Maria Carolina Amaral.
VALE A VIDA VIVER PRA VOCÊ.
Olhar pra você e não te querer:
É como sentir fome e não comer...
É como sentir sede e não beber...
É como ir ao rio no calor e não se banhar.
Tocar em sua pele e não te desejar:
É como colher amoras e nenhuma provar...
É buscar água na fonte e não se molhar...
É como ler Quintana e não se emocionar.
É como ver o horário eleitoral e não morrer de rir.
Tê-lo então e te deixar ir!!!
É loucura!
É insano!
É como ler um poema lindo e não imitar...
É como ouvir uma canção de amor e não cantar.
De todas as loucuras que tenho feito,
você foi a pior...
A mais fugaz...
A mais rude...
A mais lunática
E a mais dócil.
Mas tudo isso é pouco
Diante da grandeza de ter você.
Amo-te! Amo-te! Amo-te!
TE ESQUECER EM PARIS
Nos becos da velha Paris;
Nos braços de uma mademoiselli qualquer,
Refiz minhas noites de solidão
E consumei o ato de amar quem me quer.
Monet ainda teimava em acompanhar-me;
Aquele refinado impressionismo já não me convence mais.
Perdi-me nos longos bares de whisky barato
E lá morri toda noite buscando um pouco de paz.
Eu vi o outono chegar e levar as últimas folhas secas
E ainda vi o inverno gelado nevar a minha cabeça.
Eu vi meu corpo envelhecer amiúde e chorei;
E um dia vi as luzes se apagarem atrás de mim
E a última nota do violino se despediu.
Percebi que ainda havia tempo de recomeçar e voltei.
ATIREM A PRIMEIRA PEDRA
A chuva que molha as pedras
Nada sabe das pedras do meu caminho.
Das vezes que sequei meu sangue,
Das pedras que atiraram em mim.
Até fiz o meu castelo sombrio,
Das tantas pedras que me atiraram;
Ergui um muro a minha volta
E cobri-me das rochas que sobraram.
A minha alma virou pedra
E o meu coração em pedra se tornou;
Das tantas pedras que me mataram,
Nenhuma pedra a mim sobrou.
Refiz-me em rochas e pedras;
Tornei-me insensivelmente dura e forte
E cada impacto da pedra que vem, volta;
Pois sou uma fria pedra viva depois da morte.
“O PRIMEIRO OLHAR DA JANELA PELA MANHÔ
“O primeiro olhar da janela pela manhã” me chama:
O sol despontando através do nevoeiro,
E na praça ainda vazia, o sorveteiro;
E dá-se meu encontro definitivo com Quintana.
Vem andarilhando manso na brisa que vem do leste
E pousa na minha mão deslizando suave no papel;
Séculos de melancolias pincelando o azul do céu.
Em mim, lentamente, gotas de rimas descortinam o véu.
Posso senti-las em minhas células em travessias;
Trazendo à minha alma estéril o lirismo da poesia.
Eu que quase nada sei de amar...
Psicografo a alma usando os dedos com exatidão,
Da mais vil à mais sublime paixão.
Eu que nunca soube sonhar!
O QUE É O AMOR?
Amor não fala não se explica,
Não se vê e muito menos se apalpa;
Dimensão não cabível em sua própria palavra de definição;
É isento de ciúmes, egoísmo e não se exalta.
Amor sem palavras exatas que o definem,
Não se sabe o porquê nem o sentido de sua existência;
Não tem limites quantificáveis, nem padrões comportamentais;
Não é incógnito, mistério, mito ou crença.
Amor existe no real ato de personificação e euforia ;
Dele soletram-se palavras tão vazias de conteúdo!
Estabelecendo apenas uma forma verbal que o identifique;
Conteúdo que nem dele sabe falar em sua plenitude.
Amor é mais que isso; mais que palavras e conceitos;
Vai para além das teorias e conversas abstratas;
Não estabelece pontes entre impossíveis,
É superior ao desejo humano egoísta e burocrata.
Não tem cheiro, cor, raça ou religião;
Pode ser todas as cores ao mesmo tempo
E nesse mesmo tempo não ser nenhuma cor
E mesmo indisposto a senti-lo, a gente sente.
JUVENTUDE PERDIDA
Na colina, a lua abre sua janela
E solta o vento a galopar.
Ouvem-se gemidos das árvores entorpecidas
Por atrever-se em suas dermes tocar.
Cá da janela também estou
Entorpecida pelo frio da brisa a passar;
Olhos vendados pelo vestido dourado
Que trás o bordado de São Jorge a lutar.
Jogo-me da sacada na garupa de um tufão
E num galopar imaginário,
Adentro castelos e armários,
Gavetas e diários
Um pouco de quem fui, saudades!!!
Num móvel emaranhado
Entre teias, empoeirado,
Um papel amarelado
Dependurado na parede ao lado.
Vasculhei o passado.
Tudo aquilo estava ali:
As frases que não falei,
Os versos que não mandei,
Os amores que não vivi.
“E o retrato? Ah o retrato! Não era eu.
Aquele rosto não era meu!”
Definitivamente, não era meu.
E eu chorei...
A vida passou encilhada
E eu não montei.
A porta se abre, ao longe?...
Entre cá e lá, um som real:
- Vó, a lua já tem namorada.