Renato Guimarães

Encontrados 14 pensamentos de Renato Guimarães

Vila Monarca

Apelar pra quem, pra quê?
Quais ritos, rezas?
Se nem meu santo
Veio de lá com quem eu amo

Não sei o que a prende acolá
Se é a cidade que é velha demais
E agora que revê alguém daquele jeito

Até entendo se suas calçadas a fazem tropeçar
Ou agarram suas canelas na saída da vila

Se seus velhos assombros
Se soltam da mata
Só pra mantê-la assustada naquelas vielas

Ah mas dói agora, que minguam minhas crendices
E o que sei dos causos
Vai amarrando um nó na minha garganta

Será algum amor?
Que raça de amor será?
Com que artifícios a segura tão bem nas mãos?
Que nem minha fé gritando a alcança?

Carestia

Prazer sou o desgraçado
Pelo jeito que me falam as palavras
Como os olhos que quero, me fogem
Como acordo sem feromônios e azarado

Mas ao inferno todas as doces línguas que não me vem
De toda maneira que se tem
Sou só e assim mais feio que o disforme
E meu andado destoa, pois a rua parece que morde.

Sacra constituição

Cravei com Deus
Umas novas leis
Pros meus sonhos
Ai ele me deixa sonhar,
Do jeito certo

Funciona assim
Eu sou só pele
E pra flutuar
O que tenho por dentro
É o que pensam almas notívagas

Delas me vem um tanto de malícia
Que atravessa e respinga paixão
Ai vou longe sobre o urbano e o rural
E nada de sentir dentes caindo

Ou o susto de cair de um arranha-céu no colchão
Assim furto de todo o resto pra ir te visitando!

Sólido Olhar

Tem seu olhar que se deita sobre mim
Incumbido de me sucumbir
Quando ainda lhe resta minha poeira nos cílios
Nessa guerra só é certeira minha poesia dos seixos e ciscos!

Arrefecer

E depois do fim, do frio na barriga
De quem cai de amores
Eu volto pra casa com músculos doloridos
E então o sangue esfria, e os espasmos correm
E a dor de hoje cobre a de ontem.

Anti- horário

Espera conheço esse sabor!
Já vi esse olhar derreter e empedrar
Vivi essa tarde nessa mesma cor
O azedo já ferroou minha boca, deu a volta e adocicou
Me vieram espíritos violentos nos melhores perfumes
E usei de meios lascivos, para os fins mais carinhosos
Tudo errado, contrariado
De cá pra lá!
Feito das tripas coração.

O Estro

Por um olhar, e os traços o contornando
Como as madeixas descem
E suavemente ascendem
Como pergunta
Na testa, nuca e orelhas
Enrubrescem minhas bochechas
Esmurram-me o estômago.
Pra que eu volte aos olhos me perfurando.

Onisciência

Deus tu que sabes bem
Aos pés de quem, e de que cama quero estar
Por favor distorça meu pobre caminho
Tu que conhece os corredores por vir
E a mão que escolho pra me puxar
Dentre as ironias nos deixe passar
Pois um tanto por ela e outro pelo paraíso
É que o inferno ruge e se contorce.

O Anatômico

E foi dito que ele se mudou
Para os grânulos de fordyce dela
Lá nos risquinhos daqueles lábios
No abismo e nas raízes daquelas íris
Agarrado aos poros de sua pele
Um encosto regozijado e assustador.

O frascário amor

Forasteiro, vermelho, cru que assanha!
Dá um tanto de hiena
Leva um pouco de cidadão

Grito uníssono aterrador,
Lá de onde vem
Mas sensual aqui

Nos segue e o seguimos,
Desde a infância a sequidão dos seios da morte
Por vezes só pela pureza e realidade em um beijo.

Foragir

Ah eu já não sei o tanto de dor que tem que doer!
Que encruzilhada e aperto de mão eu busco pra lhe esquecer
Na vastidão que esse mundo tem, ninguém me esconde de você.

Emancipada

Nesse município beleza nenhuma alcança a dela
Descendo a rua, como faca que risca a nata sobre o leite
Até o meio dia se intimida, nubla e segue em seu encalço.

Arcaica Alma

Ai de minh'alma velha destituída de par
Que faz minha carne sentir o que está
Onde os idiomas não vão
Solta meus olhos do trânsito
E os arremessa ao horizonte
Sem nada querer ou precisar.

Sra. Solidão

Oh posso sentir no tutano de meus ossos!
Como estalos de chamas lambendo capim seco
Do cerrado que me pariu
Como chuvas que sobre fazendas vão mais violentas
Ou pior, a geada velha, caquética, incomum
De flácidos braços que me constringindo, me constrangem.