Yohana SanFer
Ela quer carregar o mundo. Nos braços, nas costas, no bolso, no coração. Não importa o peso, ela aceita o desafio. Tem pressa, tem sede, mil idéias e ideais. Faz planos, mas, impulsiva, fica na expectativa do "grand finale" e se atrapalha. Ainda assim, ela continua. Tropeça, aprende e recomeça. Ela quer conhecimento, horizontes e motivos pra sorrir. Mais dias no calendário, mais noites e madrugadas e mais de vinte e quatro horas, só pra variar. Ela é uma, mil em uma e não tem sono no fim do dia. Mas às cinco, a tortura, ela tem sono pra acordar. Arruma e desarruma armários, a vida, o pensamento. Rabisca e guarda papéis, paga contas, revê fotos, amigos e filmes preferidos. Ouve e sente boa música, aumenta com prazer o som e quando é injustiçada, ela desaba e perde o tom. Se mostra mulher, se vê menina e quer pintar o quarto de lilás. Ela já teve mais pique, mas mesmo cansada persiste. Aposta no que há de vir e não desiste da correria. E ela corre... contra o tempo. Do tédio e da solidão. Cozinha quando tem fome, inventa receitas inéditas, tem preguiça aos domingos, pinta as unhas de vermelho, aprende um novo idioma, compra e lê um velho livro, sonha e busca um novo rumo, abraçamuitos, briga com meio mundo e escreve sobre o amor."
"Curioso não saber explicar como alguém tem o dom avassalador de ser o nosso ponto fraco. É como se eu estivesse em dieta e ele fosse a minha sobremesa predileta, armadilha , veneno e antídoto simultaneamente...inexplicável e irresistivelmente.
É como se eu admitisse que existiam mais gentis, mais bonitos, mais inteligentes e até mais sinceros, mas ninguém conseguia a façanha de ser minha paz e minha loucura ao mesmo tempo, ninguém conseguia ser a razão e as contestações sobre todas as leis inventadas pro amor... a não ser ele, ele que me desarma, ele que estraga o meu show, ele que é único."
"E eis que percebo - quase que como uma obviedade - que muito mais do que me expressar, me aproximar, questionar, protestar ou me libertar, escrever, em si, é a resposta mais imediata do meu coração pra todas as perguntas que eu carrego dentro de mim."
"Que eu seja capaz de reconhecer e reciclar meus erros e virtudes. Que eu seja capaz de desassistir as inseguranças e obstáculos e recomeçar com paixão e ousadia na alma, amor e coragem na bagagem a cada e toda vez que meu coração gritar que não tem medo."
"Ahh vidaaa...você bem que poderia parar de se fazer de desentendida e me mandar o que eu realmente preciso, sabe? Que tal artigos definidos?"O" amor, em vez de "uns"...eu te agradeceria!"
"E enquanto concordava sobre o quanto era desnecessário tanto silêncio e distância, se perguntava porque denovo caia na mesma marmadilha que o amor parecia ser.
E a resposta lhe vinha como algo que carregasse desde sempre sem perceber: "não tem jeito, não tem fim, é o coração no comando, de ontem em diante".
O moço do metrô
Era pra ser só mais um dia comum. Despertador estridente e banho frio como método de tortura e adeus ao sono às cinco horas da manhã. Paciência e agilidade matinal - dualidade duvidosa - pra domar a jubinha de leão, deixar pra depois o café que eu não tomo e enfrentar aquele trânsito caótico da cidade maravilhosa rumo às aulas de inglês.
O fato é que o sono não é tão invencível, a cidade não é tão maravilhosa às seis horas da manhã e após enfrentar o trânsito nosso de cada dia, que parecia duas vezes pior, desisti da aula já que pelo horário, só chegaria a tempo de ouvir o "bye, bye...see you on friday!"
Aproveitei o tempo para resolver outras pendências.
Mudei de rota e dessa vez fui de metrô. Até que não estava tão cheio, tinha espaço suficiente para entrar com calma e poder virar o pescoço observando a calmaria comum e tediosa que habitava o local. Habitava, até que, para surpresa geral, chega um cidadão carioca, rompendo o silêncio dominante, cantando a música "fora da lei" em volume e tons propagáveis para todo o vagão. O cidadão comum que acordou se achando o Ed Motta, atraiu a atenção e o estranhamento de todos ali presentes.
A senhora com cara de "tô brava", lançava olhares de fúria, decerto achou um disparate a coragem e suposta má educação do rapaz. O engravatado olhou com cara de reprovação, repassando bravamente as folhas de seu jornal. O nerd afundou ainda mais a cara em seu livro de "alguma coisa chata demais" certamente sentindo vergonha pelo rapaz que, não só cantava, mas insistia nos "paradibirudubuaê" típicos do Ed.
E eu? Eu só conseguia rir. Rir dos "paradibirudubuaê", rir da naturalidade em que o rapaz levava aquela situação e principalmente da reação ao redor.
Me recordei de um episódio do programa "De cara limpa" em que o ator-humorista-músico-autor e corajoso Fernando Caruso entra no metrô vestido de mulher e dança na barra de aço, realizando uma inusitada e divertida performance de pole dance para surpresa, estranhamento e simultaneamente risada geral.
Trata-se de um programa que visa desmistificar as regras do marasmo, levando humor e descontração a locais públicos onde a tensão ou o tédio imperam, assim, na cara dura, ou conforme o nome, de cara limpa. O que é sensacional, eficaz, positivo e porquê não, construtivo em tempos de estresse coletivo e certeiro. Em tempos de correria e agitação trivial, desatenção aos detalhes cotidianos, ao que é essencial. Um momento pra sorrir, um momento pra romper com as barreiras invisíveis do silêncio, doa a quem doer, custe os olhares insatisfeitos que custarem.
Momento pra respirar leveza, diminuir o ritmo. Despir as vestes da formalidade, dos bons modos, ser quem se é quando ninguém está vendo, mas quando todos estão vendo. Coragem? Sim, e autenticidade.
Me remete a uma citação de um dos meus escritores preferidos. Luis Fernando Veríssimo disse "Mas eu desconfio que a única pessoa livre, realmente livre, é a que não tem medo do ridículo". Eu concordo. E o moço do metrô também.
Não saber.
Não há nada mais irritante do que respostas não-respostas.
Engarrafamento irrita, trânsito de sexta-feira, buzina ignorante, gente contraditória, fila que não anda, vizinho com rádio potente e nenhum bom gosto irrita.
Falta de educação, respostas atravessadas, atitude desnecessária, tudo isso. Mas nada mais desconcertante que um "não sei".
"Não sei" é termo que não vale, "não sei" não é resposta, "não sei" não é cabível. Falo daquele "não sei" inteligente e esperto não o desprovido de informação.
Aquele que é parente próximo do "talvez", vizinho do "pode ser", amigo fiel do "quem sabe".
"Não sei" não rende assunto, não dá chance nem esperança. Não dá audiência. É preguiça, provocação.
"Não sei" é arrancar as páginas de possibilidades e reflexões de um livro bom, é posição de impedimento, é tirar o corpo fora. Puro descaso, covardia. O boicote das justificativas. A alergia dos práticos. A úlcera dos ansiosos.
É ter todas as respostas guardadas, preparadas, apontadas e ainda assim se esquivar. Ter a mancha de um crime nas mãos e negá-lo.
"Não sei" é a fuga dos que não se comprometem. É vazio de sentido, tentativa frustrada de absolvição. Inconveniente, conservador, teste e tortura da paciência.
"Não sei", piada mal contada. Cretina, infundada. Se esconde atrás da sombra e do suposto respaldo das abstenções.
"Não sei" compactua com o "porque sim" e o "porque não" como escape de continuação do asssunto. Simbióticos e injustos. Tenta parar o trânsito da prosa, mas é atropelado pelas interrogações.
É a pressa e o pecado da língua insana, o tormento das personalidades combativas, o desespero dos descordantes.
"Não sei" é a negação do recurso. Não remete ao passado e não liga ao futuro, é a pedra no caminho da decisão, a pedra no sapato dos objetivos.
"Não sei" como comodismo, escolha mais conveniente.
Nada bobo o "não sei", bastante sábio. Um perigo, um abuso. Deveria ser censurado, abolido, abortado. Ahhh o "não sei"... descabido e desnecessário!
Responda "não sei" pra mim e prepare-se para o show de questionamento. Tenha certeza de sua resposta, de sua falta de posição. Esteja seguro e armado. Armado de argumentação.
Meu amor é desobediente. Que fica quando mando ir embora, que não foge quando o tempo fecha. Que me cala a boca com beijo de cinema, que ouve atento quando descarrego meus discursos. Meu amor é desobediente e sabe se verter. Diz que pra cada versão da minha teimosia, tem uma dose nova de sentimento. Pra cada anúncio de cansaço, um motivo a mais pra cultivar e cuidar do que é raro de viver. Não sei de onde tira essas coisas, desconfio que rouba meus livros. Aqueles que falo pra não mexer.
Mas não, desobediente que é, mexe com meu mundo e o coração.
"Pensa comigo, meu caro. Não há motivo pra essa birra agora. Se ela tem um lado que arde e expressa ciúme, é porque cara feia não lhe convém. Se reclama do seu cigarro, é porque te quer bem. Se te cobra mais tempo junto, é porque o muito é pouco quando se está junto de quem faz o tempo e o pensamento voar. Se não te procura após uma briga, não é castigo, meu amigo, ela flerta com a saudade. Quer ver se te inquieta também.
Nos dias deste silêncio bobo, fez uma carta contando tudo que adora no teu jeito, revelou aquela foto na praia, comprou seu bombom preferido, ensaiou o beijo mais bonito.
Você me pergunta se no meio desse orgulho desnecessário ela ainda pensa em você? Cara, desconfio que ela te ama."
Borboleta. Que se instala no corpo inteiro, não apenas no estômago como o habitual. Vistosa e incansável. Vaga por espaços inpensáveis. Ronda por capricho um campo de sentimentos já obsoletos, reaflorando desejos abandonados. Seu objetivo? Inquietá-los, cobrar-lhes qualquer atitude que ligitime sua razão de ser.
De aparência leve e supostamente símbolo da liberdade, na verdade, nos tira o ar, devasta nosso jardim e deixa algumas pétalas na porta para também se fazer recordável, a opressora. Saudade, a hóspede non grata.
Todo apaixonado é meio bizarro. A outra metade é só ausência de lucidez, tenho quase certeza. Apaixonados, esqueceremos a fome, o sono, as horas do mundo. Desmentiremos a agenda lotada. Moveremos aqueles compromissos marcados cautelosa e antecipadamente. Reagendaremos as missões mais impossíveis em nome da paixão, enquanto até mesmo todo o tempo ocioso já terá dono, o pensamento no outro.
Apaixonado é mesmo urgente, exigente, isento de razão. Um ser recém contemplado pela inspiração. Com toda a simplicidade e fé de quem aposta em fazer o sentimento crescer, inventará que o pra sempre é pouco. Decretará nova opção.
Inventará de amar pra sempre e mais um fim de semana.
Soube que te amava, não quando te quis pra toda vida mas quando te queria em todos os meus finais de dia. Pra te ouvir mesmo cansada, pra te esperar acordada, pra ter e receber o colo que só a gente sabia se dar. Refletir o presente, ser encaixe perfeito, repouso e divã. Soube que te amava por de repente me ver carregar suas dores e tornar meus os seus conflitos sem ao menos sentir o peso deles. Percebi que era amor pelo jeito que você me fazia rir. Não das suas piadas mal contadas, mas da sua forma de ver a vida, serena e traduzível.
Me recuso a viver a vida sem o sonho como abre alas.
Não se trata de ignorar a realidade. Dessa não fujo e me rebelo quando preciso.Também não se trata de ver a vida em tons otimistas que cintilam frases prontas de motivação. Não é por aí, vai mais além.
Vai das idéias que acredito. Dos topos que almejo. Dos nãos que transformo em talvez. Dos exemplos de gente que vence, apesar das tribulações. Gente que inspira o paradoxo de força e leveza e prova que é possível.
Do cansaço recorrente e das poucas coisas de que tenho certeza, admito, assino e repito como um mantra: velha demais pra ilusões, nova demais pra desistir.
O pensamento é turbulento, o coração é calejado, mas o fim da linha é um sonho alcançado e a ousadia é a força motriz, e eu sei que não teria paz um minuto sequer na vida se desistisse de acreditar e seguir assim.
É assim que vai ser. Pra maldizer a distância e desmentir a rotina, a gente vai preferir o fim e o início de cada dia, assim, em par. Pra provocar o tédio, desafiar a constância, pra garantir um bom dia quando o dia seguinte chegar.
O presságio vem com os próximos gestos. Aqueles inesperados e certeiros que nos fazem querer ouvir o mesmo blues pra sempre. Querer assistir "Before Sunset" pra sempre. Desejar beber aquele suco de laranja com morango por todas as manhãs, se preparados por ele, que chegou sorrateiro, ficou sem permissão e entre flores, filmes e pores do sol, sugeriu um futuro bom que você já desacreditava pelo clichê do medo.
Até que o coração, companheiro valente ou belo tratante, mostra que não é à toa que é chamado de músculo involuntário - soma-se aqui afobado e inconsequente - e te manda o sinal de que há algo novo causando seus descompassos. E desta vez não tem a ver com bloqueio da válvula mitral, crises de estafa ou de ansiedade.
Você se apaixonou novamente.
Dia Inteiro
Pense num dia em que seu rosto já acalenta o cansaço semanal, que os bocejos são contínuos, que a palavra faxina é capaz de abalar a sua psique. Pensou na segunda-feira? Errou.
Meu dia de ócio é o domingo. Vontade de fazer nada, dia de contemplar o teto. Não tem praia, festa em família e nem balada que me tire do ninho. Me convide às sextas. Barzinho, cinema, música. Emendaremos os sábados. Mas olha, domingo, não.
Sabe aquele dia em que a sua maior vontade é de usar pijama o dia inteiro e esquecer de que tem cabelos para pentear? Pois então, bem vindos ao meu dia de domingo. Perco toda a vaidade.
Inútil também arrumar a cama. Lá acordarei e regressarei por diversas vezes ao dia. Quase me transfiguro em sessão das grandes lojas: cama, mesa e banho.
Aos domingos sou metade. Uma metade inteira de preguiça. Gosto de cozinhar mas preferirei comida pronta. Atualizarei minhas leituras, me entupirei de telecine. Nada de ponte Rio- Niterói, nada de trânsito, relatório, telefonemas, clientes. Muito mais que descansar da correria da semana. Preparar-se pra mais uma.
Após tanta moleza, guardo energia pro desfecho. O único esforço é o do final do dia, vencer a batalha de posse do controle remoto: “Fantástico versus Pânico na tv”.
Agrego minha cunhada como aliada pelas notícias. Meu irmão e namorado ficam no time oposto, prefiro acreditar que só pra nos contrariar. A disputa é acirrada, cheia de argumentações. E mesmo de meias, mesmo descabeladas, vencemos.
Benditas sejam a inteligência e a articulação feminina. Forças renovadas para a nova semana.
Não quero os amores mudos, que poupam expressões. Sou adepta dos telefonemas fora de hora com todos ou nenhum motivo pra acontecer, do cuidado cotidiano, do ócio compartilhado, dos beijos, abraços e amassos desavisados, não como selantes de uma briga mas como partes dela, contraditoriamente etapas de um confronto. Afetos e afagos em banco de praça, acampamento no meio da sala, dança improvisada. Declarações imprevisíveis, inéditas, impensáveis até pelo próprio fomentador, traído pelo coração tagarela. Dispenso os que se economizam.
Eu prezo é o amor que é gasto com prazer, que é escasso, raro e inquieto. Tenho preguiça do que é a prazo, do lento, do morno abrandado com soprinhos. Faço passeatas é pelo amor singular, especial, que tem pressa, fome e sede de ser. Não pra ser breve mas porque não se contém.
Não sei se viro menina, se viro mãe, se viro todas. Se viro artista, se viro vento ou viajante. Viro santa ou viro doida. Quem sabe viro onça. Viro a mesa, viro o jogo, viro a página, viro a vida do avesso e viro outras. Sim, eu me viro.
Nenhuma queima de fogos promete um futuro iluminado. Nenhum ponteiro marcando meia-noite transforma quereres em realidade. Nenhum ano novo garante uma nova vida. Se o coração deseja mudanças é preciso trocar mais que o calendário. É preciso abandonar medos e encarar desafios. Driblar velhos hábitos e arriscar novos voos. Deixar de esperar que os próximos meses surpreendam e surpreender a si mesmo. Acreditar e seguir. Sonhar e ousar...
Não espere que eu seja contida. Minhas emoções extravasam minhas bordas, borbulham na superfície, transbordam de mim.
Expresso o que me toca. Não me peça pra ser impassível. Sou feita de sentir. E meu sentir faz bagunça, sobe no palco, salta do peito.
Gosto de viver assim: des-me-di-da-men-te-a-pai-xo-na-da.
Quisera eu, ser feita de silêncios. Daqueles que restauram e espelham. Daqueles que traduzem. Tem muito barulho por aqui. Tem o riso solto, a alegria escancarada, a música alta. Tem a vontade de realizar e uma implicância danada com essa coisa de se bastar. Uma fé infantil no futuro.
Sou feliz e grata com a vida que tenho mas vivo seguindo o conselho de Fernando Pessoa: não acostumo com o que não me faz feliz e revolto-me quando julgo necessário.
Não sei fingir sentimentos. Não sei ensaiar simpatia. Ainda não aprendi a ignorar o que me ofende, me acomodar com o que incomoda, usar o silêncio como suposta superioridade e pseudo-atestado de controle.
Jamais conseguiria, vivo à flor da pele, obedeço o coração. Meu riso será indecente quando surgido, meu questionamento será inevitável quando provocado, meu choro, um convite: me conheça.
Me faça surpresas, me leve para ver o pôr do sol. Sou cativada por detalhes, uma encantada por pequenices. Me escreva qualquer frase que combine com o seu querer, apareça do nada e me presenteie com cheiros, com cores, com vinho, com móbiles e palavras.
Não é difícil me fazer sorrir.
Não me queira cética. Acredito em milagres, em intuições, em abraços e em declarações de amor. Desacreditar seria desistir, seria entristecer. E eu recuso todo e qualquer convite da tristeza. Alegria é o que me inspira. Emoção o que me traduz.
Acreditar é o que explica a minha vida.
Me faça convites, me conte uma história. Vamos deitar numa pedra e admirar o céu sem procurar saber da hora. Meu relógio pára numa prosa em boa companhia.
Espere de mim ideias, perguntas e também respostas. Respostas gentis, atenciosas, debochadas ou tortas. Tem opção para todos os gostos e reciprocidade para todos os gestos. Mas não espere de mim amarguras. Não confunda a minha receita. Tenho doses de doçura e pimenta para muitas porções, mas nunca cultivei o rancor.
Espere de mim o perdão, o pedido e o concedido. Sei reconhecer minhas falhas e acredito em qualquer um até mesmo depois que me prove o contrário. Sei dar segunda chance a quem merece, a quem faz valer a caminhada. E assumo todos os riscos. Prefiro assim do que me confortar com serás. Sou adepta do tentar e também do refazer.
Conte comigo, te dou meu ombro e minha sinceridade. Chegue mais perto, pegue na minha mão. Divido meus sonhos contigo, te empresto meus discos e meus livros. Me dê conselhos, me dê espaço. Repouso no teu colo e te conto a minha história. Tenho essa mania errante de me espalhar por aí.
Não tenho muita paciência, releve esse meu pesar. Não tenho vocação pra viver a conta-gotas. Me instigue mas não me provoque tanto. Me queira serena, quieta, satisfeita. Tenho febres elevadas, desejos insaciáveis, tenho coragens infinitas quando desafiada.
Tenho a mania de deixar o desaforo da porta pra fora. Sabe aquele texto da Martha Medeiros que diz: "Não grite comigo. Tenho o péssimo hábito de revidar"? Pois é. Se eu pudesse, estenderia a mão e diria a autora: bate aqui. Meu maior defeito talvez seja este. Minha defesa primeira.
Conte com a minha bondade, abrace o meu afeto mas não subestime a minha mansidão. Não apronte comigo contando com a minha suavidade. Ainda não aprendi com a sabedoria daqueles que deixam pra lá, não compactuo com aqueles que se contém corroendo por dentro. Nessas horas extravio a educação bonita que mamãe me deu e sigo concordando que respeito é pra quem tem.
Pareço vento e de repente eu seja mesmo. Mas veja, sou simples de se capturar. Meu parecer talvez seja este: eu simpatizo com os urgentes e me recolho na intensidade. Suplico a paciência e enlouqueço na espera. O talvez não me responde, o quase não me convence, o "não sei" me sufoca o peito e me arde toda.
Eu vivo é de quereres, insaciáveis e emergentes. Reciclo minhas coragens e não confiro a temperatura da água. Eu mergulho. Inteira. E descubro que sei nadar.