Coleção pessoal de ThaisLLoureiro
Certa vez, disseram-me que eu nascera com uma profecia, destinada a despedaçar corações.
Uma garota sem laços atados em seu coração, uma ilusão de diamantes, mas talhado em poucas camadas de gelo.
Ao concretizar a profecia, senti meu coração quebrar; não havia notado que também estava fadada a me despedaçar.
O lar 422
Todos os dias eu passo por esta casa, belíssima em um tom azul caribe, encantada com as janelas brancas, recheadas com flores azuis e violetas no peitoril.
Essa casa não é minha, e talvez nunca seja, mas em meus devaneios, quando o sono me escapa, eu me permito sonhar acordada.
Em meus sonhos, sou criança, as dores atuais não me atingem, estou protegida por cerquinhas brancas que rodeiam a casa.
A casa continua com a mesma aparência, familiar e acolhedora, agora em um novo lar, em frente ao mar de Zimbros, onde meu coração pertence.
Vejo a família feliz e reunida, os cachorros correndo e latindo para os beija-flores, e sinto o inacreditável cheiro de Marlboro e Sampoerna menta, que traz o conforto do lar.
Enfim me vejo com o amor da minha vida, minha mamãe, as duas boiando no mar cristalino, em silêncio, pois pensamos o mesmo.
Somos almas gêmeas, mãe e filha, irmãs, independente, sempre destinadas uma a outra, meu coração é seu, somos nosso lar, uma casinha azul com janelas brancas.
Pra sempre sua Luz, seu mar sereno, por vezes revoltoso, contudo, sempre trazendo a correnteza fluída, te amando com nossas águas cristalinas e luminosas em um dia de verão.
Oceano
Conversávamos sobre seus poemas e poesias, segurando suas mãos, agradeci, herdei o dom de irradiar emoções com palavras.
Somos silenciosos, mas com papéis e canetas escrevemos oceanos de sentimentos, e aqui, pensando em como você me suplicou para ser feliz, eu alago o nosso oceano com lágrimas, inundando o papel.
Não sei se serei plenamente feliz como você espera, pai, mas ao seu lado, sempre estive e serei.
Em mim, habitam versões; sempre soube que não era a única habitante.
A mente, que comanda o cabo de guerra entre viver e morrer, precisa de versões do meu ser.
Distintas, algumas suplicam para viver e renascer, enquanto outras se dopam com a intenção de partir e perecer.
Não sou a única pessoa nessa mente caótica, mas sei que sou única em cada uma das versões que se manifestam em mim.
Em momentos de aflição, volto aos meus 15 anos.
Céu e mar azuis, o sussurro das ondas, a brisa suave da maresia e o cheiro de casa.
Cenário perfeitamente feliz e você, como sempre, realizando sonhos e loucuras para me ver radiante.
Nós duas, unidas como único ser, tal qual a água e o sal do mar.
Mamãe, meu amor por você é mais profundo que o oceano. Obrigada pela vida.
Sua ausência me insatisfaz, corrói aos poucos o amor frágil que temos em nossas mãos.
Como é possível sentirmos o vazio da solidão se estamos emaranhados em nosso velho lençol azul.
Este, que antes ardia com nossa paixão, agora se mantém congelado com as memórias, antes cálidas e carinhosas.
Ausência de algo prometido no passado, e não será recuperado no futuro.
A Bonequinha de Porcelana
Houve um período em que ela era perfeita, intocável, sem riscos em sua porcelana rara.
Subitamente, a Bonequinha de Porcelana já não era mais tão bela e rara, resumia-se a apenas mais uma boneca danificada.
Diante de brincadeiras bruscas, gritos, mágoas, mentiras e falta de cautela, a Bonequinha foi se arruinando.
Aquela que antes era uma Bonequinha de Porcelana, rara e intocável, agora não passava de uma boneca danificada e abandonada.
A Bonequinha de Porcelana que antes era desejada e admirada foi descartada.
Em um canto qualquer, ela ainda espera ser admirada e amada novamente.
Olho através da janela.
Anseio um recomeço, um futuro ausente de lágrimas e grata por despertar a cada nascer do sol.
Digna de um amor que transborde os rios e mares que serpenteiam meu coração rachado, secos após tantas lágrimas perdidas.
Então, ao olhar através desta janela branca, desgastada com o tempo, eu escuto.
Escuto o sussurro dos pássaros cantando, a suave brisa da maresia,que agita a vida presente nas folhas de Louro.
E, ao fundo, escuto o som da água, a correnteza cristalina que purifica meu horizonte luminoso.