciava o vestido, e ele se incumbia de carregar sonhos.
Frente ao espelho descortinou sua nudez, sua brancura. Abriu a lateral do criado-mudo e retirou um pote de creme. Espalhou sobre sua pele para acetinar o trincado do tempo a disfarçar e enganar o espelho por minutos naquele dia.
Recolheu o vestido sobre a cama e se cobriu dele. VERMELHO corajoso ajustado em seu corpo, abraçando os parágrafos de suas curvas, sem brigar por espaço.
Olhou para o relógio, o tempo, ele sim, brigava com ela,
apertava sua alma, não a largava nem um minuto sozinha para decidir e refletir.
Enérgicas são as horas, mostram o compasso.
Ela se mirou vestida ao espelho, olhou o pote abandonado sobre a mesa de cabeceira.
Abriu a porta e saiu do seu mundo, pôs na bolsa a sua
fantasia e decidiu acima das horas, dos segundos e minutos e não enganou a si mesma.
Lembrou-se de alguma frase, riu, saboreou, se revestiu dele,
Fernando Pessoa:
“Mas eu não tenho problemas, tenho só mistérios.”
Livro Pó de Anjo
Autora: Rosana Fleury
O Guardião
Na porta do tempo, todos os dias têm um Soldado que guarda a entrada do Dia e puxa os lençóis da Noite.
Tudo na hora certa, matematicamente de uma precisão exata. Cansado dos anos, das horas de sentinela, o Soldado reclamou ao Crepúsculo da sua solidão.
Queria companhia, o isolamento ecoava cores de espectros. O Crepúsculo argumentou ao Soldado:
– Mas você não está sozinho, tem o Dia, o Sol, as Nuvens, avista as tempestades ao longe. No demais, nunca vai saber com que roupa o Dia vai sair e ainda tem a Noite, que chega elegante, às vezes chora, é dramática, tem broche no peito adornado de brilhantes.
O Soldado reclamou:
– Mas o Dia é desorganizado e bagunçado, às vezes, se veste com manga ou sem manga, simplesmente navega e acontece.
– Mas que prefere – perguntou o Crepúsculo?
– Uma associação, um afeto, disse o Soldado.
O Crepúsculo conversou com o Dia e a Noite, e no consenso, emprestaram uma Estrela no peito do Soldado guardião.
– Mas você, que foi ostentoso e observador, vamos enfeitar seu isolamento com uma Estrela que adornará sua ombreira.
O Dia, o grande negociador, bateu o martelo.
Ficou o Soldado feliz, agora não ficaria só com a Noite, que o fazia conversar permanentemente com a sua solidão; tinha Estrela para apaziguar seu imperativo.
Ficou deslumbrado com sua elegância, aparecia sempre elegante, de pouca conversa, não discordava, somente piscava, deixava passar. Estrela dormia muito durante o dia. Conversava incessantemente com a Lua, amiga íntima.
O Soldado, cada vez mais apaixonado, se esquecera do combinado. Passou a decretar mesa posta na hora perfeita, jantares perfumados e fumegantes para saciar seu desejo.
Estrela se queixou dos afazeres para a Constelação.
O Dia, enamorado de longa data por Estrela viu a batalha anunciada. O Corpo Astral deliberou sobre a palavra “emprestar” e se concluiu que era ceder.
Na disputa, os aspectos, os Ares advogados, concluíram que ceder podia ser renunciar ou abdicar.
E virou guerra, o Soldado armado, o Dia almejando vingança.
Na ocasião do duelo Estrela partiu, a oportunidade marchou com apetite de retaliação.
O Dia estava com fome
comeu toda a Noite
mas sobrou a Lua
que ao correr do Dia
foi devorada
A Noite queria se vingar
comeu todo o Dia
fez a Escuridão aparecer
Combateram.
No mais restaram poucos amigos, cada um no seu tempo ajuizado. Do Soldado sobrou um apagão sentimental e uma sina, uma Estrela Rutilada decorando lembranças em seu uniforme para sempre, dos tempos largados em ação.
Livro Pó de Anjo
Autora: Rosana Fleury
Miseráveis
E a vida passa lenta como uma procissão lagarteando à margem da vida, cheia de mulheres adornadas de preto vestidas de morte, viúvas da felicidade .
Agarradas ao terço como se fossem lembranças perdidas, murmurando frases inaudíveis, confusas numa convocação de um encontro logrado no tempo de amar.
Choram as dezenas de anos como mistérios não revelados perfurados pelo tempo.
Todos os dias são Quarta-Feira de Trevas perseguidas por homens encapuzados, carregando “seu Cristo” ferido no andor intermitente a vida inteira.
Não olham para as calçadas da existência, são o extermínio querendo chegar de costas e surpreender a infelicidade.
Algumas nunca saem da procissão, do cortejo escuro atrás de sentimentos que somente sangram.
Adoradoras do infortúnio e da miséria.
Choram sangue e caminham com a indigência, desconhecem “O Deus da Felicidade e da Fortuna”.
Não rezam, lamentam.
Jamais convocam, murmuram frases.
Não confiam, esperam acontecer.
Sempre com receio; em atrição. Deslembradas da contrição.
Nem doce,nem amargo
Na cozinha, as notícias chegavam mais depressa ao fogo ameno. As criadas afagavam, pajeavam uma geração e fraseavam o inominável. Lembro-me de suas mãos quentes alisando minhas meias e eu sonolenta, bagunçando os cabelos em cachos nas almofadas do sofá da sala de minha avó. Elas me sacudiam e diziam:
– Se não ficar inteira para a missa, não tem doce de cidra nem novela
à noite.
As missas eram sonolentas e as pessoas vestidas do “primeiro dia da semana” se espreguiçavam em minha mente até ao almoço.
Era um dia morno, não havia novelas e a circunferência dos doces era vigiada e eu me frustrava com a falta das babás.
Verdadeiramente, não precisava delas, mas elas me bendiziam de suas falas e eu, como elas queria decifrar esse desejo.
E elas sabiam das promessas, do artifício, da magia de como chegar ao altar.
E sabiam muito mais, do veneno, da nudez debaixo dos lençóis bordados com capricho em ponto cheio.
Ninguém conversava sobre “isso” e, quando perguntava, tinha resposta certa:
– Já é hora de você dormir!
Na minha imaginação nada repousava, ficava na fantasia, esta geografia indecifrável e a língua solta de minha bisavó.
– Minha filha o “it” fica debaixo das saias.
Eu levantava as minhas, debaixo as anáguas e barbatanas e achava tudo tão incrédulo.
Acordava, e a novidade do dia: não entendia como, mas a vizinha havia “pulado a cerca”. Havia um falatório metafórico na cozinha não percebia onde estava o “cerco” onde só existiam muretas.
O “it”, o charme, o magnetismo, o encanto pessoal ainda são um mistério que abrocha do ser repentinamente.
Ferver, pular, ainda pode ser afetuoso e cítrico como doce de cidra. E o descrente ainda perdura nos amores alambrados.
Livro: Pó de Anjo
Autora: Rosana Fleury
BRUXA SEDA BRANCA
Era um dia normal, acordei tomei meu banho, fui trabalhar voltei para casa rotina de sempre, mas às 19:30 começou a ansiedade de meus pensamentos coração batendo forte. Fui tomar mais um banho para ver se amenizava a ansiedade, e ansioso para ansiedade terminar, fui me deitar, dormi rápido o que não era de costume, mas aí que as coisas começaram a ficar estranhas, fora do meu controle, senti algo andando na minha cama, mas relevei até porque tem uma coelha e ela sempre sobe na cama para dormir comigo, mas quando abrir meus olhos, e vi nos meus pés, sentada tão serena, calma me olhando linda, bela, rosto angelical, com um lindo véu, de seda Mulberry, pensei que era um anjo. Até o seu rosto se cobrir com o véu, que vinha de trás dos seus cabelos, aquela face horrenda apareceu, ela ria e andava em volta da minha cama, voava toda noite, dentro do meu quarto e no meu sonhos, ela parecia e me perseguia em meus sonhos, parecia cão e gato, um desespero só. Quando eu acordava ela estava na beira da cama, como se dissesse eu ainda estou aqui! O desespero, agonia e a ansiedade aumentavam, lá estava ela me esperando.
Bruxa seda branca.
A última carta de amor
Sinto sua falta e as areias sopradas pelo vento frio batem em
meu rosto e acordo com as lembranças.
A chuva fina penetra em meu corpo e penso em seus beijos
tão quentes como ares do Equador.
Meu demônio infernal que arrasta meus dias em desejos
queimantes e fico cega.
Chamá-lo de meu amor é tão vulgar e abstrato e meu pensamento
se dirige a ti de forma tão concreta que sinto e quero sua
presença.
Fica tudo tão distante. Meu corpo, meu desejo, que nem as
cartas cobrem esta ausência.
Dizem que amores não tem corpo, mas do que é feito sua
intensidade sem seus contornos físicos,
perfumes perdidos sem seu cheiro?
E o vento apaga as palavras neste deserto de solidão e gasto
tanta pena e tinta e nem sei se verbos atravessam oceanos e intempéries.
Mas fica a força de meus punhos grafados, para contornar
seu corpo nesta carta.
“Enfurnada”
Sou subtraída do profundo das águas calcárias e cristalinas de Furnas
Enfurnada entre montanhas Alinhadas de pés de café.
Lugar de cheiro doce
Da floragem cafeeira vestida de noiva do moka
Que se enfeitam de flores brancas e sementeiras vermelhas
Ano a ano Dia pós dias
Sou as sacas cheias da safra
Que despolpa líquida nas xícaras E cobre o paladar e os ares
Sou das minas verdes Sul de Minas Perfurmada Aromatizada
Cheiro de café Ser gerado
Das Minas Gerais
Livro Pó de Anjo
Autora: Rosana Fleury
O Tapa
Ele pertencia a alguma tribo.
Havia nascido mirrado, moreno, gritava feito indomado e era de gênio irascível.
Donde surgiu isto?
Criatura tão imprevisível, veio ao mundo onde todos só desejavam o aprazível.
Ele era tenente, contente e soberbo, dono de si mesmo.
Era do mundo.
A mãe gritava,
Se irritava.
E ele não se alterava.
Até que um dia...
Sem data...
Sem tempo...
A paciência navegou e naufragou na violência, e a mãe deu um tapa na cara do herdeiro, vomitando sua raiva com raça, na face da criança que ela mesma gerou!
Mas... o pescoço dele virou e ficou assim errado, de
cara virada, nas costas, vendo o mundo afastado.
A mãe gritou e se apavorou e não houve ciência e cientista
que desvirasse o virado.
E ele se criou, num mundo onde ele próprio assistia às aulas de pescoço virado, nas costas.
Mas tirou vantagem!
A mãe tinha trabalho.
Tudo de costas, num mundo que só conta as horas prá frente.
Tinha bom ouvido, porque os olhos nos traem, o olfato nos engana e a verve nos veste de lama mas, ele ganhou na percepção.
O menino, agora homem, cresceu, se profissionalizou e arrasou em tudo.
Até nas conquistas!
Mas, de costas?
Sim de costas.
Como?
Foi assim: ela passou, ele de pescoço virado ignorou; ela se virou e piscou e ele se apaixonou!
Se casaram de data marcada, convite confirmado, com balada ensaiada e festa preparada.
Mas. como seria a entrada?
Ele de costas para a nave central, onde o padre ministrava os sacramentos?
Ela o amava e resolveu:
Vou entrar com ele de cara virada, de braço dado.
Ninguém perdeu!
A Igreja encheu.
Ela desceu do carro, frente aos curiosos,
Feliz!!!
No patamar, à porta, ele a esperava, de pescoço virado.
Ela na certeza de que o amava...
...o beijou... e o pescoço d’ele, desvirou.
O trauma estancou e ela mais se encantou!
E entraram assim:
Ela, elegante, e ele de pescoço desvirado, na grande mágica que o AMOR faz na vida.
Livro: Não Cortem Meus Cabelos
Autora: Rosana Fleury
Metamorfose da Solidão
Ele havia morrido.
Rosa Augusta deitou-se silenciosamente aos pés da cama.
Emudecida, anestesiada pelo sofrimento. Não havia soluços, desespero, nem pranto incontrolável.
Somente seus pensamentos voavam e cerravam todas as portas do casarão, avisando a todos, que, naquele instante se encerrava uma história, uma vida. Dali em diante, somente abrindo as alas da morte para conhecer o outro lado.
Não era feriado, dia santo e o comércio não parou. Somente ela vestiu-se de negro. Aprumou seu coque, dobrou o lenço de linho miúdo e colocou-o no punho da manga e recebeu os... “sentimentos”...
Numa noite clara de luar, pessoas iam e vinham, aconchegadas, quentes, acalentando Rosa Augusta que escondia os pés doídos de frio e solidão, debaixo das barbatanas e anáguas.
Seus pés gelados trincaram e se despedaçaram pela sala como pedras soltas...
Ela ficou inerte, sobre os cotos, sem dor, esperando que a alma dele lhe desse asas para voar.
As pedras despedaçaram, derreteram e escorreram pela sala. Ninguém entendia o porque de tantas poças d'água já que a casa era toda forrada e de Rosa Augusta não desprendia uma lágrima sequer.
Ela, num gesto de consolo a si própria, descobriu a face do amado, emoldurado pelo fino filó, passou o lenço pela sua testa como se ele vivesse e transpirasse sua existência ali inerte.
Neste instante, ao recolher o lenço, este caiu sobre as poças do chão-molhado, encharcou-se de emoção nas águas caídas, aumentou de tamanho, desdobrou suas formas e transformou-se em asas que Rosa Augusta vestiu e voou... acreditando que a vida é uma grande “METAMORMOSE!
Livro: Não Cortem Meus Cabelos
Autora: Rosana Fleury
O Corredor
As tardes caíam cada vez mais longas, sem expectativa e numa falta de prosa desconcertante.
Já ia longe a guerra do silêncio entre o casal em sua primeira disputa. Era difícil aplacar a angústia do que ia acontecer, disfarçar a ansiedade da volta e representar que tudo vai bem ou ia bem.
A janela foi objeto do desejo de disputa.
Abre a janela, Ana, está um calor danado desse jeito não consigo dormir, o quarto está abafado isto só dá pesadelo. Ela retrucou:
Pesadelo são os morcegos que entram no quarto e ficam assombrando o meu sono. Passo a noite vigiando a janela, de sentinela, enquanto você se refresca e dorme. No outro dia fico exausta.
— Assim não dá, Ana você acende velas no oratório, fecha a janela e o quarto fica mais abafado do que igreja em dia de Semana Santa. Isto já virou tormenta na hora de dormir, perde até o gosto de se deitar. Suar na escuridão é triste.
— Gosto da janela cerrada, dá mais segurança...
Vou abrir, Ana. amanhã é dia de serviço, a esta hora ainda não peguei no sono... deixe a luz da lua molhar o seu corpo, soprar o cheiro da flor do pequizeiro a perfumar o quarto.
Empertigada, Ana levantou-se:
— Então fique aí com a lua, os morcegos e as formigas dos pequizeiros. Vou para o outro quarto.
— Você é quem decide, Ana.
No corredor, quando as tábuas estrilaram, já bateu arrependimento.
Ana mastigou o conselho da avó: “Nunca saia de sua cama a volta é mais difícil''.
E foi assim. Tião ficou no quarto do oratório, de cortinado, as melhores cobertas, com a luz da lua, de janela aberta. Ana penava no final do corredor em colchão de capim, suando de calor e medo, disputando espaço com as muriçocas. Toda noite planejava e ameaçava: vou lá no outro quarto; “Amanhã tiro o cortinado...” Mas clareava o dia e pensava: “Quem vai subir e pregar este peso nas alturas?"!
Não se conversou mais sobre o assunto. Os pequizeiros floresceram, cheiraram, derramaram seus frutos, caíram suas folhas e não conversou mais.
O inverno chegou, a janela cerrou e Ana emperrou no quarto do corredor. Tião apostava até quando?! Aqui neste sertão sozinhos era só esperar...
Agora quem deixava Ana de sentinela eram seus pensamentos, haja tijolo quente debaixo da cama para aquecer a solidão, além da trabalheira, dos dedos queimados, dos pés gelados a indecisão deixava o corredor da volta mais comprido.
Tião matutava: tinha que tomar atitude, Ana ia botar fogo na casa. Coitada! Moça da cidade não tinha costume da roça. Levantou-se, encheu-se de coragem, pegou a vela para atravessar o corredor. A cálida luz iluminou todo esplendor de Ana que de vela na mão também voltava ardendo de saudade.
Entreolharam-se e gungunaram:
— Oiiiii.
Cruzaram o corredor cada um em sentido contrário. Ana adentrou no quarto do oratório com cortinado e Tião no quarto do corredor com o colchão de capim. Sentou-se na cama desolado, contrariado, acanhado e deitou-se.
Palpitando de ansiedade Ana mal conseguiu sentar-se na cama: no instante sentiu o cheiro das roupas de Tião que exalavam da cama ainda quente o que disparou suas lembranças e encurtou o caminho da volta. Com as mãos e os pés frios da noite, com o coração ardendo de coragem, a chama da paixão iluminou o corredor e caminhou para junto de Tião.
No espaço exíguo da cama deitou-se com o coração apertado acomodando seu corpo ao de Tião. Ele entrelaçou sua cintura em sinal de reconhecimento. Ana com os pés gelados encostou seus pés ao dele para roubar seu calor. Ele a aqueceu e perguntou:
— Não estamos brigados, Ana?
Rindo afirmou:
— “Pés não brigam”.
Livro: Não Cortem Meus Cabelos
Autora: Rosana Fleury