Whendel Silva
Eu tentei. Tentei dizer que você já não fazia parte dos meus planos. Que o hoje é apenas o ontem de amanhã, os dias vão passar, a roupa vai secar, não vou deixar nada no varal. Mas o mal é esse, eu te amo. O mal é o teu cabelo assanhado pela manhã, a tua cara de quem pede mais dez minutos na cama. As nossas divergências, aquela coisa de bossa nova e rock'n'roll. O seu amor por sol, praia, dançar. O meu egoísmo, a cara fechada, a vontade de ir embora. A tua pequenez, a tua maturidade. A minha pouca idade, vivida em mil livros lidos. O teu sorriso espontâneo, decifrável, preciso, a gota d'agua para minha fragilidade. Eu juro, tentei! Mas o hoje seria a minha inquietude de amanhã.
Amanhã, talvez, ainda possamos acreditar no infinito, na eternidade. Amanhã, quem sabe, dois corpos ocupem um mesmo espaço, ou o universo gire em torno de nós. Eu sou, até quando estou de longe, um objeto comprimido em átomos. Nada mais e nada menos, que o resto de estrelas. Sou uma super-nova que durará por oitenta anos, ou quem sabe, se eu virar essa esquina, eu morra atropelado, assassinado, executado por um simples tombo no chão. Nós fomos feitos para cair, milhares de anos, para aprendermos a cair, a delfinhar em nossas pequenas riquezas, a sentar num trono de sujeiras, a envesgar os olhos para enxergar apenas o nosso próprio nariz, e é nisso de não olhar para frente que você acaba caindo. Apesar disso, tenho andado olhando para baixo, fixado numa psicose, olhando para os meus pés, e perguntando para onde vão me levar, eu quero saber, por direito, para qual lado meu corpo vai tombar. Quando eu vou explodir também? Eu não vou morrer, gente! Mas na minha lápide, por favor ou amor, gravem meu melhor verso.
- Whendel Silva