Coleção pessoal de CarlaGP
"O demônio odeia com desprezo os que faz cair; e odeia com inveja os que resistem aos seus ataques. Isto porque é próprio do soberbo desprezar os fracos e invejar os fortes. Trata-se, pois, de duas modulações do ódio — facilmente identificáveis nas pessoas orgulhosas com que deparamos ao longo da vida.
O procedimento habitual do soberbo para com os fortes é a hipocrisia; para com os fracos, a tirania. Este é um estado de agonia perene, quer nas vitórias, quer nas derrotas. Quando o soberbo vence um confronto, perde porque a vitória não alivia a voragem que o consome espiritual e moralmente; quando perde, perde duas vezes porque a derrota humilha-o".
"Santa paciência não é supina estupidez.
A paciência é a virtude moral auxiliar da virtude cardeal da fortaleza. Seu papel é o de manter o bem da razão no meio da tristeza e do sofrimento. Não erra, pois, quem imagina que o impaciente é ordinariamente derrotado pela tristeza.
Uma pessoa exerce a paciência sobretudo com os que lhe são próximos: familiares, amigos e colegas de trabalho.
Este sofrer virtuoso, que é a paciência, não implica fechar os olhos com relação a falhas mais ou menos graves de outrem. Afinal, paciência não é sinônimo de fraqueza nem de embotamento mental.
Ser paciente não é estabelecer relações de permissividade com manipuladores, vigaristas e susceptíveis.
Até os santos impõem limites aos pecadores quando estes exorbitam em matéria grave".
"Todo escrupuloso é um murmurador que projeta nas outras pessoas o falso pudor que o acossa interiormente de maneira agônica".
"Para muitas pessoas, a única excelência tolerável é a que se amolda aos perímetros de sua própria covardia. Quem lhes oferecer mais do que simples bagatelas receberá como moeda de troca o peculiar ódio que os medíocres nutrem por seus benfeitores.
Um ódio disfarçado sob mil justificativas nobilitantes".
"A impunidade afoga o criminoso em sua própria maldade. Nesse estado, não lhe resta outra coisa senão fazer da mentira um modo de vida, para autojustificar-se.
É a prefiguração do inferno".
"Cedo ou tarde, chega o momento em que o homem é compelido a dar testemunho – perante a sua própria consciência – da generosidade ou da ingratidão dos seus atos.
Os teólogos chamam esta hora tremenda, repleta de dolorosas luzes, em que nenhuma neurose pode servir de refúgio para quem se habituou ao auto-engano, de 'dia do juízo particular'".
"Quando a saúde fragiliza-se os problemas mundanos relativizam-se, estando o intelecto mais livre para hierarquizar a realidade e voltar-se às coisas que realmente importam, dando a cada uma o seu real peso e valor.
"Vanitas vanitatum et omnia vanitas", diz o Eclesiastes.
Esta máxima não pode ser compreendida em sua dimensão espiritual por quem está engolfado nas coisas do mundo, por quem tem o coração turbado com relação ao presente, porque a vontade oscila demasiado em suas intenções, e inquieto com relação ao futuro, porque a imaginação vagueia na concepção de possibilidades sem fim.
A vontade de quem sofreu pouco – ou sofreu mal, por doentia incapacidade de resignar-se – ainda não foi provada, e até que o seja será impossível aquilatar se é forte e magnânima ou fraca e pusilânime.
Quem padece de uma doença crônica relativamente grave sempre encontra ocasiões para triturar as vontadezinhas medíocres, as veleidades, os pensamentos inócuos, como também para curar-se de medos infundados e aspirações sem sentido. Alguns perdem esta chance preciosa e caminham para o extremo oposto: em vez de se libertarem de suas próprias limitações, purgando-se na dor, tornam-se escravos delas, ao mantê-las em meio à busca de placebos irrazoáveis mitigadores do sofrimento.
O sofrimento ou purifica o homem, para que ame, ou o atiça, para que odeie".
"Diálogo não é um monólogo de várias bocas que se reúnem em grupo para falar, cada qual, ao vento ou ao próprio umbigo".
""As trevas terminam quando irrompe a aurora com suas luzes tênues, que aos poucos vão dando lugar a outras – mais fortes. Assim também ocorre com os tempos sombrios, incapazes de perdurar indefinidamente. Chega o momento em que a dissolução por eles provocada esgota-se, e então é preciso recomeçar o trabalho, árduo porém gratificante, de edificação espiritual, intelectual e moral.
A restauração da ordem política vem depois, porque a política não é a causa de si mesma nem um fim em si mesmo.
O tempo presente é de densa treva, mas a hora de sua derrocada aproxima-se, pois a maldade tem pressa e é estúpida em sua autoconfiança, até autodestruir-se".