Coleção pessoal de warleywaf

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As igrejas estão vazias,
Talvez já estivessem antes de caírem as máscaras
Da nossa essencialidade.
Tão vazias quanto o caminho esquecido do seguimento,
Preterido às promessas certeiras
De santos sem biografia
Ou de clérigos iluminados - pela tela.
Ignora-se o Cristo, novamente desprezado
Pois, dizemos missa. Outros, assistem-na.
E nada mais acontece.
O monopólio, entretanto, ainda é igual
Há dois séculos atrás.
O Pão fracionado não nos arde o coração,
Este sim, vazio há tanto tempo
Que nem sei...
Kyrie eleison.

Era volúvel.
O bastante para assistir prostitutas
Sem tocá-las
E emendar-se até a próxima ereção.
Buscava um amor oblativo que não conquistara, mas pretendia.
E vagava.
Desencontrado que estava em seu caminho interior.
Perdido nos enquadramentos que lhe comprimiam o peito
Amava sempre, perdidamente, até o raiar do sol.

Esta estranha maneira de amar,
em poesia e só.
Amores tolhidos, mas requeridos pela carne.
Quero crer que te amei sem nada possuir

Não saberás quem sou.
Sequer te reconhecerá nestes versos
tão avessa a minha pulsão.

que o sol a pino seja testemunha:
meu olhar acanhado te toca, suave

imperceptível, como uma partícula de luz sobre a tua pele.

Quem, um dia, observou o meu olhar sobre o horizonte saberá:
as minhas saudades não têm calmaria
estão sempre em devir
E dói
tanto que não caibo em casa,
fico acostado no limiar da porta
desejando algo mais.

Há vida em toda parte, mas certos detalhes somente podem ser visualizados em modo "offline".

Entre o sol e a cela,
a tarde incide,
uma espera insiste;
saudade dela.

Na tua bandeira, liberdade
do teu povo, a empatia.
Pois das Minas que me habitam
verte o rio que me guia.
Metropolita ou interiorano,
importa não, aqui, espia:
seja matuto ou da cidade,
mineiridade a gente cria.

De pé, encalço, segue o trilho
que à estação deve chegar.
Alegrava a meninice
olhar o trem que vem passar.
Aquele trem que era vida
foi-se embora, existe não.
A estação, desamparada,
de tão vazia é solidão.
E nos trilhos pedregosos
só resta agora
emoção.

Um dia atípico: o clima estava frio; o pico, nublado e o rio, verdacho. Só as prosas e os cafés continuavam na temperatura das minhas lembranças.

Para além dos homens

Elas não criam
nas freiras, desalmadas, esperando um esposo que não vem.
Não criam nos curas,
travestidos em suas rendas e solidões;
menos ainda em um deus pudico.
Elas não.
Queridas elas,
seus beijos foram ouvidos no altar
e os seus gemidos romperam a disciplina da prisão.

Não lhes detiveram os homens.

Breviário

Meu Deus,
que o desassossego da minha carne não me deixe passar despercebido a sensibilidade de uma aurora.
Que os meus olhos cansados das noites insones encontre um olhar que me acalente, daqueles que sem dizer nada, devolve-me a paz de uma manhã tranquila.
Que meus lábios, ressequidos, possam alimentar-se de sonhos e utopias, e alimentar de beijos outras bocas com fome.
E meu coração, Deus, deixa ocultado. Mas vem de mansinho ocupá-lo como num leito macio,
tem o cheirinho entranhado dos meus medos.
Na noite tardia, reclina tua face em meu peito, sussurra sopros de vida e me faz adormecer.

Meu ermo sagrado II

No silêncio de uma capela
quando ainda estende a noite a treva profunda
o espírito me diz:
“ele está em todo ser”.
E saio a procurá-lo nas matas,
escondo-me inteiro.
Caminho em veredas e trilheiros
e tu nada me diz,
todo ser aquieta,
ouço gotejar nas pedras águas mansas.
As horas passam, eu me apercebo em silêncio.
O silêncio me extasia naquela paz.

Pródigo

Jaz no tempo muitos anos
que na tua companhia
os meus passos eu mudei
me tornando um caminheiro
lado a lado, estreitando
tua vida optei.
Me honraram como tolo
por deixar a segurança
o bem-estar, minhas finanças
e, assim, expropriado, estropiado te seguir.
Mas, meu amado, um contratempo
atracou meu seguimento:
outros amores me envolvi.
Quando o medo me apossava,
tirava a paz, me trespassava,
tua saudade a mim rasgava
e eu, sem ânimo, contrito,
não consegui vo-lo sentir.
Ó, desejado, penetrei
no breu sem lume e sem palavras
refiz os passos da estrada
calei a voz pensando em ti
rastro de caos eu restaurei.
A mim sem nada revelar
senão os olhos padecentes
de quem está subjacente
no caminho que segui;
meu esperado, nesses olhos
vi pegadas de teus passos
lado a lado, estreitado
o meu rumo conduzir.

Desertos que me habitam

Os desertos que me habitam
diferem-se no grau, no grão molecular.
Desertos que habitam em alguns são verdejantes,
suas folhagens vicejantes tapam o céu, esconde o sol.
Nem todo deserto é areia
contendo pedras, pó e poeira
ou caniço a balançar.
Nem todo deserto é só areia
pois há também as cordilheiras
com suas rochas e geleiras
onde a voz se faz ouvir.
Desertos que me habitam, para alguns são navegáveis
profundeza mensurável ou um oceano sem fim.
Nos habitam, comumente, desertos urbanos
cheios de gente,
rotineiro e solitário
mas inóspito igualmente.
E há desertos que são noites,
matéria escura, sem repouso
verdadeiros calabouços
pra quem teme adormecer.
Os desertos que me habitam
nos habitam a todos nós
enquanto sopra
paira a brisa
que anima a travessia.

Meu ermo sagrado I

Procuro por tua presença e não me respondes.
Abrigo sob a sombra de um pinheiro
presumo um silêncio pleno de ti,
encontro meu ermo sagrado.
basta-me uma noite, porém, tudo se esvai.
Eu apelo à letra, a palavra dita;
elas me traem.
Tenho a mente turva e os afetos soberbos.
De ti, tenho um silêncio
longo e tortuoso
quando o que desejo hoje, somente,
é tê-lo por primeiro.

Saudades do mar

Saudades do mar como se a ele houvesse pertencido minha vida inteira
como se o calor que me ardia os ombros me desfizesse de pesadas vestes
e me cobrisse de sal, areia e sol.
As palavras que digo não traem as montanhas de minhas solidões.
Mas o mar...
incólume em meus abraços, faz-me esquecer...
De volta ao caos, me perco outra vez, no mar contido nos olhos de um poente
ressaca que me lança de novo às águas fundas de um oceano intangível
são mais bondosos e risonhos que a minha loucura
aqueles olhos.

O som das ondas

Hoje, num fim de tarde, fui ao encontro do mar.
As ondas quebravam nas pedras;
no meu rosto salpicava a maresia
e o sereno quebrava o meu cansaço.
Eu admirava aquele arrebol e seguia a orla,
então o som da rebentação das ondas me pareceu mais belo
que toda canção já escrita.
Sanava o gume de meus fracassos;
'curava' amores entalados cá dentro,
na alma.
Quando a noite, enfim, ascendeu,
eu queria viver.

O poente

O poente estava perfeito.
Nos dizeres de um poeta:
"bonito e trágico como tudo que é verdadeiro".
Tinha ele razão. Era tamanha a boniteza daquele instante,
e tão trágico o entardecer,
que durara muito pouco,
mas se estendeu o bastante para banhar os corpos na areia de algo sagrado
que eu não saberia dizer.
Talvez encontremos algum sentido nas grandes narrativas das religiões,
ou talvez não;
mas naquela tarde, naquele pôr de sol dourado,
naquele ínfimo instante,
nada, absolutamente nada,
necessitasse de um sentido
nem de eternidade,
bastar-me-ia estar na areia úmida,
ébrio da luz plácida e crepuscular que me convidava contemplar a finitude.

Ipê rosa

Teus lábios tocam, suave,
a minha tez cansada,
na floração de um ipê.
E ao gosto desse beijo,
nesse sopro augusto ainda frio,
me olvido um instante o caos latente.
Sou agora as pétalas róseas caídas ao chão.
Tu, amado, indistinguível entre o azul do céu,
os ramos floridos
e a admiração gratuita que me toma de assalto,
transforma-te em mim, olhando o estupor da visão do ipê.
N'aquele instante,
breve e belo,
tu és meu.

Aqui e acolá

Aqui...
uma pilha de livros para ler,
mas debruçar-me sobre eles não quero.
Leituras que obrigam a aprender
mas que não me ensinam o prazer
de estudar.

Acolá...
Uma pira de livros prontos a queimar
outra, de gente, a fazê-la.
A escola, a docente e o futuro,
mediocridade ou revolução,
pira feita com a educação.