opoetatardio
O Abrir da Porta
É noite e eu estou sozinho no quarto
o vento uiva como um cachorro selvagem
regozijando segredos incontáveis.
E a lua, inquieta
mexe-se entre nuvens
Fecho os olhos, e o mundo se dissolve.
Com um toque sutil da chave a girar
meu coração menino estremece, ansioso
a fechadura rende-se, sem resistência
como a noite se entrega ao amanhecer.
Então abro os olhos
Pra ver você entrar.
Partes que me Formam
Há dias em que uma parte de mim permanece adormecida na noite anterior, não se levanta para me acompanhar até a cozinha, onde compartilho o suco verde e o café da manhã com minha esposa e filha. Enquanto o aroma do café se mistura ao riso leve da minha filha e às palavras carinhosas da minha esposa, percebo que elas representam uma parte fundamental de mim.
Em algumas ocasiões, a parte de mim que ficou embaixo das cobertas sai para me encontrar e formar o meu eu completo — seja pela manhã, pela tarde ou pela noite. Há dias em que essa parte de mim, que não é melhor nem pior, prefere não sair ao meu encontro; então, busco por ela no dia seguinte. Desistir, jamais.
A Infância Não Perdida
Infância não é só uma memória antiga
mas a chama que arde em segredo
nas horas de silêncio em que a vida abriga
o rastro do medo, escondido em guetos.
Ela é parte do que somos, sempre presente
paleta de cores em meio ao cinza
um coração pulsante, eternamente
que o tempo jamais leva, embora tente.
Eclipse
Ela abriu a porta e lhe entregou as chaves do seu coração sem hesitar, como quem recebe uma visita esperada, sem nada nas mãos. Ele aceitou entrar. Não lhe prometeu nada, como ela sonhou, nem fez declarações apaixonadas, como ela idealizou, mas com a quietude de quem simplesmente está ali. Presente e ausente, em um equilíbrio frágil.
Enquanto o eclipse cobria a lua, eles se fundiram em um instante que parecia eterno. O silêncio entre os dois parecia um acordo tácito, mas talvez fosse apenas a aceitação dela. Entretanto eclipses não duram. Quando a sombra se dissipou e a lua cheia preencheu o céu, trazendo luz à noite, ela percebeu o vazio que restou, como uma ausência impregnada no fundo do seu ser.
Ele partiu sem alarde, deixando para trás uma ausência quase física. Um amor que nunca foi por inteiro, que deixou apenas cicatrizes e mágoas, mas que, de alguma forma, a marcou profundamente. A carência, pensou ela, é um monstro que só ataca quem a alimenta.
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