Natalia Mateus
Ainda com sono.
Quem sabe, só foi mais uma outra coisa que aconteceu, um esforcinho.Mas seria algo tão terrível se as pessoas morressem e não deixassem nada delas, nenhum pedacinho. Assim como tantas e tantas mulheres e homens e crianças que passam os dias nas suas casas, seguindo uma rotina monótona.Algo bem chato, sem esplendor ou nada que chega a ser parecido com alguma alegria.
Falso , científico e estranho, aquele médico , sabia que o já tinha visto, perto daquele posto de gasolina, com seu carrinho do ano e cheio de pressa. No seu vestibular, na sua vida, oportunidades. Quem diria que algo amedrontador o faria regressar, salvar vidas e assim ter até mesmo um pouco de culpa acumulada por perder outras, não sei se é sua culpa, mas existem meios de se ver as coisas e então muitas vezes ele escolhe o que o fere de uma estranha maneira que você acha algo aborrecível a estranhamente idiota.
Bem, estava lá eu em casa com minha mesma vida, mesmo vento, mesma chuva, mesmo tudo. Não havia nada para mudar algo daquela maneira. Quando o telefone toca eu atendo dizendo ''Oi'', pensando talvez que é meu pai, que me liga noventa e duas vezes ao dia. Seria bom se fosse ele, mas não era. Era uma mulher, tínhamos assuntos a tratar e ela realmente foi franca e direta, muito direta. Larguei o telefone como se estivesse sendo puxada por algo que me chama , tropecei nos ares do meu quarto, sentei no chão da minha sala e não chorei,só pensei em como seria acordar no outro dia, ir ao médico e ver os relatos da minha saúde em um mero papel.
Calma e paciência é uma coisa maravilhosa, pena que eu não tenho.Saberia mais ficando quieta e tentar salvar as células que ainda respiram no meu corpo.Ele me disse o quanto eu estava doente, no mesmo momento um transtorno me subiu pela cabeça e fiquei totalmente crua, não saí do lugar, não pensei.Como eu pensava que já era tarde, não lamentei nenhum pouco, fiz exatamente como qualquer um diretor de cinema colocaria num filme, e então imaginei um filme chamado '' Que situação'', fui lá, tomei um ar , saí de mim por alguns instantes e comecei a gravar de verdade. Saí fazendo planos. Quero ir até o Polo Norte, quero um gato, um cachorro, uma outra vida, mas que eu não me lembre desta horrível doença.
Como ninguém se preocupou ( até porque ninguém sabia) saí, fugi, e comecei a olhar pros lados e vi o como eu não havia dado muitos sorrisos nesta vida, como fui chata e fui correndo comigo mesma, olhando para todas as pessoas, mas desta vez eu não julguei, só olhei para cada uma delas e contemplei e imaginei elas como eu e eu como elas e eu sorri com essa distância.
Num dia, subi as escadas do meu prédio e me cansei mais do que o normal, foi quando eu abri minha porta e lá estava o Fred. Era tarde demais, ele já sabia. O Fred é o cara mais chato do planeta, louco, muito aborrecido e faz sempre tudo certinho, ele é um tormento , ele é meu irmão, o mais distante.
Não liguei pra nada do que ele me disse, aliás , mentira, magoou, mas eu fingi que estava com os ouvidos furados pelas suas palavras e nada mais quis entender. Mandei ele ir embora e se preocupar comigo só quando eu for mais nova ( isso jamais vai acontecer, né louca?).Não jantei nem nada, fui direto pra cama.Já no outro dia :
-Buá, buá, buá .Esse bebê da vizinha não parava de chorar.Me deu dor de cabeça e o Roberto , meu gato me pediu comida na janela e tomei um café bem forte e foi nessa hora que me dei conta de que meu apartamento estava bagunçado e do jeito que eu mais amava.
Sentei na minha poltrona e coloquei uma música qualquer, porque qualquer coisa naquela hora estava me deixando entusiasmada. Fiquei coma camisola branca com letras pretas.Peguei uma caneta no chão, um papel da estante comecei a rabiscar, escrever ou sei lá o que.Desenhei meus medos, minha fortunas, meus segredos fiquei até às duas da tarde, foi muito bom.
Estava sem ver minha mãe á 5 anos, enquanto meu pai me ligava esse tempo todo , todos os dias.
Eu quero compensar esse tempo perdido.Aos poucos eu estou me aproximando de cada etapa da minha vida em que eu estive ausente.Não deu nada errado.Depois de tantos anos ela ainda me chama de filha.
Eu voltei, e decidi já sair, fui viajar e fiquei dois meses fora do país, viajei por muitos lugares e vivi umas histórias que você até falece de tanto rir.
Eu voltei aqui pro meu apê e coloquei um shorts e uma camiseta e fui pra praia, bem no finalzinho da tarde.
Eu me sentei e vi o pôr -do-sol e foi lindo.Me vi, olhei uma vida de tantas anos e eu gostei. Sonhei com a faculdade, com minha casa, apartamento, carro, minhas contas, meus atrasos, meu trabalho, meu marido e nossos pirralhos e a única coisa que havia acontecido eram as sete primeiras coisas.Me esqueci.
E daí que eu tenho que te contar uma coisa, de saúde eu estava bem. Eu não menti, doente eu estava , mas é que eu pensei tanto em mim mesma que eu acabei esquecendo da própria, esqueci das vidas, dos suspiros e tudo que eu perdi, me importando somente com essas sete coisas.Não casei, não tive filhos, tenho um gato, me afastei da minha mãe, mandei meu irmão embora, não liguei para o meu médico cheio de problemas que é meu amigo, não me importar em estar doente mesmo não estando graduou, me mostrou do que eu precisava.Minha verdadeira eu não teria feito estas coisa,s não ficaria seca deste jeito.Estou doente e na beira da minha morte eu vi a que a pior doença foi causada por um vírus que eu mesma planejei e que coloquei na minha mente que não haveriam curas.Não é tarde.Adoecia meus planos, minhas notas, meus sonhos, eu mesma.