Cem Sonetos de Amor
ÀS TUAS VAIDADES
Um amor tão mais risonho, assim não vejo!
Quem o diria de felicidade não ter conta...
E nada é tão mais puro, que o desaponta
De tempo algum a lhe ofuscar o meu desejo.
Passam dias e passam noites ao teu beijo...
E nessa era um outro afeto ninguém aponta
Como preciosos risos, que a fizeste pronta
Totalmente a mim, amor, sem quer um pejo!
Ah! Que bem, tudo isso me fosse à verdade...
Que bem, oh, meu amor, sem vaidades
Me fosse esse impossível nunca a morrer...
Esse amor tão mais contente ainda é sonho!
Inda estão nos versos que eu te componho,
Em meio aos infinitos risos, p’ra em ti viver...
A SAUDADE D’ Ela
Eis o tempo que não há tempo...
Os dias que esperavas, amor!
Terás agora o conhecimento
Das horas perdidas em seu langor.
De almas passadas fez-se o vento...
Trazem em versos a minha dor...
Que hoje de mim é o alento
No agora que vive meu esplendor...
Mas tanto de brilho não vivo ainda
Por antes beijar-te a face linda,
Por antes amá-la aos meus delírios...
Foi-se de mim a própria saudade...
Por hoje nos contos de vaidade
Eis que a ressurge dentre os lírios.
ÚLTIMO PRANTO
Acaso torto! Hás d’eu, portanto, cumprir
Por esta vida de prantos e de amor:
Existência qual foi traçado o meu porvir,
E glória, qual me foi vista ao esplendor...
O firmamento, que me figura em exaurir
A maldição, o engano sedutor
Que me avaria, em promessas, induzir
A alma em displicência ao meu fulgor...
O qual me invoca em ilusão ao pecado,
Que sem razão, me complexa ao mundo,
Que sem esperança me intui elevado...
E consumado eu me vejo ao sol disposto,
A vencer todo chão de ardor profundo,
Que de triunfos, eu me vejo sorrir o rosto...
DEPÓS O INVERNO
Aos sóis, num tempo de desventura,
Pregado ao amor e a tristeza,
O lírio ao vento espalha a beleza,
Formando-se paixão sem amargura...
Eleva-se, e cantiga, a lua-ventura
Das noites pratas, e, quanto mais acesa
Clareia aos campos em realeza
Juntando-se as flores sua candura...
E pecados não se ouvem de perverso;
Os bálsamos dispersam o reverso,
O jardim é um só complexo de fulgor...
As estrelas se completam as amadas,
E na fragrância azul das alvoradas
Renasce dentre as cinzas uma nova flor!
MENDIGO
Posso ser o que me quiserem ser;
Amor... Tortura... Astro pungente!
Aos versos, um grito incoerente,
Ou um tolo mendigo ao se merecer...
Belos segredos d’um vil viver,
Hás em meu peito para toda a gente...
Hás amarguras; dor do que sente,
A minh’alma em vos compreender!
Pregado a cruz de minha estrada,
Podem me ver como luz de alvorada,
Ou como ocaso d’um são pecador!
Posso ser sol, trevas, mutável deserto,
Ser porta fechada, ou lírio aberto
Sob as esmolas d’um só pouco amor!
A UMA CONSORTE
És como aroma de rosas! Adolescente,
Como uma pomba divina de amor...
És como do céu o sol! Simplesmente,
Como o clarão da lua em esplendor...
Tens sorrisos à face, e, suavemente
O corpo desfila em andares de primor...
Tens anseios que se embalam, docemente
À pele rubra em brados belos e sem dor!
Por existir em chama viva, em queimar
Qual astro poente a procurar
Na noite longa o brilho intenso percorrer,
És como as estrelas de azuis celestes,
Que inteiramente me enriqueces
No infinito do teu amor nunca a morrer...
EXPRESSÃO
Digo aos versos a voz conspirada,
Qual dispersa amargura e amor...
Que vem quente, outr’ora gelada,
Que vêm trevas e vem esplendor...
Digo de alma, de ternura apagada,
De espírito-luz, de intenso fulgor...
Que digo da esperança fechada,
Que digo da fé a Deus-alto: Senhor!
Voz, que ao mudo, a alma chora...
De palavras frias, coração apavora,
Que apaga estrelas ao céu imenso...
Que ao reverso, perfume se’spalha...
Em primor aceso, do Divo que talha,
Como brisa mansa ao ar propenso...
O NOME DELA É PAIXÃO
Tão deslumbrante, minha rainha, meu amor.
Pele de seda, cheirosas curvas, quente...
Com teu brasar de atração e de furor
Esquece-me o mundo ao teu beijo eloquente!
Tanto aos deuses eu a roguei... Tão dependente,
Aos meus insanos carinhos de primor...
Que me destes aos teus íntimos, simplesmente,
Como profana de ternuras e de esplendor!
Visão sem olhos, à alma louca fosse outrora...
Pois minha prenda, minha pomba, tu és agora
O meu conforto ao deserto frio de ansiedade...
Como as rosas, eterna tu me seja a deslumbrar...
Pois que o meu corpo tu já fazes exaltar
Desde o princípio em que te vejo à insanidade...
TRESLOUCADO
Eu sou a-quém vive o amor cantando,
Um pássaro a voejar por céu-além...
Um desdenhado ao tempo sonhando
Por se encontrar no que não me têm...
Os segredos dum vultoso sol-harém...
Sou um vagante, aos poucos buscando
Os de afeição, e sem ser ninguém,
D’outra existência vou desvairando...
Que lua, que fulgor intenso d’estrelas
Acalentará meus céus, por eu de vê-las
No independente mundo em que sou?!
Solidão oculta! Paixão tanta! Perdido,
— Eu sou dos céus um condor ferido
Por um amor que nunca se encontrou...
INSANIDADE
Por que de vida estranha pôde o amor?
Que sentimento corrompe e engana
Em gume desejado, sem que o fosse dor
Numa vida ardente e de alma insana?
Por que de vida alheia a paixão profana?
Quais eloquentes vozes de condor
Ao brado de anseios duma alma humana
Pôde o coração sem que a fosse ardor?
Antes inspirados em desejos poucos
Os meus lábios ávidos e inconsequentes,
Que fosse a sofrer eu em sonhos loucos...
Móvel no qual me ponho a dormir
Sentindo os castigos das cobiças quentes,
E que nada de insano fosse a eu devir!
PASSAGEM
O amor contigo, talvez, um dia se vai
Rompendo a estrada em desventuras;
Cumprindo ao tempo os nossos ais
Na paixão dolente, complexa e pura.
O amor contigo, talvez, imortal se fica
Sem dias amargurados, em prazer,
A ermo dos sentimentos, que suplica
O infinito do teu caminho a romper...
Quem sabe dentro d'alma nossas vidas
De graças maculadas, nossas lidas,
O nosso peito, que de pulsar lucidez
Ao coração miserável, tão profundo,
O nosso amor simplesmente no mundo
Nada é do que é, passagem... Talvez!
PASSAGEM
Sem quer ter mágoas dum amor que me passou,
Que não pudera meu coração corresponder,
Bendito ser que ao infinito não pude ter,
Eis a lua com a tua aparência e o teu fulgor...
De luz infinita sua existência qual o sol ficou,
Que navegar ao mar imenso é seu prazer;
Aos jardins dos amores donde passa este ser
Sem quer enxergar a minha vida, esplendor.
Luz bendita que tanto brilha a tua existência,
Vermelho sangue é tu'alma de aparência
Que aos corações é simplesmente um encantar!
Sagrada dor que tão me dói e tanto tive
Sem quer pudor, sem quer chorar, e ainda vive
Sem quer ter mágoas, meu amor eu vi passar...
SONETO ETERNO
(A Heloiza Fernanda)
Alma de minha vida! Filha do meu amor
Que me enfeita o coração, eternizado!
Dentre o céu, nos meus ais, ao meu fulgor,
Estarás nos meus rosais imaculados.
Para sempre na minha lida sem quer dor
Serão tuas vontades, meu eterno fado...
O meu caminho, mesmo torto, no esplendor
Do jardim dos teus florais serei brocado!
Alma de minha vida! Infante é o teu viver...
Sentimento, ainda não sabe amar...
Paixão grandiosa, um dia, haverá de ter...
Por tudo serei por ti, mesmo absorto...
Aos teus olhos de sorte, meu som, meu ar
Estarás por ti sentir, eu mesmo morto...
NO TEU INFINITO
Não digas que o meu amor não te serve mais.
Lembra-te das horas puras, da paixão, e desejo;
Lembra-te, oh, meu amor, do místico beijo,
Que nem no tempo mais extenso se desfaz!
Amo-te demais, oh, meu amor, amo-te demais!
Não vás ao destino se entregar, em mim te deixo
Apossar-se dos meus dias plenos e de ensejo,
A rogar-me na alma os infinitos dias de paz...
Sou do teu amor à sombra o teu mesmo amor,
O agrado do teu peito, o cálice, sou o teu calor,
O sangue a te queimar o corpo nas horas frias!
Não digas, oh, meu amor, não digas mais nada...
Veja o sol que deita, veja a lua beijar a alvorada,
Eu sou o oiro a clarear o infinito dos teus dias!
Ela é !
Deliro e cada vez mais me encanto
Com aquela que afastou de mim o pranto
Cujo amor me serve de acalanto
Isto digo, afirmo, juro e pronto !
Ela é aquela que sacia minha sede
Deste que nesta vida nunca teve
Amor tão puro, verdadeiro e dedicado
Que nestes versos deixo registrado
Sim, ela habitava o sonho dos meus sonhos
E veio a mim em despertar sereno
Minha vida nas mãos dela agora ponho
Ela é a razão porque componho
O mais belo de todos os meus temas
Ouso dizer que é ela , o melhor de meus poemas !
AME O TEU AMOR (soneto)
Ame o teu amor, enquanto tens e enquanto
O teu afeto é o aconchego no amável olhar
Assim, quem no singular amor te ame tanto
Porque nunca cortejarás outro pra tal lugar
Que nunca o deixe solitário, no vão vagar
Lembra-te sempre, no convívio, o quanto
É bom poder com o outro contar e confiar
E no teu abraço encontrar o teu real canto
Ame-o, este amor, e sentirás, por certo
Cada ausência, a falta, ó suspiro agudo
Se a saudade no peito for impulso incerto
Então, ame! Clame por tê-lo por perto
Ao alcance do coração, da vida, de tudo
Pois, assim, pulsarás na emoção o acerto...
© Luciano Spagnol -poeta do cerrado
21/07/2020, 10’31” - Triângulo Mineiro
O AMOR QUE É AMOR
O amor que é amor jamais vacila
Nas paixões iradas entra sem medo
Leva consigo a afeição e o enredo
Do doce olhar, e o abraço que asila
O desejo é uma variedade tranquila
Pra quem cobiça, pois, vence o quedo
E dum para o outro não tem segredo
Enquanto o apuro o veneno destila
Amor que é amor, a tudo transforma
Um ato de grandeza e de plataforma
Do bem, onde se tem a sorte ao dispor
Esse esplendor, regado com flores
São muito mais que simples amores
É a natureza do amor que é amor...
© Luciano Spagnol - poeta do cerrado
14 de agosto de 2020 – Araguari, MG
VELHO TEMA
Só a graça da poesia, em toda a sensação
Palia o engano de um amor, mais nada
Nem mais os soluços do infeliz coração
Disfarçam a dor da devoção malograda
A insistente quimera por ela estacada
No seu encanto, chora toda a emoção
Da desilusão: no canto, na rima falada
Criando outro sonho, de novo a paixão
E, nessa inspiração que supomos
Duma tal felicidade que sonhamos
Em cada versejar, a verdade somos
Assim, nessa concordância, sejamos
O olhar, o afago, se na prosa fomos
O sentimento, ai no amor estamos!
© Luciano Spagnol- poeta do cerrado
27, agosto de 2020 - Cerrado goiano
UM AMOR NATURAL DE SÃO PAULO
Ah, amor doído, me maltrata
Saber que fui apenas recreio
Que inda arde no peito, creio
Que a dor me teimará ingrata
Com o engano, verídica errata
Ardo na agrura e no devaneio
Mas com o tempo, tu, receio
Irá se calar na súplice serenata
Os teus olhos deixarão de ser:
A força e planos no meu olhar
Tudo gira, no eterno aprender
Nego-te o meu sofrer e pesar
Se lamento é para te esquecer
Nesses versos de amor e amar!
© Luciano Spagnol - poeta do cerrado
Agosto de 2020, 31 – Triângulo Mineiro
SUFICIÊNCIA
Dita, ao pé do amor primeiro
Estreante desta variegada vida
Estou e estarei nessa acolhida
Ao coração, fiel companheiro
Da paixão o afeto cavalheiro
Pulsa-lhe a poesia em torcida
Faz a boa diversão apetecida
Salivando o gosto por inteiro
Trago-te flores, zelo certeiro
Trovando a doce existência
E que assim seja verdadeiro
Se não, não serve a aparência
E, tão pouco algo corriqueiro
Intensidade que é suficiência!
© Luciano Spagnol - poeta do cerrado
04/09/2020, 10’18” – Triângulo Mineiro