Coleção pessoal de LorenaPimenta
Desde que você se foi, espero o improvável. Te vi apagar o meu número e ainda assim, quando o telefone toca, corro para atendê-lo esperando ver o seu nome na tela.
Se você não leu os livros favoritos dela e ouviu seu top cinco músicas favoritas para se escutar no carro por no mínimo duzentas vezes no volume máximo orando para que ela passasse pela rua no exato instante em que canta o refrão desejando fazê-la enxergar que existe no universo ao menos um ser humano que realmente se importa com todas essas coisas que ninguém tem interesse, você não tem o direito de querer enfiar na minha cabeça que para esquecer basta querer. O dia tem vinte e quatro horas e eu passo exatamente oito repetindo “ela não é a coisa mais importante da minha vida, ela não é a coisa mais importante da minha vida, ela não é a coisa mais importante da minha vida, ela não é a coisa mais importante da minha vida”. E vou dormir com a certeza de que ela é sim a coisa mais importante da minha vida. Sei que existe toda essa conversa sobre o amor-próprio ter de nos bastar e que devemos sempre vir em primeiro lugar, mas se existe no mundo alguém por quem você morreria, essa teoria besta deve ser jogada no lixo. Todos os dias ela passa por diversos lugares, para, cumprimenta pessoas, mas nenhuma delas a vê da forma que eu a vejo. Olhar para ela me faz misturar reações isoladas, aleatórias. Eu misturo as moléculas agitadas do meu corpo com o sorriso dela. Misturo a minha taquicardia com os cabelos dela. Misturo o vento com o cheiro dela. Misturo o caos do universo com a paz dela.Se você fala do mundo como se ele pudesse ser o mesmo sem ela ou não olha a foto dela a cada quatro horas porque ama os traços do seu rosto ou se esconde das pessoas por medo do quanto o amor pode te tornar patético, você não pode dizer como devo me sentir.
Às vezes a gente conhece alguém e logo sente que o perigo mora ali. Que no pequeno caminho traçado para o cumprimento com dois beijos no rosto tem uma mensagem subliminar que avisa “vai dar merda”. Por que não paramos? Por que prosseguimos? Qual é o nosso problema? Contigo, na hora em que nos apresentaram, estritamente no primeiro segundo, foi assim. Eu senti.
Você liga na quarta me chamando para sair sexta e minha vida vira uma contagem regressiva. Perco a fome. O sono. Mas não reclamo, pelo contrário. Distribuo sorrisos, passeio com o cachorro, lavo a louça do jantar, chego animado no escritório e tudo é festa. A piada sem graça do colega de equipe me faz rir por minutos. Canto com gosto a música chata que toca no bar da esquina e, em vez de reclamar do calor escaldante que faz na noite de quinta, calço os chinelos, saio por aí, caminho pela orla, reparo na lua, sento no quiosque mais pé sujo da praia e tomo uma cerveja barata enquanto converso com alguém que nunca vi antes. Sorrio como se a vida tivesse antecipado meus créditos de felicidade. Daí o dia finalmente chega e, no metrô, todo mundo está animado, sem motivos, porque não precisa, esse dia é tradicionalmente leve, bom, contente, esperado. Mas ninguém sabe que para mim não é uma data qualquer. Torço para que a hora voe. Ela passa devagar. Crio diálogos, imagino abraços, prevejo beijos e, quando a noite cai, basta te ver vindo abrir o portão com o sorriso aberto no rosto, para que eu arremesse no espaço todos os meus ensaios. Aí você me abraça, dá um beijo na bochecha e pergunta como passei a semana com a inocência de quem não faz ideia de que foi dona de todos os meus dias. Eu respondo que correu tudo bem. E sorrio sem saber que esse dia é o mais aguardado do ano até o nosso próximo encontro. Naquela ligação você não me roubou só alguns dias, me roubou inteiro.
Às vezes fico pensando no que é que eu fiz de errado, em qual é o meu problema para não te fazer sentir uma paixãozinha sequer. Te vejo olhando para tanta gente errada. Tanta gente que não tem nada a ver contigo. Dá uma vontade de brigar, gritar na sua cara o quanto você é burro.
Ela está naquela fase de fingir que não dói. Acorda fingindo que não sente falta e vai dormir tentando convencer a si mesma que logo isso passa. Aliás, já está passando, porque faz uma semana que parou de buscar incansavelmente notícias sobre a vida dele e não chora há quatro dias. Um verdadeiro recorde.
Enquanto grito ao mundo que todas as formas de tentar te esquecer falharam, calculo a quantidade de amigos que superaram o fim de seus relacionamentos e colocaram novamente a cara a tapa. Por que comigo as coisas não fluem?
Às vezes me pego olhando fixamente para a sua foto na esperança de que as coisas mudem aqui dentro. Queria ter um medidor dentro do peito, uma espécie de amordômetro, que a cada vez que eu esbarrasse com algo seu, sinalizasse em que nível está o meu amor. Algo que me desse a esperança não de que um dia isso passará, porque eu sei que vai, mas a de que já está passando, que falta pouco para que eu me liberte e te olhe sem parecer ter passado óleo nos olhos, com o coração sossegado, sem a urgência de querer habitar o seu mundo.
A verdade é que, apesar de pedir diariamente aos céus para te esquecer, não sei se estou preparada. Ficará um buraco terrível no peito. Quem é que me fará transbordar apenas com um olhar?
Passou da hora de eu te deixar para trás por mais que a minha alma siga gritando que ainda posso reverter a situação. Não adianta acreditar. Sei que não posso. Mas esse amor, ele é como cerveja saideira de bar, sempre tem mais, nunca é a última. O meu amor por você anda diminuindo, mas, ainda assim, é o suficiente para me arruinar.
Reparei nos seus olhos, boca, nariz e foi como se estivesse encarando alguém comum. O que seria ótimo se não infinitamente estranho. O vazio relâmpago de não sofrer me fez perceber o quanto encontrar a cura pode ser assustador. Como pude olhar dentro dos seus olhos e não sentir nada? Você vestiu a normalidade. Te vi e não senti bulhufas. Me senti esquisita. Tudo ficou vago. Desabitado. Livre. Oco. Ao ponto de eu enxergar a dor como preço razoável para não se precisar reerguer o mundo.
Naquele dia eu estava largado, um pouco alto da bebida, totalmente o oposto de como gostaria que ela me visse – não que eu ficasse pensando em como deveria estar quando nos esbarrássemos, mas ali, tudo o que pareceu ter perdido importância voltou a importar. O universo novamente se reduziu ao espaço que ela ocupa na terra e o bloco se resumiu a como eu chegaria nela para insistir de novo em tudo aquilo que jurei nunca mais tentar. Quando o destino nos apronta uma dessas, como é que a gente faz para enfiar novamente na cabeça que não é para ser?