Olga Tokarczuk
Desenhar nunca é reproduzir – para poder ver, você precisa saber como olhar e precisa saber o que está vendo.
Sabe, às vezes eu acho que estamos vivendo em um mundo que fabricamos para nós mesmos. Decidimos o que é bom e o que não é, desenhamos mapas de significados para nós… E então passamos a vida toda lutando contra aquilo que inventamos para nós mesmos. O problema é que cada um de nós tem a própria versão desse mundo, por isso as pessoas têm dificuldade de entender umas às outras.
Percebi que – apesar de todos os riscos envolvidos – uma coisa em movimento sempre será melhor do que algo em repouso; que a mudança sempre será algo mais nobre do que a permanência; que aquilo que é estático vai se degenerar e sucumbir, transformar-se em pó, enquanto aquilo que está em movimento será capaz de durar por toda a eternidade.
Os jornais precisam nos manter em constante estado de ansiedade, desviar nossas emoções das coisas que realmente importam para nós. Por que eu deveria me submeter ao poder deles e permitir que me digam o que pensar?
A psique humana evoluiu para se defender contra a visão da verdade. Para nos impedir de avistar o mecanismo. A psique é o nosso sistema de defesa – ela se certifica de que nunca entenderemos o que está acontecendo à nossa volta. Sua principal tarefa é filtrar informações, mesmo que a capacidade de nosso cérebro seja enorme. Pois seria impossível carregarmos o peso desse conhecimento. Porque cada minúscula partícula do mundo é feita de sofrimento.
Minhas raízes sempre foram superficiais; a mais leve brisa sempre poderia me derrubar. Não sei como germinar, simplesmente não possuo essa capacidade vegetal. (...) Minha energia é derivada do movimento.
Quem já tentou escrever um romance sabe que a tarefa é árdua. Sem dúvida é uma das piores maneiras de se ocupar.
Tenho a crença inabalável e angustiante de que é nas aberrações que o Ser penetra na superfície e revela sua verdadeira natureza.
Descrever algo é como usá-lo – destrói; as cores vão perdendo a nitidez, os cantos se embotam e, por fim, tudo que foi descrito começa a desbotar, a desvanecer.
Muitas pessoas acreditam que existe no sistema de coordenadas do mundo um ponto perfeito onde tempo e espaço chegam a um acordo.
Se tivesse examinado nas Efemérides o que acontecia no céu naquela noite, nem me deitaria para dormir.
Precisei me sentar e repetir algumas vezes para mim mesma: estou em casa, é noite, alguém está batendo na porta, e só então é que consegui controlar os nervos.
Saímos de casa e, imediatamente, nos envolveu esse ar muito familiar — frio e úmido — que nos relembra todos os invernos que o mundo não fora criado para a humanidade, e durante pelo menos a metade do ano nos demonstra a sua hostilidade. O frio atacou brutalmente as nossas bochechas, e emergiram nuvens brancas de vapor de nossas bocas.
Passei muitas noites em claro por sua causa. Por impotência. Algumas vezes liguei para a polícia — quando alguém enfim atendia, minha denúncia era registrada, mas nada acontecia.
Na minha opinião, depois da morte, a matéria deveria ser aniquilada. Seria o método mais adequado para lidar com o corpo. Assim, os corpos aniquilados voltariam diretamente para os buracos negros de onde vieram. As almas viajariam para a luz com a velocidade da luz. Isso se de fato existir algo como a alma.