Coleção pessoal de mara_inez_sbrogio
Você pode ser abastecido de toda sorte de beleza. Você pode se vestir com charme, ser agradável com as pessoas, entrar no universo com toda generosidade. Você pode não fazer nenhuma bizarrice, ser bastante carinhosa, sonhar com absolutamente tudo que é extraordinário, inclusive realizar alguns sonhos. Você pode ser solidária, ter uma vida divertida, cheia de privilégios, contracenar com o que há de melhor nas paradas do momento. Você pode portar-se com dignidade e arregimentar muitos admiradores, mas nada disso cumpre o protocolo do amor, porque o amor é permanência de delicadeza.
Amar é elegante
NAVEGAR... PRECISEI...
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Começou a chover. Dia ainda.
De repente o despedaçado coração
Sentiu vontade larga de navegar
Navegar
Na enxurrada lenta que
Calava a voz da rua.
Navegar bonito
No raso dos olhos mais cinzentos
De uma cidade sem poente.
Vai daí,
O coração se arranjou todinho
Dentro de um pequeno barco de papel
E lá se foi...
Enquanto isso,
O magro corpo se molhado
Malemá conseguia se despejar inteiro
No leito das velhas esperanças.
(E, muito menos, na inutilidade do tempo)
OS DIAS SE VÃO...
Os dias se vão ou NÃO
Perdem-se no tempo como balões no infinito.
Tudo acontece. Próximos ou distantes
Os seres vivem e eu nada sei sobre eles
Em mim A vagas ideias apenas imagens irreais,
Recursos naturais, incertos e humanos
Os dias se vão, os meus os seus, os nossos... quem sabe...
Talvez se aprendermos a soltar balões,
Quem sabe... Os nossos... quem sabe...
EXILIO
Um dia, talvez, sentirei o amor.
De forma única, ao anoitecer.
De riso fácil, terei seu calor,
Talvez, o seu eterno prazer.
Mas, o que se faz é dor.
Pranto que nasce às estrelas.
Que escorre em atos de ardor,
... Deste exílio insano das profundezas.
A vida acontece aqui, no nada,
totalmente sem muitas flores.
Brindam angústias inusitadas,
como autênticos e maus desertores.
Não sabem da vontade que tenho,
num lugar de carinhos e união.
Esquecem que me fiz em meio
a doçuras enormes de paixão.
BARES DA VIDA
Garçom! Por favor...
Dois dedos de prosa
um trago de cachaça
e um pouco de atenção.
Traga-me um pano
e limpe essa dor
espalhada no balcão.
Garçom! Por favor...
Mais duas cachaças,
uma pra mim,
outra pra minha alucinação.
Deixe-me logo a garrafa,
baixe o volume da saudade
ou ao menos mude de estação.
Garçom! Por favor...
Cigarro, isqueiro e cinzeiro,
papel e caneta tinteiro
e bom bocado de inspiração.
Um envelope sem remetente,
e peça água de colônia ao barbeiro
para disfarçar o cheiro desta assombração.
Garçom! Por favor...
Uma canção de Amor
e um bocado de gelo
pra anestesiar meu coração
E traga logo a minha conta
e um prego de pendurar alma
tão maltratada pela paixão.
Garçom! Por favor...
E se eu não vier resgatá-la,
é porque não preciso mais,
use-a para limpar o chão!
CENA MUDA
Escrevo poemas, invento cenários
Pintados de tintas frescas, afago
Teus pensamentos em signos fáticos,
Sonhando com atos de amor.
É que, o que penso, nunca falo,
E falo, às vezes, o que não penso.
O que sinto, de fato, tímido
Bate a porta da garganta,
Avisando-te da minha presença.
Abre-me a porta da saudade
E invade esse coração sem pena.
Partistes, sem que nunca houvesse chegado...
Saudades de um amor sonhado.
E com a paciência de quem
Vai tirando a forma do barro,
Nós vamos compondo a nossa precária
E vasta eternidade em cenários e atos
Dessa vida que se faz teatro.
RASGANDO O AZUL
Seu rosto carente dança nos meus olhos perdidos!
No bailado das ninfas há a doce incógnita de uma tarde molhada.
Paira no ar o veneno do sulfato
Das rosas esmagadas na calçada, suspiros!
No seu olhar arde uma prece inflamada
No meu, em ritmo alucinante,
Dança uma deusa ferida
Desenha caricias no seu corpo adormecido de gemidos!
Faz-lhe voar como pássaro
Ganhar o universo temido
Num olhar toma-lhe os lábios
E alcança o eterno
Assim, livremente, ensina-o e aprende a amar
E, deposita em suas mãos
O brilho de uma estrela cadente, risos!
Estamos livremente perdidos no azul infinito do céu!
SER
Queria apenas um momento de imperfeição
Para que cada palavra se tornasse uma nota musical,
Cada sentimento uma cor inimaginável,
E cada pensamento a perfeição marginal entre o coração
E o que não pode ser.
CANÇÃO DA ESPERA
Sendo a sombra, apalpo o medo
Que sobre mim se resvala.
Para cantar ainda é cedo,
Mas minha voz não se cala
Há noite Espessa lá fora
Nenhum galo ainda canta
Mas brilha em meu peito a aurora
Nasce o sol em minha garganta
PORTO DAS ILUSÕES
Ontem a menina aportou
Para olhar fim de tarde velejante
Despejar seu jeito depois
Jazer junto ao lajeado cais.
(igualzinho a um poema)
E por um momento
A menina desconfiou
Que a vida desmanchava-se ali.
Logo depois
Já em face a face da noite
A menina descobriu seu coração em atalhos
Porque os sonhos primeiros tinham partido
Lépidos
Numa estranha sombra de mar
Todinha estampada de estrelas,
Lua, brancas areias, azaleias
(igualzinho a um poema)
Em seguida
A menina ensaiou um gesto qualquer de tristeza
Ensaiou; mas saiu apenas
Um gesto qualquer de alegria
Simples sorriso de outono
Bem mais tarde
A manhã veio naufragar brejeira nos olhos da menina
Naquelas poucas águas paradas
De tanta partida e fantasia
ESPERANÇA
I
No açude de hipocrisias
Quero receber a mensagem
De esperança das montanhas;
Admirar a pureza das nuvens;
Perceber a ingenuidade do Caboclo
Ser surda ao vento furioso
Causador do murmúrio das águas;
Ignorar os acordes
De uma brisa compassada...
Para então partilhar
Da alegria dos pássaros