Saroo Brierley
Às vezes, é difícil não imaginar a atuação de forças que me fogem à compreensão. Ainda que eu não sinta nenhum impulso de converter isso em alguma crença religiosa, sinto com clareza que, de um menino perdido e sem família até um homem com duas, tudo estava fadado a acontecer exatamente como aconteceu. E esse pensamento gera em mim um profundo sentimento de humildade.
Minha volta parecia inspirar e energizar a vizinhança, como se fosse um indício de que as vicissitudes nem sempre prevaleciam na vida. Às vezes, milagres acontecem.
Parece que uma característica da nossa família é conter as emoções até acumularem tal pressão que não haja outra saída senão libertá-las.
Eu havia aprendido rápido, por questão de sobrevivência, que precisava aproveitar as oportunidades à medida que elas surgissem – se surgissem – e olhar para a frente.
Uma parte de mim já tinha aceitado isso. Aquele desespero incrédulo de voltar para casa, que eu sentia logo que me perdi – aquela sensação de que, se o mundo não voltasse aos eixos imediatamente, eu não conseguiria sobreviver, não conseguiria sequer existir –, já desaparecera havia tempo. O mundo agora era o que eu via ao meu redor, a situação em que me encontrava.