Coleção pessoal de PamelaMarques
Tequila, café e cigarros exatamente nessa ordem me preenchiam. Aquela velha história do amigo engarrafado me era completamente aplicável, não havia companhia melhor. Porque eu não desejava conversar, pessoas se preocupam demasiadamente e eu não precisava de especulações, conversas enfadonhas e repetir tudo o que estava acontecendo comigo. Não. Eu não quero falar sobre isso. Isso o quê? Se eu tivesse noção do que era. Acontece que esses dias estão tortuosos e eu não desejo levantar-me daqui, a poltrona já adquiriu o formato do meu quadril e a TV me dá o entretenimento necessário para continuar trancafiada aqui. Sossego é o que eu quero. Desde que ele fora embora eu ouço versos que me falam sobre amores arruinados, o coração já não bate, esquecera completamente o tal do Tum-tum-tum. Será que o coração bate assim? Há algum tempo que não sei como ele reage, porque os dias estão vazios. Sabe toda aquela ideologia de que é possível viver sozinho? Pois é. Acreditava nisso piamente porque ele estava ao meu lado, agora que se foi tudo é cinza. E eu chorei um oceano inteiro essa noite. Eu precisava esvaziar. Porra eu preciso ser internada.
Pegou uma caixinha, papel de seda e esticou sobre a mesa, usou algumas fitas coloridas e o embrulhou. Seus dedos tremiam a cada laçada, começou a escrever um bilhete. Suas mãos trêmulas rabiscavam algumas palavras, enquanto suas lágrimas caiam sobre o papel manchando-o.
E suas palavras foram as seguintes:"César, Dou-te meu coração dentro dessa caixinha. Ele já não me pertence há tempos. Então é justo que eu te entregue."
Havia uma árvore naquela rua branca de ladrilhos avermelhados. Ela era bem alta, vigorosa e tinha umas florzinhas brancas, menores que flores de laranjeiras, bem menores. Elas tinham um cheiro forte, porém adocicado. Tão doce que causava tontura se você inalasse seu cheiro bem de perto. Não importava. Ela tinha cheiro de infância, lembranças da adolescência. Ela era pura saudade.
As palavras que ensurdecem
Deixando silêncios ecoando pelos cantos
É grito calado preso na garganta
É choro abafado, contido, refreado.
E então me é justificável o que balança e estremece cá dentro. Porque eu te vejo e tenho nos momentos mais difíceis, nas horas em que o mundo me incita a gritar, tu me fazes sorrir. Me é doce teus nãos, teus sims e tuas maneiras de se importar. É que tu não sabes, mas me é porto agora. É vontade tremenda, é refúgio. E então eu sempre volto a ti, porque a felicidade se encontra aí: nos teus dedos e palavras.
“Das muitas coisas que já vivi, queria poder recriar alguns momentos. É que infelizmente a vida não é uma peça de teatro que permite ensaios até que se alcance a perfeição. Quando a cortina se abre, eis o grande espetáculo: é a vida, meus caros.”