Ramon D. Souza
Um mar vermelho
Durante o dia as pessoas não vêem o que está em sua frente.
Eu vejo, são elas mesmas discutindo trivialidades
Em busca de uma saída para a sua rotina carente
Quaisquer assuntos onde têm afinidades.
Mas, debaixo de seus capuzes e máscaras que escondem seus rostos
Sabem que queriam estar em outros lugares fazendo outras coisas.
O que não entendem é que nós somos tão opostos
A ponto de dizermos mentiras adversas.
O que eu vejo são fantoches com seus movimentos padrões,
Pessoas feitas de almas madeirizadas,
Com cristais e jóias no lugar de seus corações.
São facilmente influenciadas, dissimuladas.
Nas histórias havia apenas guerras e escaramuças.
Hoje, um mar vermelho de coisas obscenas e indecentes
Arrasta tudo o que é limpo e inocente do litoral de esperanças
Para a profundidade de seres incongruentes.
Atração
Sei que o corpo é tentador, mas não.
Sei o que está pensando, mas não.
Sei que quer tocar, mas não.
Sei que quer analisar cada detalhe, mas não.
Não caía nessa tentação, pois ela é fatal.
Não olhe com desejo guloso, pois isso vai te decepcionar.
Não toque demais, pois vai se assustar.
Não se aprofunde nos olhos, pois de lá não sairá.
As pessoas são belas, verdade.
São inteligentes, quando querem.
No entanto, são humanos que com certo desdém agem.
Se algum dia acontecer, não leve a sério.
Se algum dia repetir, não continue sem pensar.
E se for algo a mais não deixe ser só atração.
Santuário
Eu vejo o verde escuro do gramado falso tentando imitar o que aqui não existe.
Eu vejo os prédios cercarem as árvores como se fossem caças.
E o céu é coberto por nuvens cinzas, contaminadas pelo gás carbônico.
E as estrelas, essas sim eu quero admira-las, ainda permanecem intactas.
A lua parece ter se assustado com a destruição da Terra e em anos se afasta sutilmente, enojada e melancolica.
Os animais parecem estar em extinção e os que restam são domados ou comidos.
As plantas estão crescendo em esgotos e lugares imundos, elas crescem imundas.
E o que costumávamos chamar de água potável está se perdendo aos poucos enquanto nos banhamos nela.
Agora só falta pouco para os seres humanos perceberem que aqui não é o lugar deles.
A Terra é, ou foi, um santuário e nós deixamos de ser abençoados quando cortamos nossa primeira floresta.
E o que será do Azul dos lagos, oceanos, rios e lagoas?
O que será do Verde das plantas, das árvores, do gramado?
Só vejo o Vermelho do sangue.
O Cinza da poluição.
A cor artificial das roupas, prédios e carros.
E só sinto o Santuário sofrer e apodrecer.
Questão da conexão
Havia uma época em que as pessoas eram mais banais. Havia um tempo em que a rotina era mais flexível. Havia alguém sempre com uma ideia nova. Havia naquele tempo,naquela época, apenas havia.
O mundo mudou - é o que irão dizer. E, talvez, seja verdade. Mas, se você observa as coisas como se fosse o espectador de um filme ou uma série de TV sabe que tudo está conectado e nada avança ou muda sem uma outra incógnita.
Toda história têm três lados. O primeiro seria você, aquele lado onde sofre a ação e procura maneiras de resolver tal problema. Você seria o passivo. O segundo é a ação, o ato de uma outra pessoa, de um evento, ou seja, a situação. Este lado é o ativo. E por fim o terceiro lado, quem observa. Pode ser uma entidade, uma pessoa, um animal ou até uma câmera. Este lado apenas assiste. É claro, tudo depende do seu ponto de vista.
Tenha em mente que o terceiro lado de uma história está por toda parte e é a testemunha das suas escolhas. Esse lado rege o conhecimento, ele pode, sem sua permissão, ser o segundo lado. Por isso é importante ver uma situação de todos os ângulos possíveis.
Havia. Houve. Haverá. Passado, presente e futuro. Tudo não importa se não existir conexão. Afinal, o mundo como o conhecemos é feito por conexões, por pessoas. O mundo muda, talvez, mas as pessoas dependem da conexão entre elas mesmas e a natureza.
Rei de Todos - Uma canção sem rimas de alguém que sabe o que é
Quem é que faz o que ninguém mais quer?
O Rei dos Tolos
Quem é ignorado por todos?
O Rei dos Tolos
Quem não é importante nessa cidade?
O Rei dos Tolos
Escutem, escutem o que vou dizer:
O Rei dos Tolos existe e ele está aqui.
Sempre leva a culpa dos erros idiotas e bobos dos outros.
É o primeiro a cumprir algo desnecessário.
Ele é o Rei dos Tolos que nunca foi ouvido e está aqui.
Mudo, acusado de surdo.
Observador julgado de cego.
Ele é o Rei dos Tolos.
O Rei tem algo a dizer, escutem:
Não sou rei, não sou tolo, por que me nomeiam assim?
Faço o que me pedem e quando erro sou o pior ser de todos!
Sou o que sou, aceitem, estou me cansado de ajudar.
Perderam as chances de se redimir agora quero suas insignificantes vidas
Enforcados, esquartejados, mutilados e estuprados.
Não sou o "Rei dos Tolos", mas serei seu fim.
O Rei se zangou, agora temos um grande mal.
Quem é que castiga os que erram?
O Rei de Todos
Quem é que mata os que desonram?
O Rei de Todos
Quem é que destrói tudo que amamos só por existimos?
O Rei de Todos
O Rei dos Tolos morreu,
Sou agora o Rei de Todos!
Noites tempestuosas
Esses dias atormentados que se passam são entediantes
Cada homem, cada mulher e cada criança vivem na mesmice
E nenhuma diferença é feita pois no mundo cinza que estamos a cor é um crime.
Só uma mudança forte o suficiente é capaz de deixar as rotinas mais abençoadas
Porém ela não irá acontecer tão cedo assim.
Enquanto esperamos sobrevivendo as noites tempestuosas
Enquanto a Arte se baseia somente na arquitetura e tecnologia
Enquanto o exato é o que importa e o imaginário é apenas subestimado
Sobreviveremos a mesmice que nos assola.
Por enquanto contentam aqueles às belezas da natureza
Ao mundo que ainda não foi totalmente poluído
Somente aqueles que não se influenciam pelo que vêem
Que não escutam o padronismo igualitário do ser humano
Que sabem o verdadeiro significado da diferença e da mudança
Podem mudar o mundo.
Eles se escondem por causa da nossa opressão e egocêntrica crença.
Somos animais acorrentados pelas nossas próprias mãos.
Somos árvores que se cortaram.
Somos peixes que se afogaram
E artes que se mancharam.
Somos humanos que não sabem o que é ser humano.
E por isso sobrevivemos as noites tempestuosas e solitárias que nos assombram.
É por causa da nossa força de vontade que nós não enjaulamos nossa alma.
O nome é vida
O sol que não me pertence
A lua que nunca foi minha
As estrelas que observo
E a terra na qual eu vivo.
O mundo onde há a minha água
O solo onde eu fertilizo
Os animais que eu cuido
E os caminhos que eu crio.
O fogo que me machuca
A escuridão que me sufoca
A depressão que me enfraquece
Sou frágil e sou suportável
Temo o meu oposto, a morte
Chamo-me vida, prazer em fazer você existir.
Tribunal do outono
Não sou frio, nem quente.
Sou um meio termo, uma sensação.
Não sou exato, não sou gente.
Sou o júri que não escuta a emoção.
Sou justo, mas posso me alterar.
Quem me dera saber dos fatos
Assim poderia julgar sem pensar.
Sou o juiz que ouve os mais calados.
Sou a chama alaranjada
Que toca às árvores com a minha vontade
O servo da justiça com a mente afiada.
A sentença em uma única estação,
O vento que assopra a verdade
Sou o outono de um tribunal sem coração.
Soneto de ninguém
É o silêncio que nos domina
É a arte que nos mantém lúcidos
É a guerra que nos intimida
Mas, é a bondade que nos mantém puros.
É o poema de alguém
É um insulto que nos separa
É a destruição que é vista do além
Todavia, é a razão que nos ampara.
É o cataclismo de uma civilização
É a pureza de uma criança
Também é a salvação
É o otimismo que gera esperança
É feito por nós e tudo que nos contém
Apenas um soneto feito por ninguém.