Marilynne Robinson
Rotineiramente desqualificamos testemunhos e exigimos comprovação. Isto é, estamos tão convencidos da justeza de nosso julgamento que invadimos provas que não se ajustam a ele. Nada que mereça ser chamado de verdade pode ser alcançado por esses meios.
Parece ridículo supor que os mortos sintam falta de algo. Se você for adulto quando ler isso – é o que pretendo com esta carta: que você só a leia quando já for adulto –, já terei partido há muito tempo. E terei aprendido quase tudo o que há para se aprender sobre o que é estar morto. Mas, provavelmente, guardarei para mim essas descobertas. Ao que parece, é assim que as coisas são.
Um homem pode conhecer o pai ou o filho e ainda pode haver nada entre eles além de lealdade, amor e incompreensão mútua.
Uma vez sozinho, é impossível acreditar que uma pessoa poderia ter sido algo diferente. A solidão é uma descoberta absoluta.
Não há justiça no amor, não há proporção nele e não precisa haver, porque em qualquer caso específico é apenas um vislumbre ou uma parábola de uma realidade abrangente e incompreensível. Não faz nenhum sentido porque é a eterna invasão do temporal. Então, como ele poderia se subordinar a causa ou consequência?
Eu gostaria de poder deixar para você algumas imagens em minha mente, porque elas são tão bonitas que eu odeio pensar que elas serão extintas quando eu me extinguir. Bem, mas, de novo, esta vida tem sua própria beleza mortal. E a memória tampouco é estritamente mortal por natureza. É uma coisa estranha, afinal, ser capaz de retornar a um momento, quando dificilmente pode-se dizer que ele tem alguma realidade, mesmo em sua passagem. Um momento é uma coisa tão leve. Quero dizer, sua permanência é um alívio muito agradável.