Maria Esther Maciel
"Daquele que amo
quero o nome, a fome
e a memória. Quero
o agora. O dentro e o fora,
o passado e o futuro.
Quero tudo: o que falta
e o que sobra
o óbvio e o absurdo."
AMOR
Na véspera de ti
eu era pouca
e sem
sintaxe
eu era um quase
uma parte
sem outra
um hiato
de mim.
No agora de ti
aconteço
tecida em ponto
cheio
um texto
com entrelinhas
e recheio:
um preciso corpo
um bastante sim" a te amar dia todo, todo dia
AULA DE DESENHO
Estou lá onde me invento e me faço:
De giz é meu traço. De aço, o papel.
Esboço uma face a régua e compasso:
É falsa. Desfaço o que fiz.
Retraço o retrato. Evoco o abstrato
Faço da sombra minha raiz.
Farta de mim, afasto-me
e constato: na arte ou na vida,
em carne, osso, lápis ou giz
onde estou não é sempre
e o que sou é por um triz.
CONCEITO
Teu corpo:
um porto
que eterniza
meus navios
um parto
que traduz
o meu avesso
a parte
que arremata
meu desejo.
CLANDESTINIDADE
Permanece em mim
como um segredo
e que ninguém escute
teu silêncio na minha boca
nem a linguagem de teus olhos
que em mim se inscreve
como poema
Torna-te clandestino
em meu país sem nome
e desenha em mim
o teu enigma
teu reverso
e teu verso sem tradução
Te exila em minha teia
me define com tua senha
perenizando em meu corpo
o teu mistério –
entre cortinas,
no refúgio exato dos lençóis.
*