Coleção pessoal de soniacalado

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Poema do amigo aprendiz

Quero ser o teu amigo. Nem demais e nem de menos.
Nem tão longe e nem tão perto.
Na medida mais precisa que eu puder.
Mas amar-te sem medida e ficar na tua vida,
Da maneira mais discreta que eu souber.
Sem tirar-te a liberdade, sem jamais te sufocar.
Sem forçar tua vontade.
Sem falar, quando for hora de calar.
E sem calar, quando for hora de falar.
Nem ausente, nem presente por demais.
Simplesmente, calmamente, ser-te paz.
É bonito ser amigo, mas confesso é tão difícil aprender!
E por isso eu te suplico paciência.
Vou encher este teu rosto de lembranças,
Dá-me tempo, de acertar nossas distâncias...

Durante a nossa vida:
Conhecemos pessoas que vêm e que ficam,
Outras que vêm e passam.
Existem aquelas que vêm,
ficam e, depois de algum tempo, se vão.
Mas existem aquelas que vêm e se vão com uma enorme vontade de ficar...

Ainda que seja raro o verdadeiro amor, é no entanto menos raro que a verdadeira amizade.

A amizade da mulher para com o homem é um beco sem saída, para o qual a empurrou o engano no amor.

Dos amores humanos, o menos egoísta, o mais puro e desinteressado é o amor da amizade.

E a emoção do nosso amor
Não dá para ser contida
A força desse amor
Não dá para ser medida
Amar como eu te amo
Só uma vez na vida.

De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Soneto de separação

De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.

De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama.

De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente.

Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.

Soneto 18

Se te comparo a um dia de verão
És por certo mais belo e mais ameno
O vento espalha as folhas pelo chão
E o tempo do verão é bem pequeno.

Às vezes brilha o Sol em demasia
Outras vezes desmaia com frieza;
O que é belo declina num só dia,
Na terna mutação da natureza.

Mas em ti o verão será eterno,
E a beleza que tens não perderás;
Nem chegarás da morte ao triste inverno:

Nestas linhas com o tempo crescerás.
E enquanto nesta terra houver um ser,
Meus versos vivos te farão viver.

Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói, e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;
É um andar solitário entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É um cuidar que se ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata, lealdade.

Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?

SONETO DO MAIOR AMOR

Maior amor nem mais estranho existe
Que o meu, que não sossega a coisa amada
E quando a sente alegre, fica triste
E se a vê descontente, dá risada.

E que só fica em paz se lhe resiste
O amado coração, e que se agrada
Mais da eterna aventura em que persiste
Que de uma vida mal-aventurada.

Louco amor meu, que quando toca, fere
E quando fere vibra, mas prefere
Ferir a fenecer - e vive a esmo

Fiel à sua lei de cada instante
Desassombrado, doido, delirante
Numa paixão de tudo e de si mesmo.

Soneto a quatro mãos

Tudo de amor que existe em mim foi dado
Tudo que fala em mim de amor foi dito
Do nada em mim o amor fez o infinito
Que por muito tornou-me escravizado.

Tão pródigo de amor fiquei coitado
Tão fácil para amar fiquei proscrito
Cada voto que fiz ergueu-se em grito
Contra o meu próprio dar demasiado.

Tenho dado de amor mais que coubesse
Nesse meu pobre coração humano
Desse eterno amor meu antes não desse.

Pois se por tanto dar me fiz engano
Melhor fora que desse e recebesse
Para viver da vida o amor sem dano.

SONETO CV

Não chame o meu amor de idolatria
Nem de ídolo realce a quem eu amo,
Pois todo o meu cantar a um só se alia,
E de uma só maneira eu o proclamo.
É hoje e sempre o meu amor galante,
Inalterável, em grande excelência;
Por isso a minha rima é tão constante
A uma só coisa e exclui a diferença.
'Beleza, Bem, Verdade', eis o que exprimo;
'Beleza, Bem, Verdade', todo o acento;
E em tal mudança está tudo o que primo,
Em um, três temas, de amplo movimento.
'Beleza, Bem, Verdade' sós, outrora;
Num mesmo ser vivem juntos agora.

Soneto do Amor Total

Amo-te tanto, meu amor... não cante
O humano coração com mais verdade...
Amo-te como amigo e como amante
Numa sempre diversa realidade.

Amo-te afim, de um calmo amor prestante
E te amo além, presente na saudade.
Amo-te, enfim, com grande liberdade
Dentro da eternidade e a cada instante.

Amo-te como um bicho, simplesmente
De um amor sem mistério e sem virtude
Com um desejo maciço e permanente.

E de te amar assim, muito e amiúde
É que um dia em teu corpo de repente
Hei de morrer de amar mais do que pude.

Eu não existo sem você

Eu sei e você sabe, já que a vida quis assim
Que nada nesse mundo levará você de mim
Eu sei e você sabe que a distância não existe
Que todo grande amor
Só é bem grande se for triste
Por isso, meu amor
Não tenha medo de sofrer
Que todos os caminhos
Me encaminham pra você

Assim como o oceano
Só é belo com luar
Assim como a canção
Só tem razão se se cantar
Assim como uma nuvem
Só acontece se chover
Assim como o poeta
Só é grande se sofrer
Assim como viver
Sem ter amor não é viver
Não há você sem mim
Eu não existo sem você

Soneto de Fidelidade

De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

Pela luz dos olhos teus

Quando a luz dos olhos meus
E a luz dos olhos teus
Resolvem se encontrar
Ai que bom que isso é meu Deus
Que frio que me dá o encontro desse olhar
Mas se a luz dos olhos teus
Resiste aos olhos meus só p'ra me provocar
Meu amor, juro por Deus me sinto incendiar
Meu amor, juro por Deus
Que a luz dos olhos meus já não pode esperar
Quero a luz dos olhos meus
Na luz dos olhos teus sem mais lará-lará
Pela luz dos olhos teus
Eu acho meu amor que só se pode achar
Que a luz dos olhos meus precisa se casar.

Soneto do amigo

Enfim, depois de tanto erro passado
Tantas retaliações, tanto perigo
Eis que ressurge noutro o velho amigo
Nunca perdido, sempre reencontrado.

É bom sentá-lo novamente ao lado
Com olhos que contêm o olhar antigo
Sempre comigo um pouco atribulado
E como sempre singular comigo.

Um bicho igual a mim, simples e humano
Sabendo se mover e comover
E a disfarçar com o meu próprio engano.

O amigo: um ser que a vida não explica
Que só se vai ao ver outro nascer
E o espelho de minha alma multiplica...

POEMA DOS OLHOS DA AMADA

Ó minha amada
Que olhos os teus
São cais noturnos
Cheios de adeus
São docas mansas
Trilhando luzes
Que brilham longe
Longe nos breus...

Ó minha amada
Que olhos os teus
Quanto mistério
Nos olhos teus
Quantos saveiros
Quantos navios
Quantos naufrágios
Nos olhos teus...

Ó minha amada
Que olhos os teus
Se Deus houvera
Fizera-os Deus
Pois não os fizera
Quem não soubera
Que há muitas eras
Nos olhos teus.

Ah, minha amada
De olhos ateus
Cria a esperança
Nos olhos meus
De verem um dia
O olhar mendigo
Da poesia
Nos olhos teus.

O casamento faz de duas pessoas uma só, difícil é determinar qual será.