Coleção pessoal de FPBahia
Viagem (Walmir Palma)
Já não me estresso com o ruído de um motor
Se aumentam o volume do televisor
Se enquanto eu canto você conta
Se deito e você se levanta
Já não me espanta qualquer filme de terror
Enquanto leio pensamentos de Foucault
Você enterra os olhos no computador
Essa canção se espalha pelas ruas
Entre os que buscam no clarão das luas
Outra maneira de curar tamanha dor
Eu plantei meus fícus
Escrevi meu livro
Eu já tenho um filho, meu amor
Tudo é passagem
Fiz minha viagem
Eu vindo e na volta eu vou
Já não me irrita uma canção que é só tambor
Se em vez de abajur preferem refletor
Ou vendem ilusões de luz neon
Se poucos leem o Drummond
Se a tolice insiste liga o reator
Nem o silêncio dos gurus adiantou
A natureza está mostrando o seu tumor
Quando ela grita eclodem seus vulcões
Seu choro inunda civilizações
Não tem senhor, não há remédio seu doutor
Vejo cataclismos
Rescindirem sismos
Quanta indiferença meu amor
Sobra incompetência
Tanta imprudência
O poder não tem nenhum pudor
Inverno (Walmir Rocha Palma)
Música clara, clara
As gotas d´água
Batem na louça
Ouça
Esse delírio sou eu
A casa é velha, velha
Pingos de chuva
Soam nas telhas
Veja
Chamas de velas e breu
Música tanto e tanta
A casa espanta
O mais é tinta
Sinta
Hoje a manhã não nasceu!
Obs.:Este poema foi musicado por Rosa Passos.
Calmaria (Walmir Palma)
Pouco de céu
Quase de sol
Pouco de ventania
Quase de dor
Pouco de mar
Quase que nasce o dia
Meio você
Meio verão
Meio minha cantiga
Pouco de mim
Meio você
Quase de calmaria
Primavera (Walmir Rocha Palma)
Um rouxinol acorda os outros passarinhos
Como um maestro, ele conduz o seu coral
Pintor de todas as manhãs, o sol morninho
Seduz as flores com seu beijo matinal
Olho que vê tamanho encanto da janela
Não sei se meu ou se o de Deus está em mim
Estou setembro, vinte e um, é primavera!
Meu coração amanheceu feito jardim
Num alegreto inusitado, as borboletas
Vão espalhando grãos de pólen a granel
A terra fértil, mãe feliz, e tudo aceita
Há comunhão nesta estação, entre ela e o céu
Fascínio assim, de flores, já não há quem pinte
Só mesmo o traço inconfundível de Monet
Ou o delírio extasiado de Stravinsky
Para com sons a primavera conceber
Mas que mulher exuberante, a primavera
Ela é a prima mais querida do verão
E embora o outono morra de paixões por ela
É o inverno que ela traz no coração
Obs.: Este poema foi musicado por Rosa Passos.
Roça
A terra flora! Felicidade!
Choveu na roça! Adeus cidade.
Eu vou-me embora. Eu já vou tarde!
Eu vou agora. Bateu saudade!
Vou pegar trilha, vou tomar banho de rio,
A vida pede pra gente ficar por lá!
A natureza todo o dia está no cio.
Tempo no mato não tem pressa de passar!
Mas como é bom ouvir bom dia todo dia,
Sentir as mão e semear, plantar, colher...
Dormir ao som de uma viola caipira,
Pisar o barro, dar aos pés o dom de ter!
Adeus cidade! Eu vou- me embora!
Eu já vou tarde. Eu vou agora!
Choveu na roça! Felicidade!
A terra flora. Bateu saudade!
Quero o silêncio das manhãs de passarinhos,
Ouvir as folhas, respirar a plantação!
Viver de novo a eternidade de um carinho
Que o meu amor me dá de todo o coração!
Até parece que se volta a ser menino,
A gente lembra que é feliz e ri à toa!
Luar na roça é uma bênção do divino!
Viver na roça! Ai! Meu Deus, que vida boa!
Choveu na roça! Felicidade!
Eu vou-me embora. Adeus cidade!
Eu vou agora. Eu já vou tarde!
A terra flora! Bateu saudade!
ONDE (Walmir Palma)
Inda que a gente não queira
Há o abismo
A vida gira em sua beira
Quando se quer ser profundo
Risco corre quem deseja
E quem não corre
Se reprime a vida inteira
Trancado em seu próprio mundo
Por isso é que existe o "OU"
Nos mares da vida vou mais longe
Há uma maré que é baixa
Mas é no fundo do oceano
Que se acha
Guardado o seu conteúdo
Sei que que a vida breve passa
Para viver cada segundo
Apenas basta sentido para o mergulho
Nos ares da vida voo
Quem fica não é e eu sou meu ONDE
Adeus, cidade! Eu vou-me embora!
Eu já vou tarde. Eu vou agora!
Choveu na roça! Felicidade!
A terra flora. Bateu saudade!
Mas como é bom ouvir bom-dia todo dia,
Sentir as mão e semear, plantar, colher...
Dormir ao som de uma viola caipira,
Pisar o barro, dar aos pés o dom de ter!