Coleção pessoal de Froesingrid
Não há quem não feche os olhos ao cantar a música favorita.
Não há quem não feche os olhos ao beijar, não há quem não feche os olhos ao abraçar.
Fechamos os olhos para garantir a memória da memória.
É ali que a vida entra e perdura, naquela escuridão mínima, no avesso das pálpebras.
Concentramo-nos para segurar a dispersão, para segurar a barca ao calor do remo.
O rosto é uma estrutura perfeita do silêncio. Os cílios se mexem como pedais da memória.
Experimenta-se uma vez mais aquilo que não era possível.
Viver é boiar, recordar é nadar.
O ENGENHEIRO E O GARI
Era uma linda manhã de feriado no Rio de Janeiro, o sol estava lindo. Duas pessoas, duas vidas, dois mundos tão distantes se cruzam no mesmo caminho.
Um engenheiro Eduardo Marinho de Albuquerque, morador da área nobre da cidade, o outro um gari comunitário Ronaldo Severino da Silva, da comunidade da Rocinha.
Mas, agora nada importa. Origem, cor da pele, classe social, dinheiro guardado, onde mora... pra onde eles vão nada disso é importante, pois naquela ciclovia a morte os encontrará.
Ela chegará bela e ao mesmo tempo assustadora. Virá em forma de uma gigantesca onda, com a missão de acabar pra sempre com todas as diferenças, que até então existiam, entre o engenheiro e o gari.
Quando ela chega é assim, não importa quem você seja, o que tenha ou o quanto a vida te festejou ou te humilhou, ela mostrará para o engenheiro e o para o gari, que no final somos todos iguais - humanos, frágeis, à mercê das ondas da vida.
Tomara que o engenheiro e o gari tenham encontrado Jesus nas ciclovias da vida, pois assim eles saberão, que não correram em vão.
SOU GARI
Sou Gari,
Sou catador de lixo
E me tratam como bicho
Quando quero trabalhar
Não bastasse ainda o sacrifício
De acompanhar de perto o disperdício
De tudo aquilo que ainda dá pra aproveitar
Menosprezam meu serviço
Mas ainda sinto orgulho do meu ofício
Pois dele meu sustento posso tirar
Ainda assim o meu dinheiro
Não me paga o reconhecimento
Que eu deveria ganhar
Pois não apenas varro ruas e calçadas
E nem somente recolho o lixo das estradas
Que você insiste em sujar
Minha ação vai mais além
Pois mesmo sendo um "ninguém"
Da sua saúde ajudo a cuidar
Mesmo assim não sou doutor
Mas faço tudo com amor
Para que doenças não possam se alastrar
Dê valor ao meu trabalho
Suo a camisa sem horário
Para tudo organizar
E mesmo que você não veja
Eu sou aquele na peleja
Para uma cidade limpa te entregar
(mantenha ela assim)
Mulher, criação mágica de Deus.
Retrato fiel do encanto e sedução;
Espelho de intuição e sabedoria;
Estampa fina, forte e sutil;
Amostra de delicadeza e fibra;
Exposição da beleza e do amor.
Parabéns a todas as mulheres!
Esperança
Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano
Vive uma louca chamada Esperança
E ela pensa que quando todas as sirenas
Todas as buzinas
Todos os reco-recos tocarem
Atira-se
E
— ó delicioso voo!
Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada,
Outra vez criança...
E em torno dela indagará o povo:
— Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?
E ela lhes dirá
(É preciso dizer-lhes tudo de novo!)
Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:
— O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA...
Se você tem um sonho, lute por ele, mesmo que todos te chamem de louco, sonhador e tentem te impedir de realizá-lo. Afinal, o sonho é teu, e o único que deve acreditar nele é você.
Quando uma criatura humana desperta para um grande sonho e sobre ele lança toda a força de sua alma, todo o universo conspira a seu favor.
O que é? O que é?
Uma coisa que só no Brasil se faz?
Quem pensou em samba, não é
Nem futebol, nem café…
Responda-me quem for capaz
Agora vou dar uma resposta sagaz
Ora, o que só no Brasil se faz
É claro que são os brasileiros
Pois em nenhum lugar do estrangeiro
Mesmo com muito dinheiro
Um brasileiro se faz
Mas como se faz um brasileiro?
Mais uma pergunta tenaz
Alguém tem alguma receita
Ou uma vaga suspeita de, enfim, como se faz?
Vou tentar dar o meu pitaco:
Cuíca, sanfona, cavaco
Um pouco de balacobaco
Inda assim não se faz
É preciso misturar as cores:
Branco, preto, amarelo
Todo tipo de cabelo
E uma teimosia pertinaz
Mesmo assim um brasileiro
Não é só assim que se faz
Tem que ter algo além
Um pouco de pimenta cai bem
Ou um tempero mais audaz
Um “mexe- mexe” demais
Aí não tem pra ninguém
Boa dose de alegria, bom humor, simpatia
Mas, todavia, porém
Inda assim não se faz
Creio que pra se fazer um brasileiro
O verdadeiro, daqueles que só no Brasil se faz
Nem precisa ser cozinheiro
É só misturar o mundo inteiro
Numa grande receita de paz
Meu coração é vagabundo
Samba na ponta do pé
Se envolve com todo mundo
Fica fora só quem quer
Mas você benzin
É o meu denguin
E quando chega a noite
Eu só quero te ver
MEU CARNAVAL É VOCÊ!
Neste carnaval
minha escola de samba será você!
Vou te fantasiar na minha pele
e nossa ala se chamará Prazer!
E na grande avenida
nosso carro alegórico será um grande coração!
Todo o público de pé
cantará nosso refrão!
Dos nossos corpos suados
rastros de amor ficarão pelo chão.
A cor da nossa escola será vermelha
pra representar nossa paixão!
A grandiosa bateria
tomada de comoção,
tocará com maestria
o tum-tum-tum do coração!
Chegado o momento
de encerrarmos o carnaval
ficará em nossos corpos
um desejo sem igual!
E certos de que o amor
contagiou toda avenida
por anos a fio ouviremos:
-Foi a escola mais bonita!
Assim como é de cedo que se torce o pepino, também é trabalhando a criança que se consegue boa safra de adultos.
A natureza criou o tapete sem fim que recobre a terra. Dentro da pelagem deste tapete vivem todos os animais respeitosamente. Nenhum o estraga, nenhum o rói, exceto o homem.