Coleção pessoal de antonio_nunes_2
SECRETA REALIDADE
Bebemos voluntariamente
do mesmo estimado pecado
tu és o meu vício insaciado
meu fundamento latente
meu desejo voraz e bendito
Sono leve e emblemático
que me permite ter sonhos
meu vento moderno asiático
que afasta os dias tristonhos
O bem que traz a sesta
satélite monocórdico
que gira a minha volta
és a luz com rosto israelita
que transforma a audácia
de todas as agonias em festa.
TRISTE ÁLBUM
Beba e embriaga-se
claro, só se quiseres
ache a melhor cerveja
dentre as marcas do país
para com gosto consumires
cante vitória da sua peleja
pois foste sucessiva, demais!
Enquanto festejas contente
bebo das minhas lágrimas
fazendo-as de refrigério sumo
sinto o doce da polpa latente
que geme na língua sem rumo
e em concordância choramingo
da dor do meu grito de domingo
Preto e branco jorra o medo
que no meio da percepção
fizeste germinar em segredo
reverberou-se no meio em vão
a imagem implícita que de ti tive
Lacrimejo tristemente
da sua fotografia em couro
daquela bonequinha d´ouro
que avidamente me enfeitiçou
no instante que inundava
em seus olhos a fobia
do beijo roubado em orgia
que lentamente (só) te içou
Deixaste brilho no insolente
plano de te ter para sempre
farejando no toque mágico
as tuas mãos escaldantes
que chegaram a amaciar
a máscara nua que exibias
enquanto no fundo exigias
fazer comigo um amor de brinquedo
SOBRENATURAL
Decerto ninguém jamais
Conquistou uma mulher
Se possivel fosse com ela
Jamais brigarias e por ela
Não mais lutarias, confesso!
Casamento ?!
Nem isso nem aquilo
Prende uma autêntica mulher
Nem tempos nem momentos
Nem jóias, rosas, carros, nada!
Ela não é um titulo [...]
É uma corrida contínua
Que nem São Silvestre
Se parar você perde!
Acredite!
Ninguém jamais
Conquistou uma mulher
Nem reis, nem poetas
Muito menos nossos pais!
Ela é uma cidade que nem
Canã cabe todas as promessas
Mas não é para conquistar
É por conquistar dia após dia.
AS DUAS GAIVOTAS
Cruzavam velozes e solenes
a longitude do meu olhar
na alva da quinta-feira
pareciam (... suas asas)
no mar azul ciano molhar
Seguiam aquela aragem
na horizontalidade do norte
batiam (... suas asas)
como que sem fronteira
e o voo saia a sua maneira
dirigindo-se na margem
da inesperada onda da morte
Era bom vê-las cruzar
o melífluo raiar ilusionista
que acordava na inocência
das duas gaivotas perdidas
no limite da minha vista.
UM POUCO SE VAI
No olhar se perde o encanto
No pranto se despede o riso
Nas correntes da equidade
Renasce a vil desigualdade
E um pouco se vai...
O dia nasce na hora indevida
Degola da madrugada a vida
Restos de fins sem começo
Almas prisioneiras no avesso
E um pouco se vai...
Nas emoções, nas acções
No nada febril e nas orações
Se prende o pouco do muito
Que com esperança devia ficar
Mas, ainda assim, lá se vai
Enfim, nascemos a padecer.
DOIS MIL E CRISE
Seu favorito sorriso
Viveu um mês de juízo
Chamou-se monetário
Tinha uns tantos zeros
às costas do número um
Devia ser um milhão!
Confortava-lhe o coração
Todas as manhãs de Agosto
Eram bons amigos, aposto!
O número dava-lhe o motivo
E o coitado dava-lhe o sorriso
Isso antes do memorável
Ano de dois mil e crise
Que o petróleo em seu
Apreciável estado líquido
Decidiu vorazmente ser bruto.
APARÊNCIAS
Ninguém sabe absolutamente nada de ninguém;
Da paz e/ou conflito que se regenera na mente de cada um;
Ninguém conhece ninguém.
Somos todos aparências (boas e/ou más), Espadas, feridas e cicatrizes produzidas pelo tempo.
PENSAMENTADIALOGANDO COMIGO MESMO
Se me perguntarem o que é a vida ?
(para além do estado de estar vivo e respirando)
Eu direi a vida é um pouco disso e daquilo.
E se me pedirem para discodificar o isso e aquilo direi:
Isso – é tudo que conseguimos sentir.
Ou seja, a nossa realidade.
Aquilo – é o que almejamos e vimos nos outros.
Ou ainda, a realidade deles no nosso sonho.
E se a ninguém convencer então direi:
A vida é a mesma incógnita que ambos indagamos.
DIAS DA MINHA VAIDADE I
Se espontaneamente sorrio
É para não encher o coração de frio
O resto sei que é vaidade
Pois, tudo é saudade
É desigualdade
É inutilidade
É mais alguma coisa
Com –idade
Que ingenuidade!
VAIDADE II
Se sorrio;
A certeza de um dia "não mais ser"
Se converte em abundante vexame
Porque através dele se vê a inutilidade
De tudo que cada dia "conquisto" na prisão da vida.
CONTRASTES
A tua verdade pode ser a minha mentira
E o teu compreender o meu ignorar
O absoluto é “humanamente” circunspecto
Não espero que todos comigo concordem!
Minha única preocupação
Tem sido ter e/ou estar em paz
Comigo mesmo e com os outros.
E se nada disso também for verdade
Terei de qualquer modo morrido vago.
FILOSOFANDO
Ainda que minha certeza transborde
Não procuro alguém que comigo concorde
Seria pedir demais!
Afinal, não sou nenhum Platão
Mas procuro alguém que exale paz
E que ao menos venere a minha opinião.
VAIDADE
Até o sorrir não muito me surpreende
Pois se torna vaidade salomónica
Quando percebo que do pó voltaremos.
IN-CERTEZAS
Nunca diga que conhece a uma mulher
Se não sabe o que espera de si mesma
Se não sabe o que espera da vida
Nem o que com avidez ela cisma
E o inédito que almeja em ti colher.
ESPERANÇA
Nos dias de hoje o amanhã é sempre breve
Nós é que somos imediatos e, às vezes impacientes.
IRONIA SECULAR
Se o mundo da mulher fosse perpetuo
Decerto, seria mais perfeito que o nosso
Suas curvas são mais notáveis que o bom nome de um homem.
ENGANOS
Supor para depois se opor
É múltipla ignorância a favor
Chorei achando que ele era mais triste que um ilhéu
Espantei-me ao perceber que infeliz mesmo era eu.
LONGITUDE
Entre o sofrer juntos (ausente)
E ser feliz sozinho (perto)
Escolho ficar com você distante.