Paola Stoduto
A menina que queria tudo e que queria nada:
as vezes eu não sei se o problema sou eu
ou eles
normalmente eu
eu acho
a minha cabeça é uma bagunça arrumada
aos olhos alheios parece tudo organizado,
mas se vc abrir as gavetas la no canto,
você vê a verdade
as minhas emoções são instáveis
minhas reações também
minhas relações também
eu nao sei o que sou
o'que quero
quem eu quero
ou por que eu quero
Eu quero tudo.
e não quero nada.
Eu quero todo o amor
toda a beleza
a luxúria
e a riqueza
mas não quero nada de conflitos
nada de repreensões e rigidez
nada de frieza
nada disso
Na minha bagunça organizada tem tudo
eu eu quero que não tenha nada
mas se tiver nada, vai ficar vazio
dando espaço pras brechas de infelicidade que eu mesma crio
esse fungo que é a infelicidade
essa substância mortal que eu gero
é quase um suicidio
estou me matando com esse fungo
logo baratas se juntam ao quarto
e o nada se torna tudo
e outra vez eu torço para que o tudo se torne o nada
Nós garotas
nós garotas de comédias românticas
nós garotas amantes de livros
nós garotas de self care
nós garotas que buscam o amor.
nós garotas que se importam com a aparência
nós garotas obcecadas pelo peso
nós garotas obcecadas pela beleza
nós garotas que buscam ser uma coisa que nunca poderiam ser.
nós garotas que adoramos rir
nós garotas que fazemos piadas sem graça
nós garotas que falamos alto demais
nós garotas que amam amar.
nós garotas que sentimos culpa toda vez que comemos
nós garotas que frequentemente nos sentimos sujas
nós garotas “lipstick on a pig”
nós garotas que sempre vamos ser a outra garota e nunca a garota
nós garotas que alisamos o cabelo sempre
nós garotas que nos odiamos sem maquiagem
nós garotas que desejamos um homem perfeito
nós garotas que queremos ser vistas como nós e não só como um pedaço de carne
nós garotas que rezamos para que em algum universo não sejamos essas garotas.
nós garotas que nos odiamos.
(em segredo).
Pausa
as vezes eu acho que eu precisava de um óculos
pra ver se eu enxergo
se o problema são as pedras que eu tropeço
ou se meus pés não sabem se mexer
as vezes eu acho que eu precisava de um balde de água fria
pra ver se eu acordo
pra ver se é tudo um pesadelo
ou a vida real
as vezes eu acho que eu precisava de um cachorro
pra ver como é a carência
pra ver se eu sou ele
ou o dono
as vezes eu acho
que eu preciso de um relógio
pra dar um tempo de tudo
e escutar só os seus tiques ao invés de todo o barulho que escuto
as vezes eu acho que eu precisava de uma terapia especial
espacial talvez
as vezes eu acho que eu precisava de um gps
ou um mapa
pra ver
se eu encontro alguém igual a mim
as vezes eu acho
que eu precisava de luz
pra que eu pare de tropeçar no caminho tão duro
que eu ando todo dia
às vezes
eu acho
que eu precisava parar.
parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar
parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar parar
eu
não
consigo
parar.
Eu, Ditadora
O poço escuro e sem fundo em seus olhos
revelam como ela se sente
todos perguntam como ela está
mas não aguenta mais, ela mente
A vermelhidão no seu olho direito
são as gotas ácidas que escorreram sobre seu rosto
Depois de lembrar que tudo em sua vida
foi imposto
imposto.
mas não por outros
imposto por ela
o sofrimento de loucos
a ditadora.
a que julga os próprios pecados
a que se dá punições
para não ver os outros machucados
quem tá em cima do trono, parecendo grande
sempre se sente tão pequena
por medo das feridas
da pena.
ditadora.
a do peito mais cheio
a do sorriso mais confiante
a que comanda o tiroteio
a que deu o tiro em si mesma
que se afogou no seu próprio poço inundado de ácido
a que caiu de cima do trono
a que o esforço nunca foi o seu máximo.
Eu, ditadora.