Maria Celça
Chamego, sussurros, beijos. Roupas ao chão, ritmo, aceleração cardíaca. Sons ecoam e, de súbito, nenhum juízo me resta, absolutamente!
Amor impossível
Com muito esforço venho tentando manter-me distante, obediente ao que impõem as circunstâncias. Mas há dias em que a insanidade se sobrepõe à razão e me faz sua, inteira, em declarações de amor que comoveriam a qualquer um, não fossem as artimanhas do destino que, muitas vezes, ocupa-se em nos afastar daqueles a quem amamos.
A sua existência é tormento para os meus dias. E a aflição que experimento, de não tê-lo em meus braços, mas sim de vê-lo perdendo-se, é uma sensação que eu não desejava sequer conhecer. É difícil ficar longe quando vislumbra-se o encontro.
Fantasio, nas construções dos meus castelos, a sua chegada: detida em seus braços, sentindo fervilhar o sangue, a pulsação acelerada, e o espírito invadido por um sentimento de extremo deleite, sinto o doce sabor da sua boca, num beijo longo, mas suave, que selará o nosso romance, na mais pura manifestação de amor e entrega. Ainda em devaneios, posso visualizar as chamas do nosso amor luzindo tudo ao redor, e o calor dos corpos amantes desfrutando, desvairadamente, cada parte um do outro.
Mas, dando-me uma sacudida, a realidade faz-me retornar do sonho, outra vez com o alerta de que é preciso fugir; o amor próprio está sentindo-se sufocar diante de tanta submissão. E, nesse instante, sou tomada por uma angústia, ao perceber quão remotas são as possibilidades.
Corações e corpos livres. Amor perfeito, numa eternidade definida. Seria certa a felicidade, se me bastassem alguns minutos do seu tempo.
Eu com meus botões
Primeiros dias do ano. Recomeço, reviravoltas, estreias. É o que se pensa. Mas não o que se passa comigo.
Especialmente nesse começo, por que razão eu não sei, estou me sentindo triste. Nem sei se posso chamar a isso de tristeza. Sinto-me estancada, com pouco ou nenhum movimento.
Estou meio intolerante, sem paciência pra conversa sem sentido, e fugindo das pessoas, principalmente para evitar os diálogos em que minhas respostas são secas, porque não sei dissimular.
Confessei a uma amiga que a minha vontade era de me isolar num canto, ficar quieta, sem ter que ouvir ninguém. É porque às vezes até sorrir me parece difícil. Não sei mascarar meus sentimentos.
Se quando estou bem já passo a impressão de antipática, imagine assim, como agora. Até tentei me olhar no espelho, mas quase nada foi o que vi. Talvez pelo medo de me enxergar por inteiro.
Sem explicação para tanto, apenas me distancio para não ser desagradável com ninguém. Sou do bem. Sei amar, amo muito, mas é que tem dias que não dá. Aos que me conhecem, isso acaba sendo compreensível. O importante é que, por incrível que pareça, muitos gostam de mim, o que me faz rir, encerrando este texto.
Graças a Deus isso passa. Afinal, o que é a vida, senão viver!
Canta, canta, minha gente!
Uma das coisas que muito me apraz é cantar. Ouvi minha mãe fazendo isso até o último momento em que viveu. Inclusive, estou resgatando algumas composições que ela cantava, desconhecidas para muitos, por serem antigas, mas importantes para mim, pelo que me fazem reviver.
Eu, além de gostar, creio na voz do povo que diz que “quem canta, os males espanta!” Melhor prevenir, não custa nada. Meu repertório é bem variado, mas não há seleção prévia, as músicas me vêm e eu simplesmente canto. São, na sua maioria, as antigas, devido à influência do que ouvi quando criança (pena que agora ninguém canta para mim). Das atuais só me interessam algumas.
O que me inspira, em algumas ocasiões, são coisas simples, do cotidiano. Percebo algo, uma cena, e o contexto me remete a alguma composição. Também, às vezes, comunico meus pensamentos cantando, quando não posso expressá-los de outra forma, para me proteger – aqui, a fala de uma amiga caberia: “estratégia de sobrevivência”.
Embora eu não tenha o menor talento para cantar, apenas o faço porque gosto, fico feliz com a participação das pessoas, que acabam se envolvendo nas letras, seja por gostarem da canção, ou porque elas as fazem recordar algo bom.
Assim, as histórias de cada um vão estreitando as relações. É muito bom um grupo se unir relembrando tempos passados, momentos felizes. Outro dia, cantando “Ai que saudade d'ocê”, Fábio Jr., uma colega relatou seu gosto por essa música porque a faz lembrar de uma época feliz, da Faculdade.
Cantei “O amor e o poder”, Rosana, e foi o começo de uma agradável discussão. Um amigo do setor, apontando para mim o dedo, disse: “Já sei! Tema de abertura da novela Roda de Fogo!” Cheia de razão, fui logo respondendo que ele se equivocara, lembrando-lhe que o tema da tal novela era “Pra começar”, da Marina Lima. Ele insistiu, o que me fez explicar-lhe que, na verdade, a música que eu havia cantado era parte da trilha sonora de Mandala. Ele se convenceu, ainda complementando: “ah, a novela do Édipo e da Jocasta!”
Em meio aos mais variados gêneros, tenho uma queda pelos bregas, aqueles do tempo do vinil. Alguns nomes que recordo, talvez desconhecidos pela geração mais nova, faziam parte do acervo do meu pai: Adelino Nascimento, Carlos Alexandre, Elino Julião, Fernando Mendes, Genival Santos, Ismael Carlos, João Gonçalves, José Orlando, Luizito Gemma, Paulo Sérgio, Roberto Muller, Sebastião do Rojão, Teixeirinha, e outros, que me faltam na memória nesse instante.
Músicas convidam, envolvem, convencem, animam. Estou rodeada de pessoas que gostam de falar do tema e isso me faz muito bem. Cada um contribui à sua maneira e no final, rendemo-nos à boas risadas.
Às vezes parece tão simples ser feliz!