Coleção pessoal de aleksandro_silva
Entorpecente
Ele faz viver por mais um dia
Quando morre em seu peito mórbida alegria
Mata aos poucos o fraco que antes sorria.
Débil entorpecente
Esvoaça sobre ele o matando que nem ao menos sente
Quando prova do veneno da garganta da serpente.
Após a lembrança efêmera do teu sabor passageiro
Enfrenta desfalecido o sofrer de um dia inteiro
Marcado veias abaixo inebriado do amargo cheiro
Acha em seu bolso a planta da vida
Brevemente acendida
Pelo calor do seu esqueiro.
Vida cárcere, inferno maldade
Inflama da erva a libertinagem
Um púlpito pútrido regado à meias verdades
Salvava o maltrapilho das maiores enfermidades:
Espiritual, física e emocional:
Era o "ópio do povo".
Quem dela não usa logo não tem esperança
De bate pronto ao desespero faz de si uma criança
Quer ir embora do mundo ao céu pulando, como isso cansa.
De curtas madeixas rudes o jovem negro sub-urbano
Levava consigo na mão um diapasão
Com o qual afinava falhadamente seu violão
De cordas opacas, madeiras envelhecidas ao longo ano.
Pergunte a ele onde há de dormir
Coberto, passivo aos males vigentes
Dissipado em sua mente o ópio docente
Cai mais uma vez na desgraça entorpecente.
De tanto abusar de ti ele está para ficar louco
Os gritos da alma se estringem até que rouco
Abre mão da sua vida que ruíra pouco a pouco.
No alto eu vira brilhar uma estrela diferente
Bem longe das outras, bem mais incandescente
Para ele ali era o lugar que Deus reservou
Aquele que a vida insistiu em maltratar partira ao céu doente
De lá irá mostrar o seu valor inerente
O brilho interior que é o que vale realmente
Dando a nós de presente a beleza entorpecente.
Aleksandro Silva- 01/02/2012
Classificados
Vendo sonhos
Vendo amores
Vendo inspirações
Vendo sorrisos
Vendo gargalhadas
Vendo você me vendo
Vendo ideias
Vendo inquietações
Vendo agonias e aspirações
Vendo céus poéticos
Vendos luas e nuvens poéticas
Coberturas de estrelas poéticas
Até poesia eu vendo
Vendo ribaltas de plástico
Rotundas de plástico
Refletores com varas de plástico
Bambolinas de plástico
Lanternas mágicas de plástico
Até atores de plástico eu vendo
Vendo aparições
Vendo notícias
Vendo vidas
Vendo você me vendendo
Vendo visão
Vendo tato
Vendo olfato
E compro paladar
Vendo tudo
Vendo mundos
Vendo fundos
E a única coisa que não ando vendo é talento.
Aleksandro Silva
Escrevo e assino, não gosto que meus pensamentos saiam zanzando por aí como um cachorro sem dono...
Aleksandro Silva
A minha versão
A minha versão que vale a pena não é aquela que te apraz
Eu não sou feito de puro equilíbrio
Essa minha versão chora todas as noites
A minha versão que vale a pena é o avesso da minha impressão carnal
Está tudo aqui dentro, na flor da pele não transpassa nada do meu submundo interior
Eu não concebo poemas com a minha versão rude, nem digo que te amo
Mas minha versão interior grita como um leão selvagem e só diz:
“te amo, te amo, te amo...” Essa voz que vem lá de dentro ecoa dessa forma.
Eu choro sim, mas não se preocupe, nem tudo em minha vida são lágrimas
Às vezes choro por prazer, choro de saudade, de emoção, de êxtase
Até esses versinhos simplórios são uma forma de chorar pra mim.
E essa minha versão é inacessível.
A minha versão louco, embasbacado, apaixonado pela Vida mas de pouco verbo
É a versão mais fácil de ver. Mas é uma versão feia. Eu gosto mais de ser bonito
Assim como eu sou por dentro. Portanto não me julgue pelo o que eu sou por fora
Eu só sou o que sou por dentro graças ao que toco por fora
E fora dos limites do meu corpo bate um coração que não é meu
Faz parte do que sou por dentro e amo por fora
Essa é a minha melhor versão, a que te venera e te contempla
A que te bebe no escuro, apalpa no claro e sente falta a todo momento
A que te lê nas entrelinhas.
A que atravessa à nado essa sua paz vermelha
Se pendura firme nos teus fios rubros de cabelo
Morre no incêndio que é teu olhar.
Minha versão débil não se parece em nada com o cara da propaganda de toalhas que você adora
Nem tem os mesmos atributos dos príncipes tal qual previu Walt Disney
Essa versão morre a cada dia em que subsiste, não quero que olhe pra ela.
Minha versão canalha, é a versão que espera que tudo venha daí
Mas que arquiteta o que há de vir e sonha desse lado
Sonha contigo a todo momento
Quero a sua versão comigo.
Aleksandro Silva
Meu coração é sistema excretor de versos
Que nos campos de lírios diversos
Esvaece sem sentir dor.
Meu coração é herança da criança
que dança no adro da esperança
da traça, da trança.
Meu coração é de pedra
Até o abstrato engendra
Na fonte que bate ao morrer.
Meu coração é uma obra prima
Que de tanto carecer de rima
Por muito tempo deixou de bater.
Meu coração é parnasiano
Quase que de ano em ano
Deságua na fonte de quem o amou
Se dele por hora me afasto morro
Assim como em morro morre o asfalto
Morro doce ao viver.
À Fausto.
Aleksandro Silva
Vírgula
Moça,
Que eu seja vírgula na poesia da tua vida,
Melodia nas canções que entoa,
Cor nos desenhos que dá traço,
Eterno enquanto seu abraço,
Que eu seja calor na luz que banha a cena em que brilhas,
Lugar tão firme quanto as tábuas em que voa,
Tão suave como as palavras que pronuncia,
Tão desejável quanto a vida leve soa,
Que eu seja carinho enquanto houver saudade,
Proteção enquanto houver maldade,
Sonho bom que mata o pesadelo,
Beleza nua através do
espelho,
Que eu seja incerto como teu horário,
Cheiro bom no seu incensário,
Fogo no olho, improviso no ensaio,
Dramaturgia que leio ao contrário,
Que eu seja paz em tua jovem vida artista,
E vírgula em tua poesia,
Porém, que não seja modernista,
Só assim talvez me exista
E não te perco de vista,
Que eu seja vírgula só para sentir o seu respirar ,,,
...Tenho interesse no que me toca, no que me fere, no que me seduz sem me reduzir. Portanto, se for me amar que ame direito, se for odiar que seja de corpo inteiro, eu não vou ser nada pela metade pra você...
Balada da meia mulher
... ele me disse que jogar lixo no chão é falta de educação. Mal sabe ele que nem todas as lixeiras morais do mundo comportam as sujeiras que ele traz no coração...
Balada da meia mulher
... ouvi pessoas importantes dizerem adeus, não com todas essas letras A, D, E, U e S, mas desde então qualquer dor de dente têm sido fácil de suportar. Se alguém me pergunta porque sou uma mulher insensível, simplesmente respondo que sensibilidade é excesso de falta de proteção. Fica cada vez mais difícil ser romancista, a corrupção virou manchete, a depressão é o novo mal do século e eu acabo de deixar de te amar...
Balada da meia mulher
Olhos piégas
Eu choro para ver o mundo girar em torno de mim
Choro pois a faca fincada no peito magoa
Choro triste, choro à toa
Choro pois o destino quis assim.
Me perco entre corizas, náuseas
E vertigens, imagens do passado
Em minha infelicidade debruçado
Escorro em lágrimas as vias aéreas.
Eu choro porque o céu deságua em meus olhos
Desabo quando a dor não cabe em minh'alma
Suspiro quando a tormenta se acalma
E com o travesseiro recupero os sonhos
Esse meu fiel escudeiro
Sabe tudo sobre o paradeiro
De como meu coração se perdeu
Daí eu choro quando a noite cai
E quando minhas vistas cansarem de ser um espetáculo a Perseu
Prometo que serei só seu
Juntarei meus pedaços e me farei inteiro
Para nunca mais ter que chorar em seus braços
(sem compromisso com a métrica)
Aleksandro Silva
Realidade Indigesta
O quê que eu vou comer?
O brado retumbante cravado nas ondas sonoras do universo, meu estômago que fez gemer.
Como pode a clava forte a mão de um povo, linchar o meu direito de comer?
O quê que eu vou comer?
Se só me restaram essas lágrimas amargas pra beber.
Pegue o chão de cabeceira,
As estrelas de cobertor,
O frio por companheira,
A prece por um clamor.
Não reconheço esse bicho,
Atrás do dulçor da maçã revira lixo,
Pra não desmamar o menino e vê-lo crescer
Come, mesmo sem ter o que comer.
O quê que eu vou comer?
Uma reza
Me desperta na matina um banho de água fria,
Quem perdura na miséria não merece nem um bom dia.
O vazio e o soluço, queima mais do que azia,
Cadê aquele povo meu Deus?
Que tanto dizem ser dos seus e só falam de empatia?
O quê que eu vou comer?
Os rosto antes desnudo se veste na sujeira,
Os poucos dentes que restam só servem pra roer o osso,
Quem caiu no fundo do poço,
Não sorri pra qualquer bobeira.
O quê que eu vou comer?
Se até quem come, não consegue comer bem.
Quem muito tem, nada divide.
Quem pouco tem, partilha e transgride.
Quem nada tem, que a sorte duvide.
É difícil acreditar na invisibilidade que se constrói,
Parece que o ser em mim aos olhos deles se corrói,
Não sou visto, não sou quisto, nem parece que sou gente.
Mas se tem bom coração,
Joga um pão meu irmão,
Minha fome é urgente.
O quê que eu vou comer?
Um foguete no espaço
A adefagia em mim me iguala a um animal,
A miopia deles não os fazem especiais.
Quem sabe eu fique rico, ganhe um tostão a mais
Pra queimar em combustível das corridas espaciais.
O quê que eu vou comer?
Um pão ou uma poesia?
A Deus eu somente peço,
Que todo irmão tenha acesso ao pão,
Não enfrente um dia o quinhão
De não ser visto e virar verso.
Aleksandro Silva
Preso pelos algoritmos
Flutuando amarga teia
Mente fraca, terra fértil
A todo ódio que semeia
Vigiado na viagem
Vadiando, noite é
Dia salto na miragem
De assalto reza e fé
Figurando entre a beleza
Esqueleto arredio
Paisagem realeza
Dismorfico sombrio
Engole o choro da solidão
Com um gole de café
Violão sem diapasão
Desarranja nota ré
Mundo estranho, pousa rico
Mesmo pobre de marré
Passa adiante enquanto fico
Vai em frente marcha ré!