Coleção pessoal de pinkpiedepre

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E quando você me cansa eu enfio a minha cabeça no fortinho do seu peito malhado, eu que sempre odiei os malhados, e peço a Deus para que eu nunca desista de te odiar tanto assim, porque não pode existir ódio mais cheio de borboletas, notas musicais e passarinhos azuis.
Eu quero sim te matar, porque você tem uma mania surda de responder a todas as minhas perguntas com um "ahhn?" enjoado, e eu quero te socar porque você já descobriu tudo o que me irrita e gosta de me ver assim. Mas quando qualquer outra coisa no mundo me irrita, eu lembro que eu tenho você pra me fazer sentir essa raiva nossa de sitcom inteligente.
Não somos um casal melado, mas duvido que tenha alguém que duvide do nosso amor. Quer dizer, tem eu, mas eu sou louca. E o homem perfeito teria a maior paciência do mundo em me curar dessa loucura, e você tem a maior paciência do mundo em aumentar a minha loucura.
Mas eu preciso da minha loucura para escrever coisas geniais e ganhar dinheiro com isso. E sustentar você que, apesar de ganhar bem, é um vagabundo que dorme demais e quer largar tudo para morar na praia. O homem perfeito não é um boa-vida não, mas certamente eu o trairia com um, com cara de sonso despretensioso para a vida, enquanto eu coleciono rugas, berros e inchaços. A sua cara de "não é comigo" vai muito bem com a minha máscara da agressividade que acredita que tudo é comigo. (...)
É cansativo viver sem vírgulas porque eu respiro a sua existência 24 horas por dia, e só coloco vírgulas teatrais para você não enjoar de mim.
Amar você não é fácil, é quase o antiamor. É muito, quase como se você nem existisse, porque só o homem perfeito mereceria tanto sentimento. E eu te anulo o tempo todo dizendo para mim, repetindo para mim, o quanto você falha, o quanto você fraqueja, o quanto você se engana.
Fazendo isso, eu só consigo te amar mais ainda. Porque você enterrou meu sonho aprisionado pela perfeição e me libertou para vivê-lo.
E a gente vai por aí, se completando assim meio torto mesmo. E Deus escrevendo certo pelas nossas linhas que, se não fossem tão tortas, não teriam se cruzado.

A primeira vez

Você sempre me disse que sua maior mágoa era eu nunca ter escrito um texto sobre você. Nem que fosse te xingando, te expondo. Qualquer coisa.
Você sempre foi o único homem que me amou. E eu nunca te escrevi nem uma frase num papelzinho amassado.
Você sempre foi o único amigo que entendeu essa minha vontade de abraçar o mundo quando chega a madrugada. E o único que sempre entendeu também, depois, eu dormir meio chorando porque é impossível abraçar sequer alguém, o que dirá o mundo.
Outro dia eu encontrei um diário meu, de 99, e lá estava escrito “hoje eu larguei meu namorado sentado e dancei com ele no baile de formatura”. Ele, no caso, é você. Dei risada e lembrei que em todos esses anos, mesmo eu nunca tendo escrito nenhum texto para você, eu por diversas vezes larguei vários namorados meus, sentados, e dancei com você. Porque você é meu melhor companheiro de dança, mesmo sendo tímido e desajeitado.
Depois encontrei uma foto em que você está com um daqueles óculos escuros espelhados de maconheiro. E eu de calça colorida daquelas “bailarina”. E nessa época você não gostava de mim porque eu era a bobinha da classe. Mas eu gostava de você porque você tinha pintas e eu achava isso super sexy. E eu me achei ridícula na foto mas senti uma coisa linda por dentro do peito.
Aí lembrei que alguns anos depois, quando eu já não era mais a bobinha da classe e sim uma estagiária metida a esperta que só namorava figurões (uns babacas na verdade), você viu algum charme nisso e me roubou um beijo. Fingindo que ia desmaiar. Foi ridículo. Mas foi menos ridículo do que aquela vez, ainda na faculdade, que eu invadi seu carro e te agarrei a força. Você saiu cantando pneu e ficou quase dois anos sem falar comigo.
Eu não sei porque exatamente você não mereceu um texto meu, quando me deu meu primeiro cd do Vinícius de Morais. Ou quando me deu aquele com historinhas de crianças para eu dormir feliz. Ou mesmo quando, já de saco cheio de eu ficar com você e com mais metade da cidade, você me deu aquele cartão postal da Amazônia com um tigre enrabando uma onça.
Também não sei porque eu não escrevi um texto quando você apareceu naquela festa brega, me viu dançando no canto da mesa, e me disse a frase mais linda que eu já ouvi na minha vida “eu sei que você não gosta de mim, mas deixa eu te olhar mesmo assim”.
Talvez eu devesse ter escrito um texto para você, quando eu te pedi a única coisa que não se pede a alguém que ama a gente “me faz companhia enquanto meu namorado está viajando?”. E você fez. E você me olhava de canto de olho, se perguntando porque raios fazia isso com você mesmo. Talvez porque mesmo sabendo que eu não amava você, você continuava querendo apenas me olhar. E eu me nutria disso. Me aproveitava. Sugava seu amor para sobreviver um pouco em meio a falta de amor que eu recebia de todas as outras pessoas que diziam estar comigo.
Depois você começou a namorar uma menina e deixou, finalmente, de gostar de mim. E eu podia ter escrito um texto para você. Claro que eu senti ciúmes e senti uma falta absurda de você. Mas ainda assim, eu deixei passar em branco. Nenhuma linha sequer sobre isso.
Depois eu também podia ter escrito sobre aquele dia que você me xingou até desopilar todos os cantos do seu fígado. Eu fiquei numa tristeza sem fim. Depois pensei que a gente só odeia quem a gente ama. E fiquei feliz. Pode me xingar quanto você quiser desde que isso signifique que você ainda gosta um pouquinho de mim.
Minhas piadas, meu jeito de falar, até meu jeito de dançar ou de andar. Tudo é você. Minha personalidade é você. Quando eu berro Strokes no carro ou quando eu faço uma amiga feliz com alguma ironia barata. Tudo é você. Quando eu coloco um brinco pequeno ao invés de um grande. Ou quando eu fico em casa feliz com as minhas coisinhas. Tudo é você. Eu sou mais você do que fui qualquer homem que passou pela minha vida. E eu sempre amei infinitamente mais a sua companhia do que qualquer companhia do mundo, mesmo eu nunca tendo demonstrado isso. E, ainda assim, nunca, nunquinha, eu escrevi sequer uma palavra sobre você.
Até hoje. Até essa manhã. Em que você, pela primeira vez, foi embora sem sentir nenhuma pena nisso. Foi a primeira vez, em todos esse anos, que você simplesmente foi embora. Como se eu fosse só mais uma coisa da sua vida cheia de coisas que não são ela. E que você usa para não sentir dor ou saudade. Foi a primeira vez que você deixou eu te olhar, mesmo você não gostando de mim.
E foi por isso, porque você deixou de ser o menino que me amava e passou a ser só mais um que me usa, que você, assim como todos os outros, mereceu um texto meu.

Lá estou eu em mais uma mesa com taças de vinho pela metade, risos pela metade, fumaças desenhando algo que quase formou uma imagem, restos de couvert e bolinhas inacabadas e nervosas de guardanapo.

Olho pro lado e sinto uma saudade imensa, doída, desesperançada e até cínica. Saudade de alguma coisa ou de alguém, não sei. Talvez de mim, de algum marido fabuloso que eu tive em alguma encarnação, do útero da minha mãe, do meu anjo da guarda que está de férias em Acapulco, do meu avô que embrulhava sempre meu aparelho de dentes em um guardanapo e depois esquecia e jogava no lixo achando que era resto de algum lanchinho, de algum amor verdadeiro que durou um segundo, de uma cena perfeita que meu inconsciente formou na infância e que eu me encarreguei de acreditar como sendo meu futuro.

Meus amigos me adoram e certamente chorariam se eu morresse. Mas será que eles sabem que eu penso sempre na morte? Será que eles sabem que aquela garota alí no canto da mesa, de decote, de bolsa da moda, rindo pra caramba, contando mais uma de suas aventuras vazias e descartáveis, acorda todos os dias pensando: o que eu realmente quero com essa vida? Como eu faço pra ser feliz?

Será que eles sabem que se eu estou morrendo de rir agora, daqui a pouco vou morrer de chorar? E vice-versa? E isso 24 horas por dia? E isso mesmo com terapia, mesmo com macumba, mesmo com espiritismo, mesmo com meditação, mesmo com o namoradinho da semana. Será que eles sabem o tanto que eu sofro e o tanto que eu não sofro a cada segundo?

Meus amigos me adoram. Mas sempre que podem, tiram sarro da minha cara. Sempre que podem, me transformam na chacotinha da mesa: Tati não sabe nadar, Tati não se droga, Tati não bebe, Tati expõe sua vida no site dela, Tati não arruma ninguém que a ame de verdade porque é louca, Tati assusta os caras, Tati é boba e se apaixona sempre, Tati não leva ninguém a sério, Tati explode por tudo, Tati fala demais, Tati fala palavrão, Tati reclama demais…

Minha melhor amiga me ama muito, mas ela adora que eu seja o erro em pessoa só para ela se sentir o acerto em pessoa. Meu melhor amigo me chamou de infeliz um dia e eu nunca mais consegui rir da infelicidade dele. Meu outro amigo me adora, muito, mas se pudesse, de verdade, ele trepava comigo a noite inteira e nem me ligava no dia seguinte. Meus amigos me amam, muito, mas nem o máximo de amor de uma pessoa chega perto do que deveria ser amor. Amor não significa mais amor. E eu, mais uma vez, olho para o lado morrendo de saudade dessa coisa que eu não sei o que é. Dessa coisa que talvez seja amor.

Sinto um nojo enorme e desesperador de todos os afetos em pílulas que posso ganhar. Fulano me acha a melhor companhia do mundo mas, pensando bem, ele pode desfilar com modelos por aí. Fulano pensa em mim todos os dias mas, pensando bem, ele tem que curtir a vida com seu carro novo. Fulano se diverte horrores comigo mas, pensando bem, ele também curte aquela tia tatuada que eu nem sei quem é e no fundo to pouco me lixando. Fulano passeou de mãos dadas comigo naquele fim de tarde que mereceu nossos aplausos, mas, quer saber? Viram ele dois dias depois de dormir na minha casa com outra numa festa. Fulano me apresentou para todos os amigos e encheu minha geladeira de comida mas, quer saber, putz, qualquer garotinha do bar dos pseudo-intelectuais malas também pode ser interessante ou, caso não seja, ao menos tem um buraco. Odeio todas as minhas pílulas, odeio todos os amores baratos, curtos e não amores que eu inventei só para pular uma semana sem dor. A cada semana sem dor que eu pulo, pareço acumular uma vida de dor. Preciso parar, preciso esperar. Mas a solidão dói e eu sigo inventando personagens. Odeio minha fraqueza em me enganar e mais ainda a dor que vem depois dos dias entorpecidos.

Eu invento amor, sim. E dói admitir isso. Mas é que não agüento mais não dar um rosto para a minha saudade. E não agüento mais os copos, as fumaças, os amigos, as intenções e as bolinhas de guardanapo pela metade. É tudo pela metade. Ao menos a minha fantasia é por inteiro. Enquanto dura.

No final bruto, seco e silencioso da melhor festa do mundo que nem começou, é sempre isso mesmo. Eu aqui tomando meu chá mate limão meio querendo chorar, meio querendo mentir sobre a vida até acreditar. Aí eu limpo a maquiagem com creme anti-sinais e percebo que não faz o menor sentido ser uma criança chorona preocupada com rugas. Aí eu me acho louca porque só tem duas coisas que eu realmente queria nesse mundo: um filho ou voltar a ser filha. E aí eu deito pra dormir e penso em sacanegem, mas também penso em coisas bonitinhas. E eu rezo pedindo a Deus que não espere mais eu ser legal para ser legal comigo, porque eu to esperando ele ser legal comigo para ser legal. Aí eu penso que ele já é legal comigo e que, talvez, eu já seja legal com ele. E que tá tudo bem. Mas se eu penso que tá tudo bem nesse segundo, isso só significa que vou pensar o oposto no segundo seguinte. E que eu escrevi “ele” sem maiúscula mesmo, porque amigo íntimo a gente não fica com essa coisa de endeusar. E eu queria que Ele fosse meu amigo íntimo, ou ao menos existisse. E quando vou ver, já dormi. Sozinha.

Quando eu for embora,
Você vai sentir minha falta?
Será que vai olhar pra lua e se perguntar
por onde ando agora?
Vai desejar voltar no tempo,
pra poder olhar nos meus olhos uma última vez, e dizer que me ama
Ou que poderia ter feito mais.
Quando eu for embora,
Vai restar o silêncio,
Entrelaçado com memórias
De um amor que não coube no presente.
Vai lembrar que eu te ensinei a amar,
As palavras vão rimar com a saudade
E vão dançar no vazio que eu deixei
Quando eu for embora.