Coleção pessoal de DanielaMattos
Cegueira( memórias da pandemia no Brasil/2020 e 2021).
Eram muitos infectados.
Outros desempregados e a mercê da própria sorte, morreram de fome... Outros, enlouqueceram.
E...Tantos outros, foram abduzidos pela cegueira.
E talvez, por não enxergarem continuavam impregnados de vaidade... Pareciam imortais a navegar num rio de lágrimas.
Os pais enterraram filhos e filhos assistiram o riso de seus pais ser sufocado, sem ar, no silêncio do descaso e da exaustão. A palavra "luto" foi o cartão de visitas de milhares.
Receitas caseiras burlavam a ciência.
As redes sociais serviram de autorretrato das mentes doentias e cristalizadas.
A cegueira foi mais feroz que o vírus, pois sequer enxergavam as máscaras recomendadas para evitar a contaminação do mesmo.
As aglomerações bailavam entre as covas rasas. Eram milhares. Milhares de covas.
O medo rondava os conscientes e lúcidos, que se transformavam, gradativamente, em cruzes e ausências.
-Salvaram-se muitos?
-Não sei.
-Desaprendi contar.
Serena Manhã
Serena manhã dos orvalhos perdidos
Dos silêncios em abraços distanciados
Teus sinais marcaram meus dias e tempos
Trouxeram-se afeto e aprendizado.
O incerto tomou-me em dias a fio
O medo corou anoiteceres adentro
Mas foi nos dias de flores tardias
Que entendi teus sinais de ternos segredos.
Serena manhã das melancolias
Da falta de abraços, carinho e abrigo
Chorei junto a ti, em dias tristonhos
Alegrei-me em teu colo
Nos dias de frio.
Serena manhã, ventre dos nasceres
Que em ternura anuncias à tua chegada
Mesmo em dias turvos e cinzas
Afagas minha face, para outra jornada.
Serena manhã dos dias reclusos
Em que o sol da janela esqueceu de chegar
Enxugas minhas lágrimas em força e coragem
Trazendo esperança para meu caminhar.
Serena manhã dos anúncios tardios,
Abres as frestas para meu olhar
Mesmo nos meses de longa espera
Renasces em sonhos para minha alma afagar.
Serena manhã das lonjuras inquietas
Que em segredos insistem em continuar
Brotas em flores, enfeitando meus dias
Bordando meus medos, num esperançar.
Serena manhã das vozes perdidas
Das canções silenciadas que insistem em cantar
Teu orvalho acalma e acarinha meu ser
Num embalo suave, feito canção de ninar.
Serena manhã és vida sentida
Num convite me animas para despertar
E mesmo depois dos desassossegos
Alegro-me em ti para continuar.
"Meu ser docente foi constituído nas entranhas da sala de aula, entre dias lindos e doídos... Mas todos, visceralmente vividos."