Coleção pessoal de Fabio02
As prosas, moça, tinham qualquer coisa de rosas desabrochando instantâneas do chão, também água jorrando, brotando, alagando, descendo das encostas, transformando-se em cascatas, caindo, depois se infiltrando, virando rio subterrâneo, lençol freático, lembrança guardada, saudade acumulada, pro outro dia voltar ou virar nuvem ao sabor do vento, chovendo a qualquer momento sem anunciação. Falávamos de Pessoas, Fernando Pessoa, livros, novela das nove, política, pizza, bolo, dor de cabeça, dedo desmentido, unha encravada, as aves do paraíso, tigres de bengala, Deus, a via lacta... Tudo virava assunto, era motivação. Até na falta de assunto nos entendíamos. Textos, pretextos não faltavam razão. Era a perfeita adequação, como que combinado, roteiro escrito, mas não, era tudo improviso, criação. As horas se sucediam e o tempo nem percebia, ficava assistindo, quieto, se distraindo com a gente, participando e esquecendo-se de passar, não indo, fluindo. Dando um tempo, parando, de vez quanto, virando quase fotografia. Era um acontecimento! Tarde era sempre ainda muito cedo, nos despedíamos com vontade de não irmos.
São os médicos que apressam o tempo na longa espera das consultas, a que ansiosos, preocupado, aguardamos, a contar nos dedos, a angustiante demora. O do dia do pagamento, também, urgente, que não vemos a hora de receber pra ter um folegosinho a mais, uma alegriazinha fugaz. Quando vê, já estamos no finalzinho de março. Daqui a pouco meio do ano, e nos surpreendemos, "como o tempo passa rápido!". Que nada! Senta numa cadeira a manha inteira, feito no tempo dos castigos da época de menino, sem TV, hoje seria sem celular e vê como demora. Se bem que tem gente que muda tudo de uma hora pra outra num ângulo de 360°, mas não é o comum do agir, reagir. Falando em tempo de criança, vivíamos sem estresse, sem essa seriedade toda, naquela santa leseira, inocência, sem sabermos da vida o preço.
Chegar aos 80, 90, 100 anos é uma conquista, um premio sobre os vícios, a base de muito exercício, dietas, noites bem dormidas, avesso a noitadas. Mas, ouvi dizer, que o que muito incomoda, por outro lado, nessa altura da vida, aos chegados, é se arrependerem do que não fizeram, agora impossibilitados, de algumas coisas, inclusive, que se fizessem, ao longo de suas vidas regradas, talvez não tivessem alcançado tal longevidade.
Detesto múmias ambulantes, com cara de todo dia, sem energia, nem de luz de vela. Gente velha desde que nasceu, que parece que nem comeu. Azeda, comum, mofada. Que não se indigna com nada. Aquela leseira ambulante, constante. feito barco a deriva, folha levada pelo vento, pelos acontecimentos. Consumidora de oxigênio, ocupadora de espaço. Que vai embora e ninguém percebe, chega e ninguém nota, não se excede, não esquenta a cadeira, pela metade, nem ao menos. Gente que só muda de cara, corpo, endereço. Roupa que em qualquer um caberia, tamanho único, chave mestra. Que não improvisa, não inventa, só representa, passa pelos dias.
Deus pede pra não matar em um dos seus mandamentos, é claro, só Deus pode desfazer o que ele fez, dispor, criou, é muito atrevimento, só ele tem o direito de destruir o que construiu. Pede até pra perdoar, orar por nossos inimigos, não desejar mal, nem em pensamento, assim não terá perdoado de fato, não valera nada, a vingança pertence a ele. Muitos dizem que entregam a Deus, da boca pra fora, só depois que o medico, o advogado falha, enquanto isso deixam em segundo plano, no máximo um plano B, ultima alternativa. Outros depois de achar que alguém ter-lhe um feito mal, se achando assim com Deus, o que acontecer com esse infeliz pelo resto da vida, dirá: "Tá me pagando, Deus é justo". Topada, "Tá me pagando", Tiro: "Tá me pagando", pisou na lama: "Tá me pagando", resfriou "Tá me pagando" Muitos anos depois ainda, "Olha... Que fez comigo lá trás... Deus é justo, tá me pagando!" Divida da moléstia é essa que não acaba, acontece adversidades com todo mundo, mas com ele é coisa pessoal, bem carinho, hein?
Nesse mundo de desconfiados e "desconfiômetros", de irônicos, de descrentes de tudo e todos, da humanidade como um todo. Reconfortante é encontrar alguém em que acreditar, é ter um elo de confiança, sentir-se seguro, tranquilo, transparente. Quando há tantos relacionamentos superficiais, formais, padronizados, tipo atendente de loja, supermercado, sorrindo somente para agradar ao cliente, e por dentro tolerando-os, não vendo a hora que o expediente acabe, termine toda essa farsa, de fechar a cara, retirar a mascara, e voltar a usar a cara de sempre como se tivesse ninguém na sua frente. Bom é sentir-se a vontade com um igual, gente de verdade, não um estereotipo, um poço de egoísmo, indiferença e má vontade. Gente que fale a mesma língua, que esteja presente, que some, que faça a diferença, que mostre que nem todo mundo é igual, que nem tudo tá perdido, que em meio a cacos de vidros, pode-se encontrar, ainda, diamantes, exuberantes, raros, difíceis de encontra-los. Por uma joia de gente assim, que não tem preço, criamos apreço. - Fábio Murilo.
Pessoas sofridas são mais interessantes, tem antes, durante e depois. São sumarentas, tem um tudo, conteúdo, historias de superações. Pessoas sofridas tem sangue nas veias, tem fibra, garra, suas vidas sofridas encantam tanto, sensibilizam, nos identificamos, são nós mesmos repaginados, melhorados. Tem historias pra contar, somar, nós inspirar. Nunca motonas, terminadas, definitivas, tediosas, feito um quadro empoeirado, uma foto amarelada que nunca se modifica e por isso cansa.
Há uma diferença em ter fé e acreditar no meu entender, senão seriam uma só palavra. Há quem acredite em signos, em disco-voador, na sua intuição, até em sorte. E não é necessariamente ter uma religião, quer dizer, que você terá mais fé que os outros. Pedro tinha menos fé que o centurião romano que crucificou Cristo, que foi pedir antes pela intersecção de um simples servo, que no entanto gostava feito um filho, e disse, constrangido, não ser merecedor que fosse a sua casa, mas, que bastasse uma só palavra e ele seria salvo. Salvou, sua fé o salvou. Ter fé é dar um tiro no escuro, pagar pra ver.
E essa calma impressionante... Vai ver que é isso que chamam de fé na pratica, manter a calma, esperar, apesar de... E os entendidos, homens de ciência, que tentam explicar tudo e só repetem, reafirmam o que já foi dito, chamam modernamente de inteligência emocional, resiliência.
Não adianta forçar a barra, pessoas são destinadas ou não. Está escrito, prescrito, associado, combinado. O que tiver se ser, será. Ira acontecer ou desacontecer ou vir a acontecer mais tarde, se encontrar, permanecer ou passar.
Nem todo mundo a gente tem encantamento, sente afeição, será único. Nem todo assunto vira debate, fluirá, virará discussão. Nem toda conversa interessa, nos eleva, inspira, prende, lembraremos depois. Nem tudo que chega se tornará permanente, criará raízes, irá além na superfície, passará do chão. Nem toda chuva é fértil a ponto de florescer um deserto, nem tudo que chega será mais que um instante, nem toda aproximação conquista, se torna afeição, cairá na mão feito uma luva. Nem qualquer uma será musa.
Afinidade pode haver entre pais e filhos ou não, entre irmãos ou não, entre amigos, ou não. Não é questão de proximidade, mesmo de sangue, querer. Não obedece regras, de como deveria ter sido, assim que deve ser. Não tem logica, não se mensura, nem se mede, não obedece a vontade, é uma coisa de simpatia mesmo, empatia, de ir com a cara, combinar, sintonizar com o outro, ser sua continuação, extensão, onde um começa o outro termina. Afinidade é incondicional, é rima, é de quem se afina.
Contigo peguei o costume de escrever sorrindo, mesmo se não estiver me referindo a coisas não tão legais. E usar bichinhos entremeando os diálogos, feito um menino grande.
O amor comumente é, renuncia, é adequação, é assimilação, é resignação. Só na paixão o amor encontra sua maior amplitude, viço, cor, razão, ápice, amor com paixão. Um rio a fluir naturalmente, a cair espetacularmente, nas cachoeira sem entraves, sem represas, nem certezas.
Ah essa mania de falar sorrindo que eu adquiri de você, esse chiste, esse vicio lindo, esse grito, sem querer, de resistência, essa ciência sem saber que você tem de crer que tudo vai dar certo. Calejada das dores que tira de letra, embora doa, roa por dentro, mas, sempre encontra um alento, um momento pra respirar, pegar fôlego, feito um peixinho na imensidão do mar, um jogo de cintura tipo o do ratinho Jerry com o Tom, onde o ratinho sempre dá um jeito de se safar. Briga de formiguinha a cavar na parede entre os tijolos, uma saída, Igual Davi enfrentando o gigante Golias, apesar do tamanho desigual.
Ontem eu me lembrei de uma ocasião referente a data de hoje, dia das mães. Minha mãe, agora falecida, costumava dar a ela, nesse periodo, um corte de tecido, pra fazer roupa ou um sapato, mais corte de tecido, roupa sempre se precisa. Um dia resolvi fazer diferente, em vez de dar o mesmo de todo ano dar o dinheiro para ela comprar o que quisesse, 300 reais, lembro bem, pode parecer pouco, mas, na época, valia mais. Quer dizer o ideal é dar o presente bonitinho, embrulhadinho num papel vistoso, com um laço de fita, fazer uma surpresa, essas coisas de praxe, mas... Tava muito repetitivo, como disse. Tempos depois, um belo dia, passando na casa dela, reparei num quadro grande, na segunda sala, representando a santa ceia, parecia diferente, curioso, passei os dedos e pra minha surpresa, era original. Oh!Original! Que chique! Que novidade é essa? Onde teria conseguindo, deve ter custado uma nota, afinal era original, não uma copia igual tantas outras, vendidas nas portas por prestanistas, era único. Perguntei quem tinha dado ou onde havia conseguido. Ela disse: " - Comprei no Shopping Recife, com aquele dinheiro que me deu. Já tinha visto antes numa ocasião, mas, não pedi a ninguém". Shopping Center Recife, um shopping daqui, da zona sul, bairro de rico. Poxa, nunca imaginei que minha mãe, pelo menos, nesse caso especifico, gostasse, apreciasse pinturas, arte. Pois é, gosto é uma coisa muito pessoal, surpreendente, por vezes.
Não há mudança de mês, de ano, só na nossas cabeças, o tempo não muda, é um só, quem muda é a gente. Todo dia é igual ao outro, o sol nasce e se põe, gente chega e se vai. Nós que podemos fazer a diferença, "a vida se muda até num segundo". O que passou, não podemos mais mudar, mas podemos mudar o que vem adiante, no próximo minuto, segundo. o tempo é quando, é agora, é a hora. Como diz a antiga canção: "Vem vamos embora que esperar não é saber, quem sabe faz a hora não espera acontecer"