Coleção pessoal de beatrizpace
Não precisa sentir pena de mim. Se tem algo para odiar mais no mundo é isso. Sinta saudade, vontade de nunca ter me conhecido, antes, ou depois, amor, câimbra nos neurônios, dor no coração, arrependimento... Mas não sinta pena. Eu não te dou esse direito. Não é no meu salto alto ou no meu batom vermelho que você irá encontrar a resposta do por quê. Nem na minha ousadia em não querer saber como anda você. Eu era tão melhor sem ti quanto estou agora. Eu e minha sensibilidade de mundo, duas inseparáveis. Eu e minha vontade de ser mais feliz do que qualquer dor alheia. Eu e eu, com a alma plantada a beira de um monte budista meditando enquanto a sua vai à beira do abismo gritar meu nome.
Não adianta matar o amor com baygon vencido, nem passar na máquina de triturar papel, nem fazer charme e se fazer de forte. Uma hora, querendo ou não, os créditos finais de contos de fadas terminam com tudo que sobrou, seja bom, ruim, saudoso, nostálgico, insano, vadio. Um fim tão trágico que nem a genialidade de Almodóvar pôde imaginar. Um fim tão fim quanto o carnaval de Marcelo Camelo. Um fim suicida. Em letras garrafais. Com exclamações. Sem pontos. Puro e sem gelo.
Eu poderia procurar a tarde inteira um cd antigo se você chegasse para me contar sua história e eu fingisse que caía. Eu fingiria muito bem só para poder te levar para casa, mesmo que ficasse só nisso. Acontece que eu não sei mais fazer essas coisas de sorrir quando devo ou fingir quando é preciso. Tenho aquela leveza na expressão de ser simplesmente eu.
Sou mulher de olhar os fatos e ordenar sequencialmente as soluções. Respostas para as perguntas. Saídas nos casos mais desesperados. Mas dessa vez eu me sento na calçada sozinha, viro a bebida, esfrego o braço para secar a boca enquanto continuo segurando a garrafa fielmente. Ando cheirando a álcool, mofo, lágrimas ainda úmidas. Estilo caminhoneiro de filme mexicano independente sabe? Sei que sabe, você sempre odiava quando eu insistia em assistir os mesmos. Fico batendo a cabeça na parede, falando coisas sentimentais, choramingando pra essa eu que me olha de dentro do espelho. No fundo, se quer saber, nem sei mais o que ainda existe. Sei que eu gosto de fazer isso, essa aparência de madalena sofredora me faz ver o quanto eu mereço por um batom vermelho, um salto alto, um sorriso na boca e ir enfrentar teus olhos e de todos os outros. Desse jeito mesmo, do jeito que você se acostumou a me conhecer, como essa mulher que não se dói por coisas pequenas. Não que você saiba.
Os atos eram curtos, as frases telegráficas. Algo como por que foi assim? Aonde vamos com isso tudo? Era? Não é mais. Até que num gemido rouco desfizemos nossos laços apertando nossas mãos. Nos despedimos com abraços – sem lágrimas dessa vez- mas com muita saudade, sinto te dizer. Reconhecemos de uma vez por toda que um é e talvez seja sempre um pedaço que falta no outro.
- Você já viu uma estrela cadente?
- Via muitas.
- Via? Não vê mais?
- Não. Faz muito tempo.
- Por quê? Deixou de olhar para o céu?
- Não. Elas deixaram de cair. Só isso. Acho que cansaram de cair.
Como essas duas almas que tinham sede da outra e de tanto afeto deixaram-se por si serem incompletas para sempre
Estarei sempre atenta ao que há por vir com os anseios embaixo do tapete procurando um pouco de indecisão e problema nas situações. Eu ficarei aqui te esperando com o corpo suando saudade de todas as brigas e discussões, dos beijos insanos e palavras sacanas. Estarei sempre procurando o que falta na perfeição para poder correr pros teus braços largos como quem tem saudade de ser como era. Posso estar em outras camas, com outros dilemas rodeando a minha cabeça em busca da minha vontade de querê-los, com outro discurso de não quero mais e nada importa, mas só porque no fundo o que eu quero mesmo é enlouquecer mais um pouco com você, por entre os becos, pelas praças, nas esquinas. De qualquer forma, cidade, com qualquer trilha sonora, sem culpa, essa é nossa chance de enlouquecer um pouco mais.
Vai, confia em mim que eu gosto de dilacerar as almas alheias. Em menos de duas doses enlouqueço sua mente sã em razão das minhas ironias desvairadas só para jogar fogo na sua vida e chorar com sua partida.
Vem cá, vou te dizer. Vai em frente, eu te dou calma, te dou tempo, te dou pressa. Só continua andando sobre as estrelas acreditando que um dia você vai ser feliz.
Só quero que você arranque todas as minhas dúvidas que me deixam insone e meticulosa com as pessoas. Só quero isso, um chão presente, firme, forte, ausente de mistérios, incertezas, quebra-cabeças. Quero o teu pedido de volta, mas a tua vinda também.
Mas sorrio quando caio ao chão, brinco com as pedrinhas no fundo do poço, batuco na acústica do abismo.
Não tenho tudo que eu sempre quis e acho isso tão bom. Se me falta algo, meus caros, é tempo para viver tudo que sonho, porque o resto eu tenho de sobra.
Cansei de esperar sentada a felicidade bater à minha porta. Comecei a me perguntar e se ela nunca vier? Se ela não souber onde moro? Se ela chegar e eu tiver adormecido? Melhor não confiar na sorte. Fui em busca dela e descobri. A felicidade estava do meu lado o tempo todo, estava dentro de mim.
Eu queria saber até quando vamos ficar nesse reencontro que não aconteceu. Até quando você vai jurar que vive bem sem mim e sem coragem de me olhar nos olhos? Até quando eu vou prometer que não te amo mais até te ver com outro alguém? Nossa vida não se resolve com essa indiferença que repousou desde que você partiu me deixando sem nexo ou conclusões. Nossa história não se rompe enquanto eu continuar indo embora te deixando sozinho no mundo. Não adiantou fazer nenhum beijo de placebo, nenhuma conversa nova de droga alternativa.
Em todos esses tempos não aprendi a te decifrar, a te entender. Talvez seja por isso que eu ainda esteja aqui, tomando meu café sentindo o vento bater na minha nuca, cuca fresca, pensamento vazio. Um pouco de paz para os que querem, porque eu quero só nós dois para ontem, hoje, amanhã, para daqui a vinte anos. Para sempre.
Os lençóis estavam abarrotados, ainda com o seu cheiro, mas sem nenhum resquício teu. Um bilhete, uma flor, um ‘qualquer coisa’... Só o que me restara naquela manhã vazia era meu olhar incompleto. Sei que não deveria cobrar nada de você, mas nas minhas incertezas você foi cavando mais dúvidas que me deixam isolada dessa forma, como uma ilha no meio do oceano. Eu sei que esse silêncio vem torturando a mim e a você, mas eu venho tentando destruir esses moinhos de vento, enquanto você vai deixando reticências pelos dias, sem telefonemas, na ausência pura e completa. Ando divagando como cheguei aqui enquanto olho a vista da janela do quarto que se torna mais vazio do que o normal a cada manhã. Eu tento descobri o que é que dizem teus olhos, enquanto você, sem sucesso, não descobre o que dizem minhas letras, como esta.
Nós não começamos pelo início. Por que então terminaríamos com o fim? Somos o que prossegue, o que arde dentro da alma, o que não consegue se por para fora porque chafurdou-se pela porta de dentro, e grita dizendo “eis o meu lugar”. Eu sou o que você nunca vai conseguir tirar da sua vida, e você vai ser sempre a surpresa que surgiu na minha. Porque não seria se não tivesse sido.