Mathias Aires
Tudo quanto vejo é com olhos desenganados. Talvez por isso vejo as coisas como são e não como se mostram. Porque o desengano tem virtude e força para arrancar da formosura o véu cadente e mentiroso de que o teatro da vida se compõe.
As ciências humanas que aprendemos comumente são aquelas que importava pouco que soubéssemos, devíamos aprender-nos a nós, isto é, a conhecer-nos; de que serve o saber, ou o pretender saber, como o mundo se governa, ao mesmo tempo que ignoramos o como nos devemos governar? Para tudo fomos sábios só para nós somos ignorantes.
O engano vestido de eloquência e arte atrai e a verdade mal polida nunca persuade. Fazemos vaidade de errar com sutileza e temos pejo de acertar rusticamente.
Poucas vezes se expõe a honra por amor da vida e quase sempre se sacrifica a vida por amor da honra.
Às vezes a origem do bem produz o mal, no mesmo lugar em que nasce a vida se cria a morte; as coisas que são contrárias no fim, às vezes são as mesmas no princípio.
Contra o nosso parecer nunca achamos dúvida bastante, contra o dos outros sim. A vaidade é engenhosa em glorificar tudo que vem de nós, e em reprovar tudo que vem dos outros.
A vaidade é cheia de artifício e se ocupa em tirar de nossa vida e da nossa compreensão o verdadeiro ser das coisas.
É próprio da vaidade o dar valor a muitas coisas que o não têm, e quase tudo que a vaidade estima é vão.