Coleção pessoal de marianastofel

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De tarde há sempre uma esperança escondida por trás das folhas das árvores, alaranjadas pelo pôr-do-sol. Os olhos, que cercam a vida, cavam constantemente os caminhos mais profundos que podemos registrar. E você não vê o quão bela pode ser a sua estrada? Há de se olhar com todos os sentidos do corpo e guardar dentro de si aquilo que será seu próprio porto, seja o verde-planta, azul-céu, ou cinza-da-rua-empoeirada. Para quem só deseja chegar, a velocidade em que se anda não é nada.

Toda flor que brota mostra-se nociva,
enraizada levemente pelas feridas da terra,
e já não respiram sós quando ganham vida,
são todas lindas pelo que são.
Toda menina que cresce mostra-se colorida
embelezada discretamente pelas suas próprias feridas.
e já não respiram sós quando se descobrem em outro coração
são todas lindas pelo que já não são.

As ondas do tempo trouxeram teus barcos de volta para mim
como se as marés fossem fiéis ao nosso amor.
O mar que banha nossos sonhos, que flutua nossas vidas,
aprendeu a afogar a nossa dor.

Todo perder é um encontrar lentamente.
E em cada curva, as esquinas escondem
as ruas que já foram viradas.
Os nossos passos decretam o nosso caminho,
Ainda que sozinho
por essas calçadas.

Sabe, vou aprender com você a fazer planos, você foi sempre mais feliz com eles que eu com meu 'instantismo'. Você foi fiel a eles até eu dizer que não iria mais brincar de realizar seus sonhos, que não, eu não seria sua fábrica de futuro.

Acredite, não há como separar estrelas do céu, algas do mar, eu sempre lhe disse isso. Você sempre querendo dividir nossa vida em meses, em dias, horas. Eu só queria ali, agora, sempre, você não sabe como é viver de urgências, de instantes, é uma delícia, meu bem, e você não aprendeu.

É incrível, mas a gente sempre se pega num momento como esse pensando o que se passa conosco. Quando o beijo deixou de ser carinho e as palavras deixaram de ser música. A linha tênue entre continuar alguma coisa e progredir alguma coisa. Alguma coisa como nós.

Eu te deixei no ponto mais longe para que eu não pudesse tocar quando sentisse frio. Retoquei a minha máscara de ferro com maquiagem azul e fui dançar com o vento na esperança de que ele me levasse para os lugares mais quentes, para onde minha memória repousasse como uma gota de chuva em uma folha. Era inútil imaginar uma vida sem você, sem as coisas que você me trazia, o cheiro de rosa do seu sorriso no fim da tarde, toda a sua ingenuidade ao dizer que não sabia mais o que sentia por nós.

E não há nada que me cale, a não ser a minha própria voz dita quando não se explicam as próprias palavras, elas são infundadas demais para todos os sentidos que busco. Vivo na eterna busca de me perder lentamente, o meu desejo é deixar de ser aos poucos. Afinal, sou tão leve que não me permito parar... Vento todos os dias.

E o que dizer a vocês enquanto essas questões não se resolvem? Que eu vou levando do jeito que posso, do jeito que sei. Que as estações me trouxeram um pouco de verão, mas que me ensinaram a ser inverno. Que eu brinco o tempo todo porque dessa forma eu memorizo, eu só guardo os sorrisos que arranquei. Que as flores e as estrelas são as coisas mais lindas que eu vejo e que eu me identifico com os pingos da chuva. Que eu me apaixono e trapaceio, que eu erro e peço arrego, que eu sei pedir licença, mas não lido bem com pontos finais. Sabe, meus caros, o mais duro foi ter nascido coração demais. É foda ter que bater na própria porta todos os dias pedindo pra sair um pouco.

Posso dizer que viver presa nessa película invisível me tornou forte. Que a sorte me tornou distraída a ponto de não me importar com ela. Que o vento me mostrou que a leveza das coisas encontra-se na parte pesada que se deixa libertar. Que os dias me mostraram que as dores são remédios cheios de contra-indicações. Que há sempre cura para o coração que bate por uma causa. Que não há tempo que explique como os sentimentos se libertam todos loucos procurando seus respectivos donos até descobrirem que nunca existirão donos. Que os sentidos, às vezes, falam mais bonito que as palavras dos tão valorizados sentimentos. Que o mundo é realmente um moinho e que toda esta lama um dia te suja de alguma forma, não adiantando tentar vestir branco o tempo inteiro. Que aqueles que não te dizem muito, podem te ensinar muito sobre você em silêncio.

E eu criava camadas cada vez mais grossas, com grades, alarmes que tocavam ardorosamente quando um desavisado resolvia se aproximar. Ah, meus amigos, vocês não sabem como é estar soterrado por várias camadas e continuar vivo..

Nós nunca estamos sós
quando temos diversos nós
dentro de nós mesmos.

Embora te fira, nem sempre há dor
E embora estragado, nem sempre mal cheira
E o tempo, que cego destrói
Também reconstrói as antigas barreiras.

No fim da tarde, olhos se põem
Deixando de lado esse curto verão.
Esqueça o que ficou,
pois nosso trem desgovernou
na contramão.

Ao reviver nestes braços, sentir de novo o mesmo cheiro, ao retocar o tempero que nos enche de sabor novamente... Ao contar para toda essa gente que o tempo se fez inútil e que a distância se fez nula, entendemos que está dentro da gente aquilo que a gente procura. E há quem diga que o amor nem existe.

Ao nos depararmos com as histórias antigas, registradas em fotografias, marginalizadas pela distância que cada uma delas nos trazia, era possível viver novamente aquele ontem tão distinto, tão deixado de lado pelas bordas desse novo infinito. E há quem diga que o amor não cheira a naftalina...

E é por prazer que a gente escolhe
a estrada que nos leva até o amanhã seguinte.
É beirando o horizonte pelas curvas,
que a vida fala, mesmo muda,
e é sempre boa ouvinte.

Ouvi dizer que o tempo corre
E, com os pés amarrados,
tudo que seria nascido, no tempo, morre
tudo que fosse perdido, no tempo, era achado.

Porque as horas são tão belas vírgulas
Partículas infinitas de instantes entrelaçados
Porque o tempo, ora, não deixa saídas
Mas há entradas por todos os lados.

E a espera continua parada lá fora,
Com os olhos voltados para o amanhã que vem
A vida brinca entre o presente que se deita,
Entre o tempo que não respeita ninguém.

Distância:
Ah! Essa saudade que não cabe
nessas gotas que escorrem
entre o vão dos olhos.