Ruy Castro
Olhei para uma página e vi aqueles símbolos impressos, e de alguma maneira descobri – magicamente – que eles tinham significado embutido e um som que correspondia ao que as pessoas falavam quando liam aqueles símbolos impressos. Ou seja, eu aprendi a ler. Imediatamente, ali, me senti em casa. Fiz uma descoberta, na qual me atirei pro resto da vida. E não errei.
Considero que, quando a pessoa domina a palavra, ela domina o mundo. Passa a fazer parte do mundo. É como se estivesse nascendo de novo.
Fico imaginando o que é uma pessoa morando no seu país e não sabendo ler, não entendendo essa quantidade gigantesca de informação que a cerca, que nos bombardeia o tempo inteiro. Deve ser a coisa mais triste do mundo.
Fui obrigado a conviver a vida toda com essa dualidade: apaixonado pela ficção, de um lado, e tendo que trabalhar com a informação no dia a dia.
O biógrafo ideal deveria ser uma pessoa que um dia, talvez, também devesse merecer uma biografia. E isso significa um cara que viveu. Que andou na rua de madrugada. Que viveu a noite. Que se apaixonou, teve mulheres que se apaixonaram. Traiu, foi traído. Levou borrachada da polícia, foi preso. Se meteu em peripécias bem malucas. Que tenha tido uma doença. Que tenha sido pai.