Coleção pessoal de GERSONGOMIDE
■ MAIS QUE UMA SIMPLES PALAVRA
Sem dúvida que você já ouviu alguém se referir a alguém ou a alguma coisa, abordando suas qualidades ou atributos - louváveis ou nem tanto, colocando no final da frase ou da observação um mas, que reflete oposição, restrição, embaraço ou defeito ao que se expôs. O "mas" está presente no nosso cotidiano na lide diária de sobrevivência e convivência e nas atitudes idealistas.
As observações do comportamento, qualidades ou idealismo de determinadas pessoas, por melhores que sejam, por mais que retratem o esforço, na ocasião de alguém lhe reconhecer o merecimento, de definir atributos, o fazem acompanhando o comentário aparentemente elogioso de um "mas" marcantemente restritivo se não demolidor. Por via de costume o restritivo ou depreciativo "mas" antecede a crítica velada ou ostensiva, a diminuição do valor do que ou de quem é aludido. É o demolimento sutil.
Ao "mas" se ombreia o "porém" e o "todavia". Isoladamente se definem como partícula que liga período ou oração, mas na prática são pontos de convergência entre o elogio e a crítica ao discurso, à exposição, ao artigo escrito, à atitude, ao método de vida, aos predicados pessoais, aos atributos morais, profissionais, comportamentais... isto porque para muitos é difícil reconhecer méritos, capacidade e esforço alheios. É a busca arqueológica de deficiências alheias e ao mesmo tempo a mumificação da humildade em si próprio.
Todos os três se definem como conjunção adversativa, ou seja, traduzem variação de sentido, denotando basicamente uma oposição ou restrição ao que foi dito e observado, podendo gerar ou induzir comentários bastante desagradáveis contra os que foram envolvidos por esse sentimento de pequenez ou de inveja. Algumas vítimas de definições amoldadas na porção menor, mas de maior representatividade de seus desvalorizados comentaristas, reagem afir-mando: "A intenção não era essa...", "Quanto mais faço, mais me criticam" ou "Falem mal, mas falem de mim."
Você já ouviu muitos "mas" em suas atividades e em muitas ocasiões não apreciou as palavras que as precederam, mas, de uma forma ou de outra os digeriu. A vida é assim: Alguns constroem, outros intentam e muitos destroem, mas alguém sempre é beneficiado pelos que fazem ou pelos que tentam fazer.
Concordamos que poucos se colocam na expectativa e no merecimento de reconhecimento por seus predicados, mas nada custa reconhecê-los, custa muito mais tornar pública as limitações do invejado. Sim, tem preço elevado ser antipático, intolerante, ciumento, inconveniente, enfim. Qual o preço? A apartação, a solidão. Enganam-se os que não o fazem, que o reconhecimento às qualidades alheias pode inferiorizar quem as enaltece.
Estamos, todos, transitando por vielas ainda escuras e imperfeitas, portanto, sujeitos a queda, arranhões ou desvios e que mesmo os que têm trajetos por avenidas ou alamedas largas e flori-das, ostentam em seus mapas o percurso que demarca confusão, tumulto, desassossego, des-respeito, mas ninguém tem o direito de noticiar desatinos alheios e/ou defender os próprios.
Certa feita um Mestre em trânsito com seus discípulos, depara com um cão morto há algum tempo. Diante da repulsa e comentários desairosos dos seus seguidores à vista de tal quadro, com suavidade revela: "Que belos dentes tinha esse cão". Tais palavras, mais que um reconhecimento de um atributo, se configura como uma prece tal a ternura com que foram proferidas. Descobrir beleza em meio à podridão é peculiar aos que conhecem Deus e O identificam em tudo e todos.
A visão inútil que só enxerga defeitos não vê razão para o alvinitente lírio vicejar no brejo, esquecido de que o brejo também precisa de adornos. Nem todos os que se encontram entre personagens e em locais de nível rebaixado são afins ao meio ou aos personagens; talvez ali estejam por questão de sobrevivência – própria ou daqueles que estão à sua volta.
Pelo que ficou dito, sem pretender o grau de mestre, aconselho: Não deixe o "mas" ser frequente em seu vocabulário, simplesmente para expor ressalvas depreciativas. Exalte os pontos positivos, porque o incentivo faz parte das lições que a vida ministra.
Elogie quando o elogio pode ser um incentivo, mesmo porque de elogios você gosta, eu gosto, nos gostamos, mas poucos estão dispostos a ofertá-los...
Autor: Gérson Gomide
█ SAGRADO E PROFANO
De posse de um conhecimento meramente especulativo e segundo um conjunto de regras ou leis, precariamente estabelecido como isento de falha, erro ou defeito, o indivíduo, com simplismo ou impropriedade, atribui os atos próprios como sagrados, e os de terceiros, se não lhes agradam, como profanos. É uma prática um tanto quanto precipitada porque é costumeira a condescendência com as próprias atitudes, bem como a contundência com as do próximo.
É oportuno esclarecer que neste texto não é atribuído ao profano o caráter clerical e sim o traço distintivo daquilo ou daquele que deturpa ou viola as coisas e direitos individuais; da mesma forma, ao sagrado é conferida a qualidade peculiar daquilo que se sagrou pelo uso e costume como bom para o espírito e/ou para o intelecto. As nossas palavras não se abeiram, pois, da Teologia, do Cristianismo, da Teosofia ou do Iluminismo.
O mundo está repleto de pessoas que julgam que sua faculdade de agir e também o resultado de suas ações são invariavelmente corretos; que seus vícios não se caracterizam como tal e que todos os pontos negativos que se somam em seu currículo aconteceram por obra e culpa alheia. Para estes, a vida estabelece como direito legítimo ou mesmo suposto, que se faça uma escolha, e a preferência rotineiramente se situa entre o profano e o sagrado; entretanto, qualquer opção por um ou por outro resvala numa certeza irrevogável: escolher uma coisa é renunciar a todas as outras.
Sob ótica geral, talvez para muitos, o sagrado e o profano, não se qualifiquem como tal e tampouco como prioritários, no entanto, um ou outro pode colocar-se nos pequenos detalhes que dão consistência ao dia a dia. Assim, os que estão afeitos a atitudes impolidas, escolhem o profano porque está de acordo com o seu caráter, mesmo porque a postura descortês é aparentemente mais rentável e pouco esforço exige; sem dúvida que para estes é mais satisfatório a recusa em ser perturbado pelo mundo e pelas pessoas ao seu redor, do que ceder espaços, muito embora por várias vezes e variados motivos se decidam por perturbar tudo e todos e ocupar espaços que não lhes correspondem.
Em determinadas situações a opção apoucada tomada por alguns nanicos é movida pelo ego (ísmo ou centrismo), que reclama direito ilegítimo, forçando que outros se tornem seus ser-viçais ou que se submetam à sua vontade - deteriorada por princípio e corrompida pela prática.
Para outros, é o da apatia, o estado de prostração e moleza. Para estes, o sofá é útil frente à televisão e quase não se presta ao exercício do acolhimento e troca de ideias com os que lhes compartem o lar. Em qualquer situação, diálogo recusado é entendimento perdido. Descartar a gentileza e a prosa significa desprezo à perfeita convivência. É oportunidade posta de lado, sem considerar que esta não costuma se repetir e quando repete, o objeto para o qual converge o desejo, provavelmente já terá perdido o sabor.
Profanidade a encontramos no homúnculo que incontáveis vezes escolhe não prestar reverência às pessoas ao negar-lhes o cumprimento, a cortesia, o sorriso, o pedido de desculpas; também é profana a usurpação de espaços restritos ou especiais, não permitindo o direito aos quem têm direitos.
Os que vivem em sociedade ou em comparticipação temporária ou demorada de espaços tem o dever, como elemento integrante, de conhecer e observar os costumes da vida social. Os que se recusam agir ignorando as formalidades e procedimentos que retratam boas maneiras e respeito entre os cidadãos, devem se encaminhar urgentemente ao adestramento...
A vida é uma sequência de uniões e separações. Por opção, por imposição ou necessidade ficam para trás, às vezes sem oportunidade de despedida, pessoas, lares e empregos, cuja satisfação deles advindos seria prazeroso usufruir por longo tempo. Se levadas a sério, todas as uniões serão sagradas, porque representam a somatória ou a multiplicação de bens que engrandecem ou esclarecem os agregados; de outro lado, os reciprocamente afastados por di-vergências ou desavenças, não devem jamais assumir o caráter de profanos, ou seja, cada qual atirando para todos os lados na esperança de que o outro seja atingido.
Lao-tsé, filósofo chinês que viveu no século 4º antes de Cristo afirmava: “a bondade nas palavras cria a confiança, a bondade nos pensamentos cria a plenitude, a bondade nas doações cria o amor”. O ensinamento é oriental, mas a sua prática deveria abranger toda a humanidade. A palavra compreensiva entrelaça a amizade e não a deixa esvair-se. O pensamento sensato organiza e rege a harmonia e o equilíbrio mental. A doação é a materialização do amor. Agindo assim fugimos do profano e adentramos ao sagrado. Necessitamos falar e ouvir palavras doces para que a vida manifeste todos os valores que o profano tenta ocultar. É urgente disciplinar pensamentos e projeta-los quando o sagrado lhes dá matizes multicores. A doação é o braço direito da caridade e assume a fisionomia do sagrado, pois que é a manifestação a sobressair o amor ao próximo e a resumir o amor a Deus sobre todas as coisas.
A vida não é apenas o que nos acontece, o que fazemos acontecer ou o que se recusa acontecer. Ela é a somatória dos momentos que se arquivaram no passado, dos momentos que impulsionam o presente em busca do futuro. Mesmo que esses momentos não sejam tão bons como é o desejo que fossem.
Cabe a cada um administrar a própria felicidade ou tristeza. Alegrias e mágoas são condimentos que temperam o dia a dia às vezes sem consulta ao paladar, e sempre por questões de sobrevivência é aconselhável aceitar o tempero por mais apimentado que seja.
O filósofo alemão Friedrich Nietzche, talvez escorado pela revolta, afirmou: “Deus está mor-to”. Não sabemos com que autoridade tenha firmado esse atestado de óbito. Talvez as suas palavras retratem uma alma atolada na solidão, talvez vitimada pela indiferença e desprezo, talvez ferida em suas mais caras aspirações. Hoje nos sobra a certeza de que morto está o filósofo Friedrich e que Deus permanece vivo em bilhões de corações.
Há pouco mais de dois mil anos, um Homem veio ao mundo para pregar amor, bondade, perdão e humildade. Muitos aprenderam, outro tanto, não! Para os que se demoram aprender, o profano lhes é sagrado; para os que pela conscientização guardaram na memória e nas atitudes esses ensinamentos, o sagrado lhes é profundamente sagrado.
Autor: Gérson Gomide
█ BOM DIA
BOA TARDE
BOA NOITE
Senhoras e senhores, bom dia.
Poderia ser boa tarde ou boa noite, mas o sentido e o desejo, sem dúvida, são os mesmos.
Não é sem razão o título que preambula este texto. O gesto ou palavra de saudação sempre denota atenção para com outrem, exatamente aquela atenção que é reclamada como cortesia ou delicadeza para si próprio.
Merecemos tal distinção? Sem dúvida que sim. E os demais, também a merecem? Esta resposta está com você ou em você.
É extremamente difícil calcular o custo de um cumprimento, mas sabemos que o valor de boas e cordiais palavras é inestimável no círculo de convivência prolongada ou fugaz e, igualmente, nos rápidos encontros por onde as pessoas circulam.
Entendemos que para uma quantidade indefinida de pessoas, a prática de descer-rar os lábios e desejar bom momento a alguém exige tremendo esforço e operoso trabalho, pois que ainda se encontram longamente distanciados do comportamento gregário e que qualquer atitude que possa demonstrar sociabilidade não estão em conformidade com suas posses e alcance. É por esse motivo e razão que cruzamos com altivos senhores, senhoras e candidatos(as) a sê-los, que se julgam descendentes ou herdeiros de abastado rei, conduzindo-se de tal maneira que os observadores ironicamente concluem que o dito cujo (ou dita cuja) transporta sua majestade na proeminência externa do abdome. Não raro os envaidecidos se julgarem o próprio monarca.
Vale recordar, por oportuno, que por derivação, na extensão do sentido e regionalismo rio-grandense-do-sul, monarca é, também, a definição de um animal imponente.
Animal imponente, essa é muito boa!
Apois, denegar a saudação; deixar de cumprimentar quando deveria fazê-lo; ignorar o cumprimento e não contribuir de alguma forma para que o dia, a tarde ou a noite de alguém seja mais suave é próprio de quem pouco possui.
Aliás, no trânsito da vida, cada qual oferece o que tem, o que é, o que quer ou pode oferecer. Nada além da impossibilidade ou mesquinhez, inobstante recebam ao longo do percurso muito mais do que merecem...
Não podemos recusar a veracidade de que os ascendentes transmitem aos descendentes noções de comportamento que irão estabelecer o seu modo de viver e de conviver. Não vamos ignorar que muitos se fazem ou se desfazem por si próprios. Os filhos mal educados nas diretrizes paternas têm forte tendência em criar os seus à sua imagem e semelhança e é exatamente por isso que o edifício, a comunidade, a cidade, o Estado e o País se encontram na base do salve-se quem puder, se puder...
O básico na educação do ser humano é o sentimento que o leva a tratar outrem com digna atenção, sem invasão ou perturbação de seu espaço. Tal atitude conduz cada um, tanto em apartado como em conjunto, a reconhecer os direitos alheios. Este é o constitutivo que imprime característica essencial de convivência e respeito.
Para bom entendedor meia palavra basta; para quem sabe se expressar meia palavra não existe; para os que se recusam ouvir ou falar, a solidão é o epílogo de uma vida que não teve bom princípio e tampouco agradável seguimento. Uma vida que jamais possuiu o charme do sorriso ofertado e recebido.
Nem sempre o espelho reflete a imagem real de quem se posta à sua frente; a ação e omissão, sim!
Empós de tudo quanto dito está, só resta a saudação final, que copia à sua maneira a saudação inicial:
Bom dia, senhoras e senhores.
Autor: Gérson Gomide