Cerrado
AME O TEU AMOR (soneto)
Ame o teu amor, enquanto tens e enquanto
O teu afeto é o aconchego no amável olhar
Assim, quem no singular amor te ame tanto
Porque nunca cortejarás outro pra tal lugar
Que nunca o deixe solitário, no vão vagar
Lembra-te sempre, no convívio, o quanto
É bom poder com o outro contar e confiar
E no teu abraço encontrar o teu real canto
Ame-o, este amor, e sentirás, por certo
Cada ausência, a falta, ó suspiro agudo
Se a saudade no peito for impulso incerto
Então, ame! Clame por tê-lo por perto
Ao alcance do coração, da vida, de tudo
Pois, assim, pulsarás na emoção o acerto...
© Luciano Spagnol -poeta do cerrado
21/07/2020, 10’31” - Triângulo Mineiro
ATO DE CARIDADE (soneto)
Que eu tenha o Bem, e Paz. Assim eu faça!
Que a mão posta ouça as preces, alce voo
Maria, Mãe, volva tua face para essa graça
Que eu seja caridoso sem louvar que sou
Se muito ou pouco, que tudo me satisfaça
Não importe ou doa o quanto me custou
Não deixe que o orgulho seja uma ameaça
E a minha fé seja o troco que me sobrou
Que o riso e abraço, seja pra quem vier
De onde vier, onde estiver, assim seja!
Ó Deus Pai! Me abençoe nesse prover
E, no viver, sempre tenha amor e laços
E no pão de cada dia, bênçãos, eu veja
Partindo com o irmão em dois pedaços
© Luciano Spagnol -poeta do cerrado
22/07/2020, 09’52” - Triângulo Mineiro
paráfrase Djalma Andrade
SONATA DE OUTONO
Versos de folhas caídas
Circuito de vida, na vida
Folhas mortas, já vencidas
Num balé de vinda e ida
Vão ao chão, são paridas
Trilha de ilusão descida
Na melancolia, ouvidas
Numa inevitável corrida
Do fado, no seu instante
Duma outrora agonizante
Em apelos da mocidade
De tão veloz, e vai avante
No seu horizonte gigante
Os outonos e a saudade...
© Luciano Spagnol
Poeta do cerrado
2018, 13 de março
Cerrado goiano
TRAGÉDIA
É a tragédia, bardo, desta vida
neblina que na manhã embaça
solidão com desleixo sem graça
que na agonia sem dó é erguida
É gemido que na dor favorecida
por tristuras n’alma em carcaça
um choro, um sonho de fumaça
sulca ufana, e devora destemida
É reza, enfim, que na pobreza
da fé, numa carência generosa
olha aos céus com certa frieza
Mas ter desilusão, tão gulosa
na alegria, é prosa sem defesa
ao fado traz frustação furiosa
© Luciano Spagnol - poeta do cerrado
12/ outubro, 2020 – Triângulo Mineiro
PÔS-SE O SOL
Pôs-se o sol... onde a noite tece a teia
Da treva. E pouco a pouco aí desmaia
A última luz do dia, então, assim caia
Da escuridão que a pretidão incendeia
No horizonte estrelas no céu semeia
Pela janela a sombra deita na alfaia
O mirar no remoto lúrido cambaia
E a escureza do cerrado encadeia
Com o olhar na lua, rogo levanto
E, cheio de maculada melancolia
Anoitece, e não prendo o pranto:
Choro de encanto e tal a alegria
De tão ligeira cena e sem tanto
Em gratidão, por mais um dia!
© Luciano Spagnol – poeta do cerrado
12 de outubro, 2020 – Triângulo Mineiro
TEIMA
Retratar o amor em vão procura
quem na vida dele sentir não teve
porque um rasto na alma obteve
pois, longo ou breve, há ternura
Todavia eu, ideando, na ventura
a mínima sorte o destino deteve
sentir o que sinto, nunca leve
no vazio, minha solidão figura
E nestas paixões de boas alianças
poética redigiu só sofrido pesar
e uma, foi, dentre as lembranças
E, porém, neste suspiroso causar
do único, nas turronas esperanças
vou amador que cobiça mais amar!
© Luciano Spagnol – poeta do cerrado
13, outubro, 2020 – Triângulo Mineiro
POÉTICA
A poesia na rica imaginação voa
lançando à terra de um criador
no encanto de encanto povoa
o ilusório de quem é um ledor
No escrito a doce prosa entoa
o coro de fantasias ao dispor
é a ilusão que a poética doa
ao poeta que vive sonhador
Por ti, devaneio, tudo é certo
do cascalho grosseiro ao rubi
se o amor, ali, está por perto!
Por ti, inspiração: - se senti
no prazer, num leve aperto
eclodido num grato frenesi
© Luciano Spagnol – poeta do cerrado
13, outubro, 2020, 13’13” – Triângulo Mineiro
Ó SAUDADE QUE PASSAIS
Ó saudade que passais, ao sol poente
Pela estrada da lembrança, a suspirar
E na solidão vais em uma vertente
Sugerindo o aperto pra nos sufocar
Deixai-me, aqui, assim, indiferente
O sol que tomba, notando o pesar
O mesmo que já declinou contente:
- na graça, no vinho, no alvo luar...
Deixai! Deixai ir com as cantigas
Do entardecer, as dores sem fim
E contigo todas as ilusões antigas
Que eu quero dormir no descanso
Com anso, calmo e que nada digas
Adormecer num voo leve e manso
© Luciano Spagnol – poeta do cerrado
13/10/2020, 18’00” – Triângulo Mineiro
AO LONGO DA PROSA UMA TRISTE POESIA
Ao longo da prosa uma triste poesia
Já quando o entardecer deslustrava
no silêncio que o dia, assim, estava
e o cerrado baforando melancolia
A solidão pelo horizonte estendia
um rubro vago no céu caminhava
entre os suspiros e choro exalava
saudades que a lembrança dizia
E na rudeza que o sentido fingia
a sofreguidão num só tormento
levai, ligeiro vento, está agonia
Oh se podeis ter dó do lamento
meu, vos imploro, nessa avaria
levai, levai do meu sentimento!
© Luciano Spagnol - poeta do cerrado
Outubro, 14 de 2020 – Triângulo Mineiro
PARALELO
Incultos sentimentos ditos pela metade
manifesto a vossa fiel leitura, ó leitores
e em cada trova a vossos olhos, piedade
lhes digo apenas piedade, não louvores
E neste orgulho, este que é inanidade
os suspiros, lamúrias e minhas dores
lágrimas de amores e sua imensidade
suportando por uns míseros favores
Se entre minha sorte de nascimento
encontrardes traços cujo o engano
indique que divaguei com portento
Crede, ledores, que foi do profano
versado com a mão do fingimento
em um paralelo ao o acaso insano
© Luciano Spagnol - poeta do cerrado
Outubro, 14/2020, 16’54” – Triângulo Mineiro
GORJETA
Eu sou aquele que no amor é perdido
eu sou o que no fado me falta aporte
sou esse da desdita, e nesta tal sorte
sou a contramão, a solidão desmedida
A sombra no meio fio da cara vida
e que no devaneio perdeu o norte
que fica no vagar num choro forte
rascunhando a chaga tão dolorida
Sou aquele que no silêncio habita
Sou pôr do sol sumido, desprovido
Sou aquele que na ilusão orbita
Sou talvez o ideal de alguma dita
Quiçá a que o rumo me é devido
Quem sabe uma gorjeta merecida
© Luciano Spagnol - poeta do cerrado
15/10/2020, 16’19” – Triângulo Mineiro
FAMINTO
Vai, mísero sofrimento esfaimado
pastar noutra sensação livremente
deixai meu coração de te ausente
faminto, carente, mas imaculado
Não percas tempo, vá apressado
pois se insiste em estar presente
a paixão do teu olhar pendente
despojo inútil, inútil o passado
Deixai o vento levar, que o leve
hei de me arrancar do teu nome
e, assim, de ti isento, serei breve
Aqui, piedoso a dor me consome
nos soluços que o choro descreve
e sem que ventura emoção tome
© Luciano Spagnol - poeta do cerrado
16/10/2020, 16’10” – Triângulo Mineiro
PRA QUÊ?
Como quem fica defronte duma cilada
espantado, sufocado, aí fui deixando
os sonhos pela desmarcada estrada
donde vinha, deveras, caminhando
E a minha alma, de chorar molhada
então ficava, o peito ali suspirando
me vi, enfim, que chorei pra nada
e pra nada foi que chorei passando
Assim, corroí o poético sentimento
redigindo a sangue cada caro verso
e num sombrio poetar, tristura se lê
E pergunto em fim ao duro lamento:
- se ainda terei na vida penar diverso
Pra que sofrer, e o pranto... Pra quê?
© Luciano Spagnol - poeta do cerrado
Outubro,17/2020 – Triângulo Mineiro
RIMAR DUMA SAUDADE
Teve um tempo que mandava
Nas poesias que eu escrevia
Cada versar uma companhia
E em cada linha festa bordava
Com emoção, assim, andava
Nas mãos a imaginação ia
E em toda a obra que fazia
A ventura, ao lado, ajudava
Pobre a poesia, sem aquarela
Sem fantasia, um dia tão bela
E hoje, pedinte de qualidade
E, no amor, sem substância
Sobre o vazio da distância...
Só o rimar duma saudade!
© Luciano Spagnol – poeta do cerrado
18/10/2020, 09’29” – Triângulo Mineiro
ATANAZAR
Viste-me abatido um dia no caminho
em devaneios de que, nem eu o sei
ó aperto no peito, assim, eu lhe falei:
Cara poesia. Na jornada indo sozinho
Trovei, e rimei, foi por entre espinho
E em nenhuma postagem descansei
Em cada uma loa que por ela passei
Saudei! Umas até degustando vinho
E neste poetar pedregoso, solitário
Os pés deplorando em um calvário
Imolado. Eu num canto, no entanto
Ao chorar o prazer em um dejejum
Tu e eu poesia. Em drama comum
Versejamos com o mesmo pranto
© Luciano Spagnol – poeta do cerrado
18/10/2020, 14’13” – Triângulo Mineiro
[...]mais um pôr do sol...
...mais um dia que se vai e é a sombra que agora cai, trazendo a lua pra confortar, o cerrado, na Imensidão do escuro da noite... a vida em continuação!
© Luciano Spagnol - poeta do cerrado
Sertão da Farinha Podre
A MESA
A mesa tem seis ou mais cadeiras
circundada dos lugares
entre conversa e cafeteiras
flores, alimentos e familiares
De fazer parte, dares e tomares
Também, conciliação e, nas beiras
Discussão, brincadeiras, milhares
Silêncio, espertezas e besteiras...
De madeira, ouviu histórias sem fim
louças de cor e brancas marfim
Carregadas de emoções
Enfim, entre o olhar pueril
E a velhice, lá está ela, gentil
Servindo a diferentes gerações
© Luciano Spagnol - poeta do cerrado
19/10/2020 - Cerrado goiano
O MEU PESAR
Tenho pesar da solidão numa vida
Da sensação que o carente sente
Dum amor que assim de repente
Sai do querer, e vai de partida...
Da ilusão que da alma é fugida
Do olhar ingrato frente a frente
Dos que ostentam toda a gente
E os que não aquietam a ferida
Tenho pesar do senso dividido
De não estar sorrindo à revelia
Contente de um dia ter nascido
Pesar de mim, de quem sofreu
De não ser mais e mais alegria
E, de ter posposto o meu eu!
© Luciano Spagnol - poeta do cerrado
19/10/2020, 09’36” - Cerrado goiano
LACRIMANTE
Soneto, vivo tão só, numa rudeza
Onde o versejar se dilui em pranto
Longe do prazer cheio de encanto
Aonde a minha poética está presa
As rimas são ao verso só incerteza
Tristeza, onde o meu sofrer é canto
No entretanto, o amor é tanto, tanto
Em uma poesia frágil e tão indefesa
Ando inquieto, o coração com desejo
De um sussurrar tão de ele distante
Que endoida, e que na paixão a vejo
Em cada uma das linhas, um instante
Que retumba pelo ar, tal a um realejo
Solitário, com o impar tom lacrimante.
© Luciano Spagnol – poeta do cerrado
07 maio, 2024, 18’44” – Araguari, MG
MENTIRA
Acreditei em ti, poética, no emocional
Verso, foi assim, que me vi com ilusão
Cevando dentro de mim algo especial
O amor singelo e ledo, na composição
Pensei ter alcançado então, um final
Enredo, cheio de alegria, de emoção
Tão desejado, e, tão transcendental
Num soneto com sentido e sensação
Tudo em vão, mentiste, burlou tudo
Disfarçou cada detalhe do conteúdo
Deixando túrbido poetizar que delira
Ah! a ode de paixão que tanto ansiei
E o sentimento que contigo poetizei
Acabou, afinal, sendo uma mentira!
© Luciano Spagnol – poeta do cerrado
08 maio, 2024, 13’18” – Araguari, MG