Rafael Sorano
reconhecimento ao favor do amor
Obrigado por existir
Por aceitar sua existência
Por me emprestar sua presença
Por me amar
Sou-lhe grato por tudo em mim
Pelo que me permite sentir
Pela delicadeza do que sente
Por consentir te amar
Agradeço-lhe a entrega
Ter vencido as dores
A coragem de suportá-las
Por coabitarmos a superação
Sou-lhe agradecido pela gentileza da fatalidade
Sou-lhe grato pela promessa do que há de vir
Obrigado por existirmos juntos
Por irmos além
Houve quem pensasse que nunca chegaria ao fim de tão grande. Eles mesmos pensaram. De certos que estiveram, nunca mais se olharam de verdade. Aquele olhar que enxerga dentro, no fundo d´alma. O tempo passara e já não eram eles. Desfigurados, indeterminados, não sabiam quem eram. Na história que viveram, cada um se tornara coisa sem importância de ser, de ver. Esqueceram até quem foram para ser do outro. Como que fundidos num, um não foi sem que o outro fosse. E foram, então, juntos, além. Os sonhos eram únicos, assim como mesmos eram em si. Não conseguiram saber onde um queria e o outro não. Indignaram-se, querendo, que uma porção pudesse não querer. Deixaram de querer para quererem. Quiseram tanto mais do que quereriam. Ou menos, outras vezes. Assim, sem se reconhecerem insatisfeitos, indivisíveis, viveram sós. Decompondo-se, viveram combinados, fatalmente compostos. O tempo passara e já não eram eles. Não eram eles. Contornara-se um outro no lugar. Renderam-se ao outro como se dispuseram à disposição um do outro. Chegara o tempo quando o outro, esse sim, se tornara a quantidade exata deles. Naquele tempo, ainda pensaram que não chegaria ao fim de tão grande. De tão grande, não se contiveram em nenhum. E insistiram mais. Estruturara-se na fragilidade deles um outro que não era ninguém, que anulara os dois. Não se viram e não se sentiram até que não se tiveram por completo. Não se tinham há muito. Nem sabiam mais o que era ter. Nem pensaram nisso. Só reconheceram e tiveram e eram um outro. O outro que se tornaram sem eles.
Sem Você
As noites são longas e as madrugadas são frias
O corpo dói
A alma cansa
O sentido se esvai na inexistência do motivo
A vontade acua
O gesto recolhe
O reencontro refugia a esperança
A incerteza do instante
De Beijos loucos de paixão
Aflige
As tardes são lentas e os dias são quietos
Amaldiçoada Incerteza
Quem sabe um dia os corpos celestes se descuidam e nos experimentamos.
Hoje, rios caudalosos, montanhas, dúvidas, quilômetros de estradas sinuosas nos arredam.
Como essa conexão censurada pode conformar-se? Confirmar-se? Exaurir-se?
Não sei... sabe?
Teme?
O que ficaria para trás?
E o que nos poderia vir?
Serão esses os estímulos... ou as hesitações? As hipóteses?
É aflitivo como a profusão de vida pode ser pior que a escassez.
A incerteza como ventura é a certeza da propensão.
A vida é uma só?
Quantas podemos viver em uma?
Qual valerá? Todas?
Dúvidas! Duvidas?
Liturgia Diária
Não me importa que conheça outras pessoas
Quero que conheça todas as que queira
Me importa que nessa liberdade
Todo dia siga elegendo a mim
No traslado à vida de casal
Defendo a eleição diária
Creio que habite nisso, na verdade
O espírito da relação
Não creio em frases como “para toda a vida”
Creio no trabalho que implica ser casal
Que é diário
E que um nunca saiba se no outro dia será igual
E nesse mistério
Na confirmação diária
Está para mim o segredo do amor
Duradouro
Sólido
Embora pareça exatamente o contrário
Não suporto obrigações
Nem que ninguém as tenha comigo
Quero é que adore estar comigo
Não que seja um acordo
Esconjuntado
Vontade de avessar o feito
desestruturar o acaso
emendar o impedido
Verdadeira dor de todos os erros
inexato sentido do sentimento
do amor derrotado no acuo
Vazia via outrora plena
de largas promessas não declamadas
em transe experimentadas
Saudade de uma lacônica presença
da veemente vida vivida com ardor
ora morta pela cólera
Desvalimento do perdão
inerente martírio do não realizado
desperdiçado na implacável ausência
Aceito indulgente a despedida
conformado com o que me pertence
a dor doída do desunido
Tocá-la com meu olhar
Vê-la com meus dedos
Ouvi-la com minha boca
Cheirá-la com meus ouvidos
Contorná-la nos inversos sentidos
Em sentido contrário
Rematerializando o subjetivo oculto
De mulher subjeto
Construamos uma grande nação, façamos uma grande nação. Temos duas maneiras de atuar: ou tratamos de buscar os culpados para apenas dizer-lhes insultos nas ruas, ou aceitamos a quota de responsabilidade que cabe a cada um de nós como membros dessa sociedade e disputamos o poder contra eles.
Nessas horas em que a política tradicional e seus fiéis representantes estão em xeque-mate, é sempre bom relembrar o passado e colocar definitivamente no lixo da história o que não se deve nem cogitar como alternativa.
O uso da terra e a produção agrícola devem priorizar a alimentação humana e cumprir sua função social, com a proibição da monocultura de commodities.
As necessidades dos menos favorecidos devem ser atendidas em caráter prioritário, sobrepujando qualquer outra necessidade social, econômica ou política.
O financiamento público deve ser reservado ao desenvolvimento de uma economia social, solidária e ambiental e privilegiar as micro e pequenas empresas.
Pelo censo brasileiro de 1872, os escravos eram cerca de 1 milhão e 200 mil pessoas. Hoje, não existem dados oficiais de quantos “escravos modernos” há no Brasil, mas aproximadamente 4 mil pessoas são resgatadas todos os anos do trabalho escravo no país.
O que nos interessa é construir uma consciência democrática, uma referência democrática. Mostrar nessa democracia um projeto político distinto, de valores distintos.
No senado brasileiro, inversamente aos valores, premissas e significados do sufrágio universal, não existe impedimento, nem legal nem moral, para que um cidadão que não recebeu nenhum único voto exerça um mandato parlamentar.
É chegado o momento do fim da transição. Há 30 anos esperamos por uma ruptura que nos eleve a outro patamar, ao próximo estágio. Há 30 anos essa ruptura é prorrogada pela pasteurização do debate político vendida com o nome de governabilidade. Uma mentira que criou e alimentou a ditadura das maiorias parlamentares, sem as quais nenhum governo poderia de fato governar na frágil democracia púbere. Uma mentira que tornou a peemedebização da política numa verdade inarredável e disseminou a prática delituosa da cultura fisiológica trambiqueira em ofício comum no exercício do poder no país. No lugar da cidadania plena, a lógica hegemônica estabelecida pelo capital e seus interesses tornou-se a medida exata a ser obedecida pelos partidos do pós-ditadura e implementada pelos governantes da Nova República. É essa práxis política, que se fortalece governo após governo, a mãe das relações incestuosas entre o Estado e o setor privado. Que caia finalmente a Nova República e que se instale a Verum Res Publica.