Coleção pessoal de hidely_fratini

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⁠Reflexões sobre a inveja e carapaus

Dormente desde sempre,
Despertada pela extorsão.

Inveja? Como?
Comigo, que sempre me senti afastada desse pecado?
Inveja de um ser com ações canalhas?
Como assim, explique-se donzela.
Expliquem-me!

Penso.
Penso.
Só faço pensar.
Não concluo nada.

As imagens de seres canalhas assombram-me.
Não me largam.
Compulso nesse quadrado de ideias sensuais mal resolvidas,
Mal formatadas.
Ideias sem práticas.
Sinto, sinto e mais sinto.
Deixada, fui, ao vento,
ao léu,
ao relento.

Fiquei a ver navios - como diz o ditado.
Chupando vento, ao invés de carapaus!
Encobri-me de mil compromissos:
*Espirituais;
*Trabalhistas;
*Familiares;
*Leituras e escritas.
E a cama cada vez mais vazia
de união afetiva e carnal.

Passei a olhar para mim e por mim.
Bastava-me, pensava!
Hoje, a luz estelar do tempo plantou-se
em meus cabelos, nos olhos, nas coxas, na pele e na mente...
Mostrou-me um todo desconhecido, ainda.
Vazia estou, mas sem invejar nada e ninguém!
Sozinha de amor completo e íntimo.
Só com migalhas coletadas do chão do tempo!

2023

⁠Cercas inúteis

Coloquei cercas em todos os lugares
E em todos os recintos de infinitos ais.

Coloquei barricadas,
Erguidas para delimitar fronteiras.
Cimentei o solo para não brotar pavios,
Nem de sentimentos,
Nem de quaisquer lembranças.
Para não deixar entrar sequer um fio
Da luz que chegava lá do norte.

Isolei-me inteira.
Inconscientemente, criei mundos,
Submundos,
E relações complexas:
*Sorridentes
*Infelizes
*Faz de conta
*Perigosas.

Onde amarrei meu insólito burro, sempre perguntava,
Dando asas a ditados sertanejos.
Estava bem lá, o burrego,
Dentro de uma caverna sem Platão
A sugar meus ossos e de donzelas!

Estava.
Finalmente, partiu!

Hoje, indago sobre o sentido de tudo.
E me cobro uma explicação certeira
Escancarada nas pedras e na linha do tempo
transcorrido e que não via.
E, como sempre, saio ao vento
Buscando todas as respostas!

2024
Madrugada

⁠Meninos da serra

Meninos,
Com pedras nas mãos no alto da serra,
O barulho do mundo
Por acaso não espanta
O choque das pedras nas águas do rio?

Nov/ 1974

⁠Figura de farol
(inspiração pós adolescente)

Chovia.
As pessoas pegavam capas,
escondiam-se da chuva.

Mas, enquanto todos fugiam,
um ser continuava impassível.
Era o semáforo queacenava
suas cores gentilmente.

Não se abalaram as estruturas...
Só gotas d'água lhe escorriam
como lágrimas que fossem suas.

(São Paulo é um santo pesado que uma procissão carrega. Carlos R. S. Araújo)

abril/1971

⁠Agonia de amantes
(para a outra)

Agonizo por entre sofrimentos de descobertas assustadoras.
Mal chega o outono e fico louca de ciúmes!
Eu, versus ela, ardentes damas a se digladiarem
pelo mesmo gigante adormecido de tempos imemoriais.

Quisera ser outra, delicada, diferente dama,
com a vida transcorrendo sempre pelo mesmo fio.
Mas não, sou maluca de pedra,
de nuvens,
de realidades,
de fraquezas,
de ilusões,
que muda, a cada década, o ritmo louco do seu ser.

Penetro pelo espelho transparente dos meus olhos.
Assusto-me com a realidade brilhante que surge de seus túneis,
por refletirem a repetição alucinante de dois corvos:
__ Eu e ela, aparentemente as mesmas nesta história...

É uma luta, quebra de braços?
Um grito surdo-mudo e sem respostas?
O medo penetra-me! Rodopio assustada e caio
como a perceber minha má sorte!

Borro-me toda: cabelos, pernas, olhos, tronco.
Como em dança flamenca, o suor escorre, admirado,
por entre gritos, palmas, castanholas, sapateados e rodopios.
Minha vida aterradora esvai-se da suprema fonte.
O sofrido golpe do destino engana-me, penso ser forte!

Apesar do ritmo alucinante,
do sangue castelhano,
da muralha soerguida à minha volta,
choro como um bebê abandonado,
sentindo não ter forças para enfrentar a realidade!

Eia dança de outros mares,
faz-me gingar no tablado das emoções,
batendo pés, rodopiando por entre meus interiores,
como ramo de avenca verde, fresca, delicadamente apaixonada!

Maio/ 1992

⁠Ponto longe
(inspiração pós adolescente)

Na palidez alva dos teus traços,
A tua alma revestiu-se humilde.
Os teus olhos choraram,
Apesar das lágrimas não rolarem.

Na contemplação do teu amor,
O teu ser, meio envergonhado,
Fez tuas mãos fugirem
Perante o primeiro contato de outra carne.

As tuas mãos vagaram pelo nada.

Ah, quantos vivem tristes,
Quantos não são como este ser amado e se repelem.
E quanta insegurança há neste mundo!

Agora, no fim deste poema,
Pela emoção, nenhuma palavra sai de mim,
não há mais nada.
A capacidade de mudar tudo
tornou-se ponto longe!

1971

⁠INCANDES
(A história é um pesadelo do qual estou tentando acordar. James Joyce)

- I -
Alma vagueia pela cordilheira andina
Em busca de civilização antiga, perdida no tempo.
É noite escura e estrelada.
A Lua orbita por trás da Terra.
Sombras mapeiam os cumes nevados.
Minh’alma, com elas, rastreia as superfícies em busca dos íncolas andinos.
De pontos mais altos, vislumbram-se instrumentos musicais:
cordas, sopros, quenas,
violas, charangos,
flautas de pã, batuques.

- II -
Plantas e cordas
Vieram ao mundo para se tornarem instrumentos locais,
Dar vida àqueles sons típicos, captando-os do éter –
Origem de melodias suaves, fortes e penetrantes,
Representantes de um povo inteiro!

- III -
Mais que isso...
Percebem-se energias antigas
Vagando pelas noites estreladas
Que desde tempos remotos permanecem naquelas "plagas".
"Playas" de Titicaca e de outras dimensões.

- IV -
Átomos de células "viejas" unem-se
Formando óvulos, espermas e energias infinitas
Buscando-se eternamente pelos Andes.

O que fazer e qual a razão de ser?

Procuram-se nas dimensões tridimensionais
entre átomos de energias variadas - conceptivas e que deem liga na formação de novos seres, pois,
Forças contrárias, unidas, geram vidas.

Perpetuam-se, assim, a cultura "tiahuanaco"
*********** dos Incas
*********** dos Quíchuas,
*********** dos Aimarás...
e de tantos outros mais!
Povos que seguem em frente ligados por uma teia
Replicando-se até o fim dos tempos! Será?

- V -
Com os sons dos instrumentos
Unidos às melodias andinas,
Redesenha-se um grande mundo
Que não morre,
Mas vive e palpita
Na mente,
No coração
E na criação de novos povos e de novos corpos
.................argentinos,
.................bolivianos,
.................chilenos,
.................colombianos,
.................equatorianos,
.................paraguaios,
.................peruanos
.................uruguaios,
.................venezuelanos.

De norte a sul da América Latina.
Para todo o sempre ...
em constante transformação!

Assim se espera!

junho/2005
(Alterações realizadas conforme as ideias foram surgindo a cada releitura)

⁠SAUDADE DOS ANDES

Sentimento invade o ser que dorme
Penetrando lembranças apagadas pela mente.
Ressurgem imagens que invadem o coração
Como presentes escondidos no inconsciente.

Pergunto-me:
__ Onde estou? Que lugar é esse?
Uma resposta apresenta-se em meio à névoa,
Evocada pelo som de uma orquestra
Que vem ao meu encontro.

Uma voz canta e ecoa reminiscências
De um passado ainda mais remoto
Que despertam pela vibração dos instrumentos:
Violinos, órgão, "chello" e uma voz de contralto a cantar!

Viajo. Vou longe. Aos picos dos Andes.
Vejo os incas: são mulheres, homens e crianças,
Cabanas, fogo, céu estrelado e a mesma lua.
Sons abafados, choros, canções e risos.

Não quero voltar!
Está tão frio lá fora...
Mas sinto um calor intenso em mim.

De repente, o som se transforma!

Uma buzina soa estridente do outro lado do mundo.
Retorno, sem piscar, rodopiando, ao mundo presente,
Ao plano material e dos corpos físicos!
São 23 horas de um dia 29 de outubro.
O ano é 2004!

Uma multidão discute embaixo da janela.
A noite está quente.
Água cai do céu...
E a orquestra já se foi...

Como nunca, estou mais do que presente!
Malgrado os ruídos que vêm da rua,
O quarto está calmo e em silêncio:
Reverência pelos irmãos que dormem nos Andes - como sempre!

out/ 2004

⁠Não sou, mas...


Não sou religiosa.
Não sou crente,
Nem descrente.
Creio
somente!

nov./2023

⁠A nova vida (nem tanto) paulistana


Praça do shopping
Almoço
Pai e filho ao lado
Nenhuma palavra
O adolescente curva-se ao celular
Olhos e mãos fixos no aparelho
De repente, nem tão de repente assim,
Quatro palavras saem do pai:
__ Vou ali. Já volto...
Filho continua mais curvado do que nunca
Mira e digita com dedos ávidos
Nem levanta a cabeça
Arre, que incômodo é esse que incomoda tanto!

Rio comigo, pois nesse contexto
Não é possível fluir palavras

Pai retorna
Arruma as coisas coletivas: mochila, capa, agasalho, guarda-chuva
Mais uma palavra é dita:
__ Vamos...
E lá se vão pai e filho
Cada qual em seu mundinho mundano e quadrado
Talvez redondo ou triangular
Tão paulistano!

Olho à minha frente...
Prato posto com alimentos saudáveis

Rio de novo...
Minha vida flui...

Cadeira vazia à frente transmite mensagens:
* Os amigos invisíveis estão por perto (parentes, mentores, guias, anjo da guarda)
* Os amigos encarnados, também presentes,
Estão em meu coração e em meus pensamentos
Isso é bom demais
Acalenta.

Rio...
A vida flui
Pois ela precisa prosseguir em seus intentos.

julho/ 2024

TRINTA E UM DE DEZEMBRO DE DOIS MIL E VINTE E UM

Mais um ano passou por mim
e por todos os seres.
2021 vai-se como todos os demais anos,
Apesar de ser, tão somente, ilusório,
O planeta retoma a trajetória a partir do mesmo ponto,
após 365 dias terrestres e uns quebrados.

Eu passei, também, com ele.
Envolvida no tempo,
Entrelaço-me com as estrelas
Querendo voar longe e bem mais...

Deixar os que estão por perto
Para perder-me em mim.
Se possível, com outro ser que adentre novos buracos luzes:
- um parceiro que busco por haver me enganado no passado
- estou na labuta por
(a)braços, cheiros e trilhas!

Mas quem se importa?

A vida,
penso saber,
é mais que ter parceiros individuais, ser d’um só coração

Precisamos de muitos braços e corações para os projetos verdadeiros,
indo além:
• pensar e encontrar novos caminhos
• enfrentar o que for necessário
• superar as mágoas e tragédias
• estender as mãos aos irmãos para ajudar
• buscar conhecimento universal e sabedoria
• ter sonhos e esperança
• realizar o que for possível e, muito mais,
• para encontrar o improvável!

As pessoas devem ultrapassar as barreiras...
dos preconceitos e das divisões sociais.
A Mãe Natureza, tão maltratada por nós todos,
reivindica seus espaçose os reconquistará,
pois é da sua essência não se submeter ao imponderável!

⁠Falso positivo


Minha união
parecia ser tão positiva e firme...
Até perceber, um dia, ser aparência,
o seu revés:
-- a necessidade de ser o que não era; ser o seu contrário.

O positivo
do não-ser.

⁠Anotações de ideias


As marcas do seu ser estão por todos os lugares.
Como pegadas, marcam meus olhos e meus caminhos.
Apesar de seguir por outras trilhas,
Por paragens que a vida me oferece e me conduz,
Vislumbro seu cheiro em cada livro aberto,
Em cada pensamento do passado que me surge.

⁠*Água sobre a cidade*


Num tempo, São Paulo seca.
Agora, encharcada...

Como se as águas conscientes,
Morando nas profundezas da terra,
Entendessem o seu lugar
para retornarem sempre:
Ora amigas.
Ora bravias.

Matando a sede,
Enchendo casas,
... Ruas
... e as próprias almas!

junho/04

⁠A extorsão de prazeres infelizes

A dor partiu o meu ser em nada,
Que se deixou paralisar em tramas várias.
A extorsão entrou pelas janelas sem pedir licença.
Esmurrou as portas,
Penetrou os cômodos
e se deitou calmamente em minha cama.

Foi mais fundo...
Estagnou os corpos, as mentes e as almas.

Permaneceu fincada no vazio
Para instalar-se no meio de todos os presentes.
Ditadora barata, mas que sabe o que fazer e onde quer chegar...

Vieram mais dores,
Maiores ainda que o primeiro round,
E, com elas, prazeres delirantes
Por suposta síndrome sem fim!
A dor escorria pelos braços,
Percorria pelas pernas,
Afundava o coração nas sombras.
Palpitando, este voava sem destino,
Asas quebradas e sem razão.

Dia a dia, puxando cada fio,
A teia toda revelou-se inteira.
Clarão nos olhos:
- iluminaram-se a razão, a mente e todo o ser!

Enfim, uma decisão podia ser tomada!

2021

⁠Retinas e vidraça

O dourado do pôr do Sol ficará retido em minhas retinas e memória.
Todas as imagens juntas.
Desde que nasci, ainda menina,
Sentava no chão e, ao pé da cama de meus pais,
privilegiada visão do todo me invadia.
Olhos fixos na vidraça e muito além,
Sob o astro rei que reluzia -
eu confirmava, ainda pequena:

__ É redondo como uma laranja; enorme como o fim do mundo e o começar dos tempos!

2021

⁠Dor no peito
(visão da morte e seus prenúncios)

Dor literal, não literária!
É no coração mesmo, no real.
Começou do nada,
quase sem sentir...
Foi aumentando devagarinho,
mas sem parar um segundo.
Tomou a parte superior do peito.
Adentrou as costas.
Respiração parecia até normal...
Um incômodo.
Uma tristeza.
Um ai...
Como se fosse partir
sem ter, ainda, onde chegar.

2021

⁠Outro no lugar

Quem pôr no lugar daquela que se foi?
O que colocar no vazio formado por ausências?
Tantas histórias enterradas
e saudades reveladas no dia a dia!
O tempo ameniza as dores,
mas não substitui pessoas!
Quisera partir de mim,
quisera.
Quem ousaria me substituir?

abril/2021)

Sonhos, pensamentos e visões

Estranhos...
ou
Distópicos?

Sonhar poemas e escritas, que vão:
além-túmulos,
além camas e divãs.
Além, além, muito além!

Firmes e acabadas,
as palavras são criadas enquanto durmo,
mas fenecem ao raiar do Sol,
logo ao me acordar.

Então, matuto:
__ Para onde foram, afinal?
__ Seguem para um mundo paralelo?
__ Ou para outra dimensão de mim mesma,
... para, assim, esculpidas no sutil,
permanecerem gravadas na minh'alma?

. . . Pontos interrogam.
! Exclamações ! advogam e me perguntam (?)
, . As vírgulas e o ponto final, calados, não se expressam.
Mas, todos juntos, compõem, em surdina, vários mundos entre si!

abril/2021

⁠L.e.m.b.r.a.n.ç.a.s
Brincadeira literária com palavras e expressões pré-escolhidas

Ainda menina, corria pelas ruas, pés no chão.
Brincava muito; pulava; pedalava bicicleta com guidão alto que atrapalhava o roteiro de minhas andanças.
Quantas vezes, distraída, estatelava-me por cima de pedras e tijolos. Resultado: esfoliação dos joelhos, além da luxação de dedos e tendões.

Tudo isso acontecia em frente à casa da vovó, que dizia ter nascido longe, muito longe. Num lugar muito frio, cheio de mares e de gente feliz!
A cidade em que nasceu se chamava – e ainda se chama -, Copenhagen, dizia vovó sempre contente.
Sua especialidade na cozinha remete-me às melhores lembranças. Lembro de seu inesquecível bolo de chocolate molhado, assim chamado por seus netos.

O bolo foi adaptado com ingredientes da nova terra, dizia.
A calda que recobria o bolo era levemente picante – sua marca inconfundível, cujo segredo nunca fora revelado às suas curiosas comadres, aos parentes e vizinhos.
Quando, nas noites frias, era indagada sobre tal feito, respondia sorridente e com seu sotaque inesquecível:

__ Hej, godnat, tak (1) pur perguntar, ér u cheirrú dáo ’Dinamarrk (2) ki tragú cómiga i, sempre kipóossuû, ponha’ um pitadãñ nu cardã di chucollate’ parra trazerr meo paisse maiss prróximuû...

Para trazer sua Dinamarca mais perto ainda, e brincar com seus ouvintes, emendava umas palavras dinamarquesas, deixando-as mais longas e à moda alemã, como:

__ Speciallaegeprakisplantaegningsstabiliseringsperiode!!!

Todos riam sem entender nada e, provavelmente, naquela altura de sua vida, nem minha avó querida!

(1) Olá, boa noite, obrigada...
(2) cheiro de Dinamarca

Agosto/2022