Coleção pessoal de LorrayneAndrade

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Quem escreve, faz.
Faz amor com a poesia.
Faz pausas de alegria,
Faz hora, implora e até chora.
Mas não demora. O amor tem pressa.

Quem escreve, tem.
Tem um amor reprimido
Talvez o coração partido
Tem um porto seguro escondido
Tem medo. Ora, o medo superlativo.

Quem escreve, passa.
Passa fome de veneno
Passa horas olhando o vento
Desmancha-se, fragmenta-se, perde-se.
E precisa de apenas dois versos para encontrar seu caminho de volta.

Quem escreve, procura.
Procura uma nota musical na melodia daquele sorriso.
Procura sussurros em apuros de prazer, e urros.
Procura a paz de um abraço que pede pra se eternizar.
Quem escreve apenas está a se verbalizar.

[Pra se verbalizar]

Ocultei versos nas reticências de algumas frases. Ocultei cálices, melodias, poesias, silêncios, encantos, notas musicais, amores, prantos, risos. Por não querer provocar em ti a mesma bagunça que advém de mim.

Eu queria dizer muito sobre algo ou dizer pouco sobre tudo. Nas reticências do ‘Oi... ’ existe um universo de interrogações, exclamações, vírgulas e mais reticências... Sempre reticências. Talvez seja porque eu não leio o que foi escrito e às vezes até escrevo ás cegas pra não cair na tentação de usar a borracha sem cessar.

Sei que é preciso dizer, eu escrevo pra desancorar. E nesse naufrágio de palavras eu me afogo de tanto hesitar. Também gostaria que você percebesse. Os olhos também leem ações. Você lerá.

[Aposiopeses]

Será que existe algo mais emocional do que optar por ser racional, por medo de parecer ridículo ou patético?

Eu passei os primeiros dezoito anos da minha vida achando que as pessoas racionais se dão melhor na vida. Eu passei os primeiros dezoito anos da minha vida achando que deveria me trancar dentro de mim mesma, passei achando que amor é coisa de gente boba, achando que as pessoas sempre iriam me machucar. Eu passei os primeiros dezoito anos da minha vida segurando as lágrimas que insistem em cair ao ver uma cena emocionante de um filme, passei vislumbrando as estrelas escondido, passei escrevendo uma frase aqui outra ali, sempre separadas para que não formassem a poesia que me encantaria. Eu passei os primeiros dezoito anos da minha vida querendo mudar o mundo sem antes mudar minha própria cabeça, organizar as ideias, o caos que existe aqui dentro, passei como passam apressados os carros na rua.

Depois dos dezoito percebi que o que eu fiz foi eliminar a minha própria essência. Tal que eu não posso e nem quero mais controlar. E agora dezoito vezes desejo que dezoito anos venham, para que eu não apenas passe, mas viva verdadeiramente a essência de ser eu, como só eu posso ser.

Eu escrevo pra desancorar emoções. Escrevo pra tentar controlar o caos daqui de dentro, pra peneirar um porto nessa tempestade. Escrevo pra suicidar no vento o peso das palavras. Escrevo para me libertar. Escrevo pra transpassar fronteiras, pra alcançar certos ouvidos, e me perder no meio daquela barba. Ahhhh minha excitação por barbas! Já se sabe quem provocou. Eu escrevo aqui porque a poesia tatuou em mim o gosto pela vida, pois essas palavras são quociente das minhas experiências. Talvez eu escreva para máquinas e robôs. Ninguém lê mesmo. A vida acontece no virtual dos corações frios e se desmancha no grito de horror proclamado na esquina dos contos, (a)casos, (des)encontros. Escrevo para sentir a mim mesma e não sentir a maldade alheia que permeia, que espreita. Escrevo porque se eu gritasse ecoaria apenas aos mudos. Neste mundo de poucas cartas e muitas selfies todo diálogo é de surdos. Eu escrevo porque escrevo, não há explicação.

Explico-te: quando para o céu eu olho muito sinto, vontade de soluçar em palavras. As estrelas iluminarão minha alma perdida em meio á esse caos envolto de paz. Ela conseguiu fugir. Aquela que eu te dei sem pedir nada em troca. Se você conseguir me achar, digo achar minha alma, não se preocupe, minha poesia te indicará a hora, o dia e o local para devolvê-la á mim. E já peço desculpas. Ela conseguiu escapar do meu guarda roupas. Disse que não aguenta tanto frio, e que agora vai de encontro á linha do Equador dos seus olhos, ao trópico da sua barba, ao meridiano do seu sorriso. Sim, ela é louca, eu sei. Foi assim desde que te presenteei com ela. E eu sabia que era um caminho sem volta, um mal sem remédio, uma doença sem cura. Eu te dei o bem mais precioso como a primavera dá flores á natureza. Lembro-me do plasma célebre que vi em seus olhos naquela tarde de sexta. Você me olhou, eu sorri, você me beijou e eu senti. Não a deixarei fugir novamente. Uma dose de Cianureto resolverá. Ela precisa dormir, eu preciso. Não para fugir, não há guarda roupas pra mim. Dormir para descansar a alma do peso dos sentimentos. Beberei minha solidão.

[Das coisas que fugiram do meu guarda roupa]

É sempre inverno no coração de quem escreve. Mas foi no verão que fiz amor com a poesia. Eu quis trancar todas as minhas assombrações no guarda roupas. Couberam as lembranças, as cartas ridículas, a saudade, o ócio. Foi difícil fazê-las entrar. Tranquei até a alma que te dei. Eu desenhei todo o meu amor nos papeis que estão na gaveta e que você não leu. Eu me desfiz de todas as roupas com seu cheiro. Desfiz-me das telas, tintas e pincéis que usei para retratar sua barba. Ah! Minha excitação por barba, você provocou. Agora meus pensamentos são ondas de ócio num mar de mesmice. Eu me perdi dentro de mim mesma só para estar despedaçada nos lugares mais improváveis. Eu estava no seu bolso, no galho de árvore que aponta pra sua janela, no ponteiro do relógio, no corrimão da escada da saída de emergência, na estante atrás dos livros, e até dentro, na página em branco. Veja quanta coisa há nesse guarda roupas, virou uma prisão de sentimentos, cores e intensidade num volume extraordinariamente proporcional ao que eu tenho no meu peito. Escute o barulho que eles fazem, já não consigo mais dormir á noite. E nem me atrevo a citar seu nome. Seria ensurdecedor. Permita que eu compartilhe contigo a luta que travei comigo mesma para voltar a ser alguém normal. Entenda que a saudade me bate, violenta, imperdoável. Eu tento contê-la. Tudo isso é pesado demais pra mim. A minha lanterna ilumina o chão que pisarei, pois o caminho já percorrido me fez calos nos pés. Você me fez calos, a dor me calou, só a poesia me salvou.
[Das coisas que fugiram do meu guarda roupa]

Somos doutores em resolver assuntos alheios enquanto nem os nossos próprios problemas somos capazes de resolver.

Andei pensando nas coisas da vida
Pensei andando na vida coisada
Nesses tempos de preconceito nossa boca não será calada
Já se sabe que somos as netas das negras escravas que vocês não descarnaram. Já se sabe que somos os netos dos negros escravos que vocês duramente surraram. Já se sabe do apoderamento errôneo da nossa cultura, dos casos de discriminação. Já se sabe que a negritude é a que mais morre, da violência, das guerras e até já vimos os corpos no chão.
E você meu caro? Qual é o plano? É a tua gente que sofre!

Prefiro ser desses que não seguem padrões, não se enquadram e nem fazem questão de tal, não andam na linha, mas traçam uma, baseado naquilo que entendem, e se entendem o fazem muito bem.
Prefiro ser desses largados, nada de ostentação nem apego á bens materiais, nada de roupas de marca ou sapatos caros. O melhor da vida é se sentir livre, e viver desapegado. Apenas nos apegamos aos momentos mais insanos e intensos que nos submetemos a viver, como se a experiência fosse o único bem de valor imensurável, e isso ninguém pode nos tirar.
Prefiro ser desses sem vaidade, sem qualidades, sem méritos e sem pudor, sem rótulos. E sendo assim é que somos quem queremos ser, sem fingimento, sem máscaras.
E essa preferência faz de nós o mesmo que um escultor faz com suas peças. Se o sistema nos molda de uma forma, cabe á nós seres pensantes nadar contra a maré. Não por simples teima como fazem os revoltados sem causa, mais do que isso, agimos assim por acreditarmos numa forma de vida diferente á esta que já estava aqui quando ainda nem pensávamos em nascer. Fomos submetidos á isso e lutaremos contra o mesmo, começando por nós mesmos. A revolução começa dentro da cabeça de cada um.

Você acha que um minuto é pouco?

Um minuto não é pouco quando te faltam palavras. Um minuto é distante para sentir se mais perto. Um minuto é luz quando o raio corta o céu aberto. Um minuto é suficiente para desabar o castelo de cartas. Um minuto é eficiente olhando atento o suporte de facas. Um minuto é pouco quando todo diálogo é de surdos. Um minuto é inútil debaixo de dois pés esquerdos. Um minuto é paladar quando bebo solidão. Um minuto é desespero dentro da escuridão.

O cansaço na maioria das vezes não vem do corpo, vem da alma. Por isso o sono. Essa maneira interina de morrer nos faz descansar. É preciso dormir, dormir desesperadamente. Não para fugir, não há como fugir de nós mesmos. Mas dormir para descansar a alma do peso dos sentimentos.

Eu te amo em liberdade. Não quero que pertenças á mim. És livre como o vento que transpassa as fronteiras de Norte á Sul. Eu te amo em liberdade. Ouça: eu te permito ser, então permita me ser. Eu te amo em liberdade.Por que quem ama deixa livre e é escravo somente de sua própria consciência. Eu te amo em liberdade. Por que ser livre não é não ser de ninguém, é ter a coragem de se permitir viver um sentimento. Por isso me ame em liberdade. Estarei aqui quando você quiser chegar, te amando em liberdade.