Carlos Drumond de Andrade Contagem do Tempo

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Há coisas que são boas por alguns instantes, outras por algum tempo. Só algumas são para sempre.

Aniversário

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.
Quando vim a olhar para a vida, perdera o sentido da vida.

Sim, o que fui de suposto a mim-mesmo,
O que fui de coração e parentesco.
O que fui de serões de meia-província,
O que fui de amarem-me e eu ser menino,
O que fui — ai, meu Deus!, o que só hoje sei que fui...
A que distância!...
(Nem o acho... )
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!

O que eu sou hoje é como a umidade no corredor do fim da casa,
Pondo grelado nas paredes...
O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhas lágrimas),
O que eu sou hoje é terem vendido a casa,
É terem morrido todos,
É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio...

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...
Que meu amor, como uma pessoa, esse tempo!
Desejo físico da alma de se encontrar ali outra vez,
Por uma viagem metafísica e carnal,
Com uma dualidade de eu para mim...
Comer o passado como pão de fome, sem tempo de manteiga nos dentes!

Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui...
A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos na loiça, com mais copos,
O aparador com muitas coisas — doces, frutas, o resto na sombra debaixo do alçado,
As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa,
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...

Pára, meu coração!
Não penses! Deixa o pensar na cabeça!
Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus!
Hoje já não faço anos.
Duro.
Somam-se-me dias.
Serei velho quando o for.
Mais nada.
Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira!...

O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!...

Álvaro de Campos
Poesia Completa de Álvaro de Campos. Fernando Pessoa.

Nota: Álvaro de Campos é um pseudônimo de Fernando Pessoa.

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Poética (II)

Com as lágrimas do tempo
e a cal do meu dia
eu fiz o cimento
da minha poesia

e na perspectiva
da vida futura
ergui em carne viva
sua arquitetura

não sei bem se é casa
se é torre ou se é templo
(um templo sem Deus)

mas é grande e clara
pertence a seu tempo
- entrai, irmãos meus!

Vinicius de Moraes
MORAES, V. de. Antologia Poética. Rio de Janeiro.1960

Eu morro ontem. Nasço amanha. Ando onde há espaço. Meu tempo é quando.

Vinicius de Moraes
Antologia poética

Nota: Trecho de "Poética"

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Umas coisas nascem de outras, enroscam-se, desatam-se, confundem-se, perdem-se, e o tempo vai andando sem se perder de si...

Machado de Assis
Esaú e Jacó (1904).

Paixão só aprendeu a ficar por pouco tempo. O amor gosta mesmo é de permanecer a vida inteira.

Apesar de tudo, o amor era menos simples do que ele julgava. Era mais forte do que o tempo. O amor, no fim das contas, era feito de inquietações, de renúncias, de pequenas tristezas que surgiam a todo instante.

O tempo amadurece todas as coisas. Nenhum homem nasce sábio

As nossas paixões não aceleram nem moderam o passo do tempo.

Machado de Assis
A mão e a luva (1874).

O tempo corre, e as nossas sensações com ele se modificam.

Machado de Assis
Histórias da meia-noite (1873).

Nota: Trecho do conto A parasita azul.

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Quando se trata de amor sempre tem um relógio fazendo tic-tac, sempre há uma contagem regressiva.
Não basta amar alguém, você precisa chegar a tempo.

Sentir primeiro, pensar depois
Perdoar primeiro, julgar depois
Amar primeiro, educar depois
Esquecer primeiro, aprender depois

Libertar primeiro, ensinar depois
Alimentar primeiro, cantar depois

Possuir primeiro, contemplar depois
Agir primeiro, julgar depois

Navegar primeiro, aportar depois
Viver primeiro, morrer depois

Paulo Roberto do Carmo
Estação de força - Poesia. Ed. Movimento/IEL (Instituto Estadual do Livro): Porto Alegre. 1987 (Coleção Poesiasul, v.61).

Nota: A autoria do poema tem vindo a ser erroneamente atribuída a Mario Quintana.

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Há dor que mata a pessoa
Sem dó nem piedade.
Porém, não há dor que doa
Como a dor de uma saudade.

E são tantas marcas
Que já fazem parte
Do que eu sou agora
Mas ainda sei me virar

Eu sou de uma terra que o povo padece
Mas não esmorece e procura vencer.
Da terra querida, que a linda cabocla
De riso na boca zomba no sofrer
Não nego meu sangue, não nego meu nome
Olho para a fome, pergunto o que há?
Eu sou brasileiro, filho do Nordeste,
Sou cabra da Peste, sou do Ceará.

Meus versos é como semente
Que nasce arriba do chão;
Não tenho estudo nem arte,
A minha rima faz parte
Das obras da criação

Nada como um amor não correspondido para tirar todo o sabor do sanduíche de manteiga de amendoim.

Se ser político é reclamar das injustiças. Então, eu sou político

Procure descobrir o seu caminho na vida.
Ninguém é responsável por nosso destino, a não ser nós mesmos.

Carlos Torres Pastorino
Minutos de sabedoria (1966).

Nostalgia é saudade do que vivi, melancolia é saudade do que não vivi.