Coleção pessoal de CarlaGP
"É tolice querer enganar a tristeza com pequenas distrações ou fingir que ela simplesmente não existe, escondê-la, varrê-la para debaixo de um tapete inexistente. Quem assim procede armazena-a nalgum recanto d'alma onde continua viva em segredo, pronta a dar notícia de si mesma de uma hora para outra.
A tristeza escondida é uma tensão que se vai acumulando e logo afeta física e psiquicamente a pessoa, prostra-a. Conforme o tempo passa, quem a padece passa a não mais identificar onde tudo começou, e muitas vezes atribui-lhe causas irreais, o que agrava deveras a situação, porque então a amargura se soma à tristeza.
Triste e armargurada, se não tomar cuidado a pessoa corre o risco de deixar crescer outro mal secreto em seu coração: um sentimento de vingança contra eventuais pessoas que a desagradaram por qualquer coisa, assim como um ressentimento contra gente genuinamente alegre, sem mais nem menos. Sim, quem tenta enganar a própria tristeza planta na alma uma semente de crueldade e indiferença, sem o saber.
Há certas paixões que não podem ser combatidas com placebos nem com autoenganos pontuais, pois cedo ou tarde a realidade se impõe, e com um peso proporcional ao tempo em que a pessoa mentiu para si mesma, seja por que motivo for.
Chorar, rezar e buscar a companhia de verdadeiros amigos são atitudes bem melhores do que fugir à dor, pelo seguinte motivo: a balança das dores e prazeres não é como a da justiça, pois quando pende para um dos lados geralmente arrebenta.
Outro procedimento razoável é meditar a respeito do que suscitou a tristeza, pois sabemos que há tristezas sumamente injustas.
Por fim, quem crê verdadeiramente em Deus pode – e deve – pedir-Lhe luzes, discernimento.
Só é capaz de ser alegre quem sabe ser triste, quando a situação exige.
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Algumas personalidades instagrâmicas ilustram bem isto: são cruéis na exata medida da sua falsa alegria".
"Uma definição filosófica vale mais pelos horizontes de vida que abre do que pelos limites que estatui".
"Aconselhar a quem escolheu o desespero em situações de crise é o mesmo que explicar a um javali o Teorema de Pitágoras".
"Cedo ou tarde, o libertário se faz libertino para justificar sua adesão integral à ideologia que faz da liberdade um ídolo".
"Em qualquer época, os pseudomestres sofistas têm o condão de seduzir os jovens, induzindo-os a crer demasiado em suas próprias forças e talentos. São corruptores da Pólis na mais genuína acepção do termo, pois prometem o impossível – com autopropaganda enganosa, na qual são exímios.
Vendem pescadinha estragada como se fora salmão fresco.
A bela lição que Sócrates dá ao sofista Trasímaco, no Livro I da "República", é algo válido para todos os tempos".
"O que é conhecer? Esta pergunta aparentemente simplória abarca intrincados problemas filosóficos ante os quais grandes pensadores, ao longo da história humana, acabaram por cair em aporias, ou seja, em engrenagens dialéticas a partir das quais nenhuma resposta pode ser satisfatória.
Com exceções não identificáveis percentualmente, as pessoas que nesta pós-modernidade se dizem a favor da ciência – querendo com isto demarcar uma posição política, ou que elas imaginam ser política – não têm a menor idéia do que seja a ciência, e de como esta caminha no compasso da resolução de problemas que não se restringem a experimentos de laboratório, pois pertencem a um grau de abstração da matéria que está acima inclusive do alcançado pelas matemáticas.
Qual é a diferença entre meio e modo de conhecer? O que é propriamente interpretar um dado da realidade? E mais: o que é a realidade? O que é ser e qual é a relação entre ser e conhecer? Qual o estatuto epistêmico da certeza em ciências que lidam com graus de indeterminabilidade radicados na matéria enquanto potência para assumir novas formas?
Trata-se de rãs saltitantes no brejo do comodismo. Que comodismo? O de aderir, com afetação de certeza, a narrativas que se amoldam à sua ignorância. Daí a facilidade com que respondem, por reflexo condicionado, a frases feitas ou palavras de ordem que lhes dão uma vertigem que não é a do êxtase do sábio perante sublimes verdades descobertas, mas a do doidão que fumou algo capaz de o conduzir ao Monte Everest da ebriedade.
Dizia Santo Tomás que Deus não conhece as coisas nelas mesmas ("in se ipsis") mas em Si mesmo ("in se ipso"), como causa suprema de todas elas. Essas criaturas agem como se fossem o próprio Deus, pois suas certezas não dependem do ser das coisas. Se investigarmos, veremos que, em muitos casos, dependem do noticiário; ou do que lhes dita a imaginação dominada pelo medo; ou da paixão política que feriu de morte suas inteligências.
Enfim, uma coisa é a pessoa tomar partido de acordo com os critérios – certos ou errados – que a consciência lhe subministra. Outra coisa é decidir por acreditar ser a favor da ciência, e ainda encher a boca para dizer-se tal".
"A gratidão não é feita de atos isolados que afloram de acordo com circunstâncias, sejam estas quais forem. É hábito d'alma, impossível de adquirir por quem não tenha a compreensão prévia de que os merecimentos são, e sempre serão, menores que as dádivas recebidas, a começar pela da vida.
O estado habitual de gratidão é antídoto seguro contra um sem-número de dores existenciais. A sua precondição é a realidade à qual costumamos dar o nome de "humildade", bússola psíquica, senso de proporções elementar sem o qual a vida humana transforma-se em tormento contínuo, em insatisfação invencível, em volúpia agônica de reconhecimento por qualquer ninharia.
A gratidão é uma forma analógica de justiça. A pessoa grata não faz apenas o que deve; ela deve o que faz. Ou, mais precisamente: sabe que deve – e faz.
O ingrato, por sua vez, não só não faz o que deve; ele não se sente em dívida nem mesmo para com extraordinários benefícios que receba. Como se enxerga maior do que é, adquire a tendência de, habitualmente, voltar-se contra quaisquer eventuais benfeitores".