Thaysminy Marques Coelho

Encontrados 4 pensamentos de Thaysminy Marques Coelho

⁠Como é que se começa uma carta para mãe? "Ei, mãe?" , "olá, mãe!", "como vai a senhora?"
Bom, acho que me dou melhor com um "oi."

Oi...
Sinto falta de dizer que a tua comida está sem gosto, mesmo sem ter a menor intenção de ofender. Era só um dia ruim e meu paladar estava péssimo.
Falta de sentar na varanda da tua casa e perguntar como quem não quer nada o que achou daquele meu sonho da noite passada... De ti, alimentando minha fé naqueles meus sonhos juvenis. - vai ficar tudo bem. - você dizia.
Sinto tanta saudade daquelas tuas convocações, reunindo as irmãs da igreja para orarem pelo meu coração. Daquele óleo que sempre passavam no auto da minha testa dizendo me ungir. De tuas queixas sobre meus dogmas e afins...E das vezes que deixava teu cheiro na minha roupa limpa? Não devo mais ter nenhuma peça com aquele cheiro de cuidado, de horas a fio no tanque, da gripe do dia seguinte por passar horas estendendo e buscando-as no varal.

Obrigada.

Eu só não consigo sentir saudade das músicas altas às sete da manhã, mas sorrio ao me recordar... Ter que sempre sair contigo para que me apresentasse aos teus amigos. - ah, essa é a minha menina. Sabiam que ela vai gravar um CD? Canta para eles, filha aquela tua música! Ela compõe também. Felipe, vá buscar o violão pra tua irmã. Ela chegou de Brasília há duas semanas. Vai morar comigo agora. Finalmente Deus me devolveu ela. Dias com esse joelho dobrado pedindo por essa Vitória. Olhem como ela é bonita, cresceu tanto. Só fico triste por terem cortado o cabelo dela. Era tão grande. - mas tudo bem, estamos nos conhecendo ainda. Hoje, não quero mais gravar aquele CD. Acho que devia te dizer. Há anos que não componho.

Eu gosto de escrever. A senhora não vai me ouvir nos rádios como sei que até hoje espera. Descanse disso. Mas quem sabe, se um dia resolver ir até uma livraria, me ache perdida numa prateleira. Vais saber que apesar de tudo, eu te amo. Sinto a sua falta todas as vezes que me pego lembrando da doçura dos teus olhos.

Desculpe não ter atendido.

Às vezes eu preciso preparar meu coração.

⁠Os olhos verdes dela são abençoados como as nascentes da Costa Verde Fluminense,
fluindo dentro de sua cabeça extraordinária.

Há tanta vida ali, quanto aqui fora.

E quando ela põe eles em cima de mim,
quando eles se dilatam e eu consigo ver as bordas do universo se dissipando em todo o seu globo ocular,
eu me sinto abençoada.

Obrigada - eu digo na minha cabeça.- Seus olhos são lindos. A alma que sai da sua boca, quando você fala, também.

⁠Céus e terras, os astros lá no alto do meu prédio; uma coruja comendo besouros no ar, próxima ao poste de luz, enquanto ela esfrega o rosto dela em meu torso. Aqui do alto, os meus dedos, mais leves do que uma pena, roçam dançantes sobre sua coluna. A coluna. A coluna que sustenta o cóccix. O quadril. A montanha. As coordenadas do Monte Fuji escondidas sob a pele.
Ela finge assistir à TV enquanto afunda cada vez mais a sua cabeça no espaço curvo do meu ombro. Penetrando a minha pele pelos fios do cabelo. Primeiro. Sutil e elegante como tudo que eu gosto nessa terra. Como todas as coisas mais divinas dessa terra.
Eu fecho os meus olhos como em uma prece. Pelo amor de Deus me toque mais fundo. Fundo. Dentro de mim. Traz esse cabelo pro meu nariz, dentro do meu olho, suado na minha boca.
E então minhas preces são ouvidas.
Ela traz o braço comprido até a minha barriga, afundando a ponta dos dedos cada vez mais duro na carne. A digital na altura da minha vesícula, sendo carimbada até o meu peito direito, descendo, procurando pelo Ílio. O apertão curva perímetros da minha pele sob a pele dela. O encaixe. O calor subindo das veias entre o Carpo até a Falange. E eu só continuo pedindo de olhos fechados, pelo amor, não me solta. Coloque dentro de mim as melhores partes de você. Coloque a respiração quente e arfante dentro do meu ouvido. Esse olho castanho esverdeado, desaguando e cerrado sobre o meu nariz, pedindo a Deus para enxergar com os dedos onde, onde dentro de mim você consegue ir mais longe. Onde as cores vibrantes brotam da minha córnea. Onde toda a minha energia pulsa em sua mão. Vai. Pede para Deus pra te aterrar na minha cintura. Ofegante. Enquanto você me faz beber da sua saliva e entrar no buraco escuro da sua boca. Eu peço, aterre ela na minha cintura, planta essa sua matéria no espaço onde o mais doce jorra de mim. Onde a vida nasce em todos os sentidos.
- 23/11

⁠Moramos juntos por uma primavera.
Foi o nosso acordo até ela se restabelecer na cidade.

-me avisa quando você quiser ir lá em casa. - e desapareceu porta afora.

Rápido,
porque nós dois somos péssimos pra despedidas.

Pronto!
Agora as tampas
dos tubos de pasta de dente
ficarão enroscadas.
O sofá,
absolvido das toalhas úmidas.
A louça,
protegida pelo armário
e salva dos escorredores.

Tudo no seu devido lugar.

Agora que estou sentado e bêbado penso sobre essas coisas.
Me sinto aliviado,
mas meus olhos parecem molhados e alguém está apertando a minha garganta como quem faz um suco de limão.

Malditos acordos que chegam ao coração.