Coleção pessoal de ClarissaMelo
É estranho começar a falar de mim em uma narrativa em que eu sou o centro, mas que quase não apareço. Ficarei encostada, no canto, cruzando os dedos para que as palavras escorreguem mais devagar, que possam aparecer somente em seu tempo certo. Evitar pequenas fugas de idéias é prioridade, não se pode adiantar o fim, assim como não se pode adiantar a morte. Opa! Viu aí? Já falei demais…
Devo ser um palhaço de nariz vermelho. Que todos vejam, portanto, o que já sabiam os deuses. Sou um palhaço de roupa colorida e sorriso largo. Não se engane, porém. O sorriso é feito de tinta guache. Com data e hora para ser retirado do rosto - e tão fácil isso é! Joga-se apenas água e… e acabou. Paradoxalmente, acima das bochechas, impecavelmente pintada, existe uma lágrima de cor preta a escorregar. Ela também é feita de tinta guache, só que não sai com água.
Revive, menina, teus segredos e virtudes. Tuas vidas e teus medos. Não se desespere a cada gota de chuva, revive, apenas. Olha pros lados e olhe pra dentro. Vê se acima da chuva há um céu, consegue ver o céu? A chuva vem de lá... Doce e carente, lavar teu juízo. Não agonize abaixo da chuva, beba-a e seja ela própria. Por que se chove há raízes que precisam ser regadas com amor. Chover é amor. E teu choro é chuva que vem do coração, e se vem do coração... Ah, menina, se vem de lá, coisas boas é que precisam ser regadas. Regue-as com amor, e quando toda a chuva cessar, sorria. E colha as coisas boas que se plantou.
Foi então, leitor, que eu descobri que a simbologia desse texto - de tão complexa, é capaz de se tornar anônima - sempre gritou agudo (de voz veluda, valente voz): O brilho não é para quem pode, é de quem quer.
Embora o mundo já esteja cheio de gente reclamona, é disso que ele menos precisa: uma legião de reclamões.
Conserteza
qui issu di disdizer
u que tá erradu na gramatica
é cois di genti chifrin.
purque se eu falar certin
e não diser
o qui si tem pra dizer,
as criança vão passandu fomi.
Caus' di que,
enquantu tentam corrigir a palavra
lá no meio do sertão
tem gente que tenta corrigir
a falta d'água
e de pão.
Deixei
meus pés intactos
duros,
presos no chão.
Deixei
de viver minha vida
por sentir medo da rima
que trazia minha razão.