Coleção pessoal de juliocorreapoeta
Não choro lágrimas de ontem
nem vivo sentimentos passageiros
Gosto de algo capaz de surpreender:
dê-me um sol azul
uma flor quadrada
um beijo no meio da madrugada.
O que me faz feliz é ser aquilo que sou, pensar e agir da mesma maneira, não esperar por ninguém pra realizar meus sonhos.
Estamos tão perdidos, descrentes de que algo bom e maior vai acontecer que nos sujeitamos à primeira migalha oferecida...
Trídent de Canela
Você engravida meus anseios
incendeia meus neurônios
enfraquece minhas atitudes.
Eu me pergunto o porquê de tudo isso
se nossos caminhos parecem-estar-outros
retas-paralelas-opostas
procurando alvos imprevisíveis.
A solidão me convida pra dançar
puxa meu braço
rouba meu sorriso
oferece abrigo.
Finjo ser surdo-cego-mudo.
Você reclama do tédio
da monotonia dos dias
não gosta de ficar sozinho.
Classifico sua carência através da minha fome.
Somos mariscos na pedra
imprensados pelas ondas do mar.
As horas se transformam em urgência.
Jogo minha timidez pra escanteio.
Adjetivo minha identidade
sugerindo uma rápida reflexão
em sua jornada desnivelada.
Você ingere uma dose de vento
masca um afrodisíaco trídent de canela.
Eu bebo uma ice
encaro seu rosto
enquanto seus potentes diamantes negros
procuram um breve romance na multidão.
Percebo sua pressa em encontrar alguém
que acelera minha embriaguez.
Mas você não entende
ou falta coragem pra aceitar
que sou sua presa
esperando o tiro acertar minha alma.
Cadê sua arma frasal?
Onde está sua atitude?
Por que não dispara o projétil certeiro
no centro da minha carência afetiva?
Parto pro ataque!
Deixo de ser ovelha.
Ser lobo me excita!
Retiro seu trídent de canela
de dentro de sua boca domesticada
com minha língua hábil-atrevida.
Vou mostrar pro seu corpo
o lado agridoce da vida!
Ele vai a-do-rar!
Constatação
Chove nos edifícios, nas árvores e nos sapatos.
Um silêncio mudo invade meu olhar distante.
Sou aquele que espera a resposta do vento
e acredita explodir todos os porquês.
Não mendigo razão, nem uso maquiagens no coração...
O que fascina meu olhar é o inesperado,
a ausência de regras descoloridas.
Abro a porta, castro a covardia,
saio sem capa de chuva pela tempestade da incompreensão.
Gosto dos pingos da chuva acariciando minha nuca,
beijando minha face...
Busco a sensação peculiar
que a naturalidade pode oferecer aos lábios sem prisão,
sem cortes, sem escudos, sem perfeição.
Sou lagarto se adaptando ao clima da vegetação.
Foi tão sutil a lembrança de você me tomando pela mão que quando dei por mim, estava indo em direção ao mar. Misturei agua salgada com lágrima e ninguém percebeu que meu coração permanece em processo de cicatrização. Putz, como leva tempo curar feridas!
TORPEDO POÉTICO
Só sei que de alguma coisa eu sei
*é sempre mais difícil ancorar um navio no espaço
Sem amarras
sem espias
sem cais
você corre
esconde a fala-resposta
apaga meus torpedos de desespero
desliga o celular
Fico sem ponto de atracação
sem cumplicidade
sem beijo
Roupa pendurada no varal da ventania
garrafa quebrada pela incompreensão
corpo vazio
Uma onda morde meu sonho
engole minha gravidez
Seus lábios tipo A
têm medo da minha boca tipo AB
* Ana Cristina Cesar
do meu livro Substantivo Desvairado-Sedutor
O amor é para ser levado a sério. Ele não gosta de prateleira, nem brinca de esconde-esconde. Na verdade, ele não gosta de ser levado. Ele se instala. É dono, senhor intransferível.
O amor é uma avalanche num desfiladeiro – precipício de boas intenções. Contém todas as reticências, todos os pleonasmos. É o ponto final iniciando o período. É o desvario ambicionado das emoções.
O amor não pula numa perna só, como o saci-pererê. Ele usa todas as que lhe são alternativas.
O amor aniquila projetos a curto ou longo prazo. Concede esperar, mas cobra uma atitude e as contas com reajustes. Não aceita o faz-de-conta.
O amor é imperioso, sendo que, em fúria, se permite a doçura extrema e se torna vulgar e frágil como um favo de mel.
O amor é um par em um. É a célula recomposta. É a correspondência plena.
O amor é uma estrela de primeira grandeza. Ilumina a quintessência do universo, do interior para o exterior.
(Do meu livro: E-mails para Clarice)
Caro Oscar Wilde, hoje há tantos Lorde Alfred Douglas que há de ser ter um cuidado redobrado pra não cair em desgraças.
O ser humano está se transformando em um amontoado de adjetivos banalizados: egoísta, invejoso, falso, traidor,calculista...
Agora me olhas com tristeza; eu, apenas, com indiferença. Não derramo lágrimas por amores deletados da minha alma.
Eu fiz da nossa história a razão da minha vida. Fechei portas, abri estradas, plantei árvores, arranquei espinhos... Corri, sangrei, sorri. Fiz tudo e de tudo um pouco me transformei para agradar seus desejos sempre tão intensos. Não me arrependo de nada.
A vida é feita de escolhas. Você sempre soube disso. Não dá para querer as coisas pela metade, apenas pelo lado bom. Assuma os dois lados da trajetória que resolveu seguir. Não vou lhe emprestar meu lenço para secar suas lágrimas débeis. Já estou em outra direção, com outros alguém para cuidar e doar meu afeto.